ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no X Campo Grande News no Instagram
NOVEMBRO, QUINTA  07    CAMPO GRANDE 23º

Meio Ambiente

Preservação do Pantanal depende da Amazônia e Cerrado, diz pesquisador

Coordenador do MapBiomas diz que território pantaneiro tem características que se relacionam com outros biomas

Guilherme Correia | 11/10/2022 07:30
Equipes durante combate a incêndio florestal no Parque Estadual das Nascentes do Rio Taquari. (Foto: Imasul)
Equipes durante combate a incêndio florestal no Parque Estadual das Nascentes do Rio Taquari. (Foto: Imasul)

De que forma o desmatamento na Amazônia e no Cerrado impactam no Pantanal? Para o coordenador do MapBiomas, Marcos Rosa, a própria posição geográfica do território pantaneiro influencia nas relações que tem com outros biomas. Por estar no centro do Brasil e da América do Sul, a planície depende da preservação de regiões onde os rios nascem - estes que ficam nos arredores.

“A localização do Pantanal depende muito dessa umidade que é gerada na região da Amazônia e que depois vem trazer essa chuva para a região Sudeste. A manutenção da Amazônia vai influenciar no Pantanal. O Pantanal é dependente da conservação da área também do Cerrado”, afirma o pesquisador.

Ao Campo Grande News, ele explica que o Pantanal vive seus anos mais secos da história e que a última grande cheia foi há quatro anos, em 2018. “De lá para cá, a gente está num período muito seco, muito preocupante. A situação é acelerada pelas ações humanas. É uma preocupação monitorar para ver o impacto disso e o quanto dessa seca pode ser agravada.”

“Todos os rios que vêm do Pantanal nascem principalmente no Cerrado e um pouco na Amazônia. Então, toda essa rota, que a gente chama de Bacia do Alto Paraguai, está nessa borda. Na medida que você desmata os entornos dos rios, você afeta tanto em quantidade quanto em qualidade da água que vai para o Pantanal.”

Segundo ele, produtores rurais usam cada vez mais o espaço para transformar em pastagens, fator que é propiciado pela seca. Ou seja, quanto mais o Pantanal deixa de alagar, maior é a ação humana, que por sua vez, danifica ainda mais o bioma. "Quando seca o Pantanal, ele tem mais propensão ao fogo, como ocorreu em 2020. E mesmo a ocupação humana, de pastagens, ocorre nessas áreas que, no passado, alagavam."

Não valia a pena fazer investimento porque havia uma pastagem inóspita. A medida que deixa de alagar, o desmatamento vai cada vez mais para o interior do Pantanal”, destaca. Segundo o pesquisador, as monoculturas como soja e cana-de-açúcar são as principais vilãs do ambiente, já que exigem quantidade grande de água para serem cultivadas.

Segundo o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), em 2020, o Mato Grosso ocupou a primeira posição de estados com maior VBP (Valor Bruto da Produção) no setor da agropecuária, com R$ 118,06 bilhões no ano. Mato Grosso do Sul estava na sétima colocação, com R$ 40,16 bilhões. Quase metade da produção do País, cerca de 115 mil toneladas, era de soja.

Segundo estudo do Cepea-Esalq (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da USP (Universidade de São Paulo), em parceria com a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), 27,4% do PIB (Produto Interno Brasileiro) é composto pelo agronegócio. Em 2019, representava 26,6% do total.

Em março, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) publicou um estudo em que estimava que o agronegócio brasileiro alimentava cerca de 800 milhões de pessoas. Dados do ComexStat, do Ministério da Economia, mostram que a China responde por 73% das exportações brasileiras de soja, produto que representa mais da metade da produção agrária brasileira considerada no trabalho, com 135 milhões de toneladas.

Em reportagem publicada pelo Uol, o professor aposentado do Instituto de Economia da Unicamp e diretor-geral adjunto do Instituto Fome Zero, Walter Belik, ressaltou que o Inquérito Vigisan mostrou que 56% da população brasileira está em estado de insegurança alimentar. "Não dá para dizer que você está alimentando o mundo se você mal alimenta a população do seu país”, declarou.

Segundo a Abimilho (Associação Brasileira das Indústrias de Milho), das 88 milhões de toneladas de milho produzidas no Brasil durante a safra 2020 e 2021, apenas dois milhões foram diretamente para o consumo humano, enquanto que 55 milhões viraram ração animal e 22 milhões foram exportadas.

Em relação à soja, dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) mostram que de 135 milhões de toneladas da produção brasileira de soja em 2020, 17 milhões viraram ração, ao passo que outras 82 milhões de toneladas foram exportadas.

Área queimada no entorno de um rio, no bioma do Cerrado. (Foto: PMA)
Área queimada no entorno de um rio, no bioma do Cerrado. (Foto: PMA)

Fiscalização - Para Marcos Rosa, novas restrições são necessárias para manter o equilíbrio sustentável na região pantaneira, tanto na planície quanto nas “cabeceiras” do bioma. “Um planejamento dessa ocupação, respeito à legislação já existente e recuperação das APPs (Áreas de Preservação Permanente), áreas nativas e, principalmente, das nascentes dos rios. Evitar que sejam aterradas.”

Segundo ele, é preciso garantir que as áreas protegidas tenham preservação e que haja um controle de redes hidrelétricas, por exemplo, que podem deixar rios mais rasos e diminuir a vazão de água. “Isso também acontece nas pequenas redes hidrelétricas que, apesar de serem centrais que teoricamente funcionam a fio d'água, ainda assim, afetam a vazão dos rios e se corre o risco de mexer no fluxo hídrico.”

“Toda a diversidade está acostumada com o período de seca e cheia. É como o Pantanal funciona. Então, o Pantanal depende dessas chuvas, depende da água produzida nas cabeceiras.”

Segundo ele, cerca de 50% da reserva é protegida, mas esta porção está se mostrando “insuficiente” para a proteção como um todo. No Mato Grosso, há legislação em trâmite para que se proíba cultivo de soja e cana dentro da área de planície. Desta forma, Rosa avalia que as próprias secretarias estaduais não têm capacidade de coibir práticas danosas ao ambiente, já que estão contempladas na atual legislação.

“O grande problema é que parte desse desmatamento está sendo autorizado. Quando os fiscais vão a campo e veem que tem uma autorização para o desmatamento, é preciso haver uma revisão da legislação. Além disso, o órgão federal deixou de atuar, nos últimos anos, é uma consequência do desmonte e a gente tem cobrado muito a ação dos estados", opina.


Nos siga no Google Notícias