Frutas e verduras “fora do padrão” são salvas por produtores e comerciantes
Doações, reaproveitamento e novas estratégias impedem que toneladas sigam para o lixo
Quanto o senso estético do que é “alimento saudável” contribui para o desperdício? Frutas, verduras e tubérculos são as principais “vítimas” dessa seleção humana nos expositores dos mercados. Para driblar esse julgamento, comerciantes e produtores apostam no reaproveitamento, o que beneficia instituições que atendem pessoas em situação de vulnerabilidade.
RESUMO
Nossa ferramenta de IA resume a notícia para você!
Produtores e comerciantes de Mato Grosso do Sul desenvolvem estratégias para combater o desperdício de alimentos considerados "fora do padrão" estético. As iniciativas incluem doações para instituições beneficentes e reaproveitamento criativo dos produtos, como processamento de polpas e preparação de porções pré-cortadas. O problema do desperdício é significativo no Brasil, onde cerca de 30% da produção de alimentos é perdida, totalizando 48 milhões de toneladas por ano. Especialistas apontam que menos de 15% desse volume seria suficiente para acabar com a fome no país, que afeta aproximadamente 300 mil pessoas apenas em Mato Grosso do Sul.
De acordo com o último levantamento da ONG (Organização Não Governamental) Pacto Contra a Fome, cerca de 300 mil pessoas enfrentam a fome em Mato Grosso do Sul. No Brasil, quase 30% da produção de alimentos é desperdiçada, o que corresponde a 48 milhões de toneladas por ano. Para acabar com a fome no país em 2022, por exemplo, seriam necessários entre 4,4 e 7,3 milhões de toneladas. Ou seja, menos de 15% do que se perde na cadeia produtiva seria suficiente para alimentar todos os brasileiros em situação de fome.
- Leia Também
- Governo destina R$ 1 milhão para compra de alimentos de agricultores quilombolas
- Pouco conhecido, mercado-escola tem alimentos orgânicos de R$ 5 a R$ 10
Acompanhado do vira-lata Juninho, Cézar Macedo, 60 anos, colhe com as mãos as tiriricas que crescem no meio da plantação de alfaces. Sem agrotóxicos ou produtos químicos para manutenção, a horta dele fica na Rua Nicomedes Vieira de Rezende, no bairro Vilas Boas, em Campo Grande. Ele vê exagero no desperdício e defende mais conscientização.
“É realmente um exagero. A gente aprende a produzir apenas o que vai vender, mas, no fim, as pessoas ainda desperdiçam. Aqui, quando sobra, fazemos doação para as instituições de acolhimento da região, porque, juntas, elas conseguem aproveitar melhor”, afirma o produtor.
Do outro lado da rua, o trabalhador Carlos Henrique dos Santos, 44 anos, caminha entre as couves. Um trecho da plantação ainda está germinando, pois foi recentemente destinado à doação.
“Quando a gente vê que vai sobrar, meu patrão liga para o pessoal das ONGs, que vem aqui e colhe fresquinho do pé. Depois que eles levam, abre espaço para eu plantar de novo. É assim que trabalhamos há anos e nada é perdido”, garante Carlos.
Luiz Carlos Gonçalves, 50 anos, trabalha em uma das instituições que recebem doações de hortaliças. No abrigo para crianças, a valorização do alimento faz parte dos ensinamentos do dia a dia.
“Cozinhamos como qualquer casa familiar; a diferença é que multiplicamos por 24. Somos uma instituição sem fins lucrativos que depende de parceiros públicos e privados. Essas doações são importantes para a manutenção e também para os ensinamentos e valores passados às crianças aqui”, ressalta Luiz.
Estética e estratégia - Em frente à Ceasa/MS (Centrais de Abastecimento de Mato Grosso do Sul), na Rua Jamil Basmage, a família de Andréa Jaqueline Ribeiro trabalha com a venda de frutas e hortaliças há mais de 20 anos. Mesmo fazendo compras diárias, ela observa que essa estratégia não basta, porque o consumidor começa pela estética do produto, mesmo quando é orgânico.
“As pessoas compram com os olhos; se tem uma manchinha na casca, já não querem levar. Entendo que todos têm direito de comprar o que está em melhor qualidade, mas, às vezes, o próprio transporte já machuca a mercadoria antes de chegar aqui”, explica a empresária.
Para não perder, tomates são separados para restaurantes que fazem molho; frutas com avarias na casca são cortadas e congeladas para sucos; legumes são separados em porções para sopas ou cozidos. Descascar, cortar e embalar porções para comercialização facilitada foi a estratégia encontrada.
“O maracujá é um bom exemplo: os de casca mais feia são os melhores, com mais polpa. Parei de perder quando separei as polpas para vender. Hoje é o que mais sai congelado”, completa Andréa. Por lá, ainda que sobre, os próprios funcionários levam para casa ou uma instituição que trabalha com dependentes químicos recebe os alimentos.

Segundo especialistas do Pacto Contra a Fome, o problema não é falta de produção, mas desigualdade, má gestão, falhas de logística e ausência de políticas públicas eficientes. O desperdício aprofunda a fome porque concentra recursos em quem já tem acesso, enquanto os mais vulneráveis ficam sem meios para alcançar os alimentos.
Em Campo Grande, quem deseja doar alimentos pode procurar o FAC (Fundo de Apoio à Comunidade), que orienta sobre a melhor destinação. O telefone é (67) 2020-1361. O atendimento presencial, em horário comercial, ocorre na Avenida Fábio Zahran, 600.
Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para acessar o canal do Campo Grande News e siga nossas redes sociais.
Confira a galeria de imagens: