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Meio Ambiente

Em ilha de calor extremo de MS, bairros pobres são os que mais sofrem

Estudo inédito revela que quanto menor a renda, maior o efeito das altas temperaturas

Por Inara Silva | 05/10/2025 08:09
Em ilha de calor extremo de MS, bairros pobres são os que mais sofrem
Vista aérea do município dee Três Lagoas. (Foto: Divulgação/Prefeitura de Três Lagoas)

As mudanças climáticas estão tornando cada vez mais frequentes os episódios de calor extremo em Mato Grosso do Sul. Estudo inédito, realizado no Estado, aponta que quanto mais pobres, mais vulneráveis as pessoas ficam aos eventos de altas temperaturas.

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Um estudo inédito realizado pela UFMS revela que os bairros mais pobres de Três Lagoas são os mais afetados pelo calor extremo. A pesquisa, coordenada pela professora Gislene Figueiredo Ortiz Porangaba, mostra que entre 2001 e 2022 houve um aumento significativo nas ondas de calor, passando de quatro para 16 ocorrências. O levantamento indica que regiões como Vila Haro e Guanabara, onde a renda familiar é de até quatro salários mínimos, apresentam vulnerabilidade forte ou muito forte ao calor. Em contraste, bairros centrais e de maior poder aquisitivo, como Colinos e Santos Dumont, são menos afetados devido à melhor infraestrutura e acesso à climatização.

Essa tendência foi constatada em Três Lagoas, a 327 km de Campo Grande, em pesquisa coordenada pela professora Gislene Figueiredo Ortiz Porangaba, da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Doutora em Geografia, ela está à frente do levantamento intitulado “Risco e vulnerabilidade socioambiental a eventos extremos de calor em cidades do Mato Grosso do Sul”, que abrange Três Lagoas, Dourados, Corumbá e Campo Grande.

Interior – Em Três Lagoas, o levantamento inicial está concluído e revelou que, entre 2001 e 2022, houve aumento significativo na ocorrência de ondas de calor. No período entre 2001 e 2006, por exemplo, foram registradas apenas quatro ondas de calor. Já no intervalo mais recente, de 2017 a 2022, o número disparou para 16 ocorrências, mais que duplicando a frequência desses fenômenos.

Em ilha de calor extremo de MS, bairros pobres são os que mais sofrem
Mapa da temperatura superficial noturna em Três Lagoas, em 16 de novembro de 2019, às 21h51. (hora local) (Fonte: Reprodução)

O ano de 2019 se destacou como o mais crítico da série histórica (2001 a 2022), somando oito eventos extremos de calor. Nesses episódios, a população de Três Lagoas foi exposta a um total de 280 horas de calor excessivo, com os termômetros alcançando o pico de 40,7 °C em setembro, superando o limiar de 36,3 °C.

Esse cenário reforça o alerta do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), que classifica as ondas de calor como uma ameaça direta à atividade humana e ao ambiente natural. As medições por satélite revelaram temperaturas de superfície diurnas com picos entre 50 °C e 55 °C em áreas mais quentes da cidade.

Método – O estudo analisou dados meteorológicos do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) e imagens de satélite, identificando também a formação de ilhas de calor superficiais na cidade. Essas ilhas ocorrem quando áreas urbanas acumulam calor durante o dia e liberam lentamente à noite, mantendo as temperaturas elevadas por mais tempo. A intensidade dessas ilhas de calor é potencializada pela ocorrência de ondas de calor.

A pesquisa não apenas quantificou o aumento do calor, mas também demonstrou como a desigualdade social define quem está mais vulnerável. Ao sobrepor mapas de temperatura de superfície, o chamado "calor do solo", com dados de rendimento do Censo de 2010, os pesquisadores revelaram o papel da desigualdade social na crise climática urbana.

Em ilha de calor extremo de MS, bairros pobres são os que mais sofrem
Mapa de renda domiciliar de Três Lagoas (MS) (Foto: Reprodução)

Desigualdades – De acordo com a pesquisadora, nem toda a população sente os impactos da mesma forma. Bairros centrais e de maior poder aquisitivo, como Colinos, Santos Dumont e Jardim dos Ypês, foram classificados como de baixa vulnerabilidade socioambiental, já que contam com melhor infraestrutura e acesso à climatização.

Um fato que surpreendeu os pesquisadores foi que a área mais quente da cidade, a região central, não é o local das pessoas mais vulneráveis ao calor. Embora essa área também esteja em risco, a capacidade socioeconômica permite a esses moradores utilizar ar-condicionado e viver em residências construídas com materiais que melhoram o conforto térmico.

Já em regiões como Vila Haro, Guanabara, Vila Zuque e Vila Alegre, onde a população tem renda familiar de até quatro salários mínimos, a vulnerabilidade foi considerada forte ou muito forte. A falta de moradias adequadas, com materiais de construção que dissipam o calor e sistemas de climatização, aumenta a exposição ao desconforto térmico e aos riscos à saúde durante os eventos de calor extremo.

Recomendações – Segundo a professora Gislene Porangaba, a climatização artificial, com uso de ar-condicionado, é a solução mais imediata para o desconforto térmico da população, mas ela reconhece que essa não é uma opção sustentável a longo prazo.

A prioridade, conforme a pesquisadora, deve ser a adaptação da cidade, com foco em políticas públicas que ampliem a cobertura vegetal, tanto de árvores quanto de áreas verdes, e diminuam os espaços impermeáveis.

Outra recomendação é que as pessoas plantem nos quintais e nas frentes das residências e pintem suas casas com cores mais claras para refletir a radiação solar. Todas essas medidas ajudam a reduzir a temperatura da cidade.

O estudo completo sobre Três Lagoas está publicado na edição de setembro da Revista Brasileira de Climatologia, sob o título "Ilhas de calor superficiais e ondas de calor em Três Lagoas, MS: Análise pela ótica de risco e da vulnerabilidade socioambiental". A pesquisa tem financiamento da Fundect (Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

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