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Política

Cientista vê na aversão aos partidos e lideranças “erro grave” do protesto

Zemil Rocha | 21/06/2013 17:48
Protesto realizado na Praça do Rádio Clube em Campo Grande (Foto: Cleber Gellio)
Protesto realizado na Praça do Rádio Clube em Campo Grande (Foto: Cleber Gellio)

O cientista político Tito Machado considera que o movimento de protestos por melhorias nos serviços públicos, que contagiou o País e chegou a Mato Grosso do Sul, está cometendo um “grave erro de avaliação”, ao optar pela aversão aos partidos políticos e às lideranças. “É a parte triste desse movimento. Não há sociedade democrática sem partido. Partido é um dos pilares de sustentação da democracia. Se existe partido ruim é porque pessoas boas não estão dentro dele”, avaliou Tito, que é doutor em geografia política e econômica pela USP e professor dos cursos de Geografia, Administração e Jornalismo da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).

Ao analisar os protestos que se multiplicam pelas ruas do País, com passeatas tendo começado ontem em Campo Grande, o professor Tito Machado entende que há também um equívoco em repelir lideranças em nome da espontaneidade, gerando a dificuldade até mesmo de auto-avaliação do movimento e de saber a hora de parar. “Todo movimento, como, por exemplo, o sindical, que é organizado, tem dificuldade de parar quando inicia um movimento, uma greve. Imagina um movimento como esse que é sem uma cabeça e sem organização”, afirmou. “E aí imagina como isso vai parar?”, indagou o próprio Tito.

Decepção com lideranças e partidos, segundo Tito, explicam essa aversão, mas precisa ser repensada. “Todos os partidos são bons, não conheço nenhum que coloque algo de ruim para a sociedade. O que existe são lideranças boas ou ruins nos partidos.É a parte triste. O movimento não deveria ser apartidário e sim pluripartidário”, disse o cientista, observando que se tivesse um ou mais partidos canalizando as reivindicações populares haveria mais condições de realizá-las concretamente.

Momento histórico – A mobilização que contagiou o Brasil, na opinião do cientista político Tito Machado, é “histórica” e já é “vitoriosa por si e per si”, apesar dos problemas de aversão a partidos e tendência anárquica. “No País todo baixou a tarifa de ônibus. Isso aí é histórico. Nunca aconteceu antes”, ressaltou.

Para ele, trata-se de um momento “maravilhoso” para o País. “É maravilhoso ver juventude na rua reivindicando de tudo. Talvez esse seja o grande problema. Quando se reivindica de tudo não se reivindica nada. Mas é algo que estava adormecido na população e parece que há um despertar, para um Brasil muito melhor”, avaliou o professor universitário.

Considera que isso é típico de manifestação que não tem liderança nem partido político. “Você termina tendo um nível de reivindicação que vai de A a Z e termina esvaziando”, opinou Tito. “Ela é maravilhosa... muito boa, mas está faltando liderança. Avançamos até aqui. Houve ganho maravilhoso de baixar as passagens de ônibus. Um ganho histórico”, completou.

Quando começou o movimento, segundo Tito, houve uma reivindicação muito clara de reduzir o preço das tarifas de ônibus em São Paulo e no Rio de Janeiro. “E possibilitou vitória extraordinária, que começou de forma tímida e expandiu para o Brasil”, observou. “Agora entra na segunda fase. Poderia avançar, mas não pode porque não tem liderança. São lideranças difusas. Quando tudo é possível reivindicar se perde o foco. E fica sem rumo”, apontou.

E insiste Tito: “Não há possibilidade de saber quando vai parar, onde vai parar”. Como não tem liderança para discutir isso, o movimento segue sem fazer analise política, análise de momento. “Se não tem liderança perde a capacidade inclusive de fazer análise”, alertou.

Protestos difusos - Uma das provas de que o movimento é difuso e movido pela espontaneidade, na opinião de Tito, é o que aconteceu ontem em Campo Grande e vem também ocorrendo nas concentrações e passeatas pelas principais capitais brasileiras: Por mais que possam começar com uma grande e única mobilização, as passeatas se dividem em vários grupos, cada qual rumando para um setor da cidade. Ontem, na Capital inicialmente todos se dirigiram ao Paço Municipal e depois grupos se dividiram indo para a Câmara de Campo Grande, para a obra do Aquário do Pantanal e para a frente do prédio onde mora o governador André Puccinelli.

“Falta liderança, falta cabeça”, explica Tito, reafirmando a necessidade de o movimento ser “multipartidário ou suprapartidário” a fim de dar-lhe consequência. “Isso é complicado. Como se vive numa democracia sem política?”, questionou o professor. “E quanto mais forte for a política, mais forte a democracia”, enalteceu.

Tito Machado vê os protestos como uma insatisfação geral na sociedade quanto aos partidos e a condução da política, em especial da classe média. “O conjunto majoritário dos participantes dessa manifestação é a classe média, que é formadora de opinião”, destacou o professor. “Com essa insatisfação as pessoas vão para as ruas. Mas tem de reverter isso no fortalecimento de propostas, de partidos ou de uma nova política”, defendeu.

Como vai terminar? – A grande “incógnita”, conforme Tito, é saber como vai terminar esse movimento inédito na história do País. “Pode resultar em algo vitorioso se terminar o mais rápido possível. Se não, cada dia que passa vou me tornando mais pessimista. Tendência é a radicalização e, neste momento, não é algo bom para movimento, que nasceu pacifico, que nasceu com ânimo, com alegria”, afirmou o cientista.

Quanto à violência que têm sido praticada por pequena parte dos manifestantes, mas causado destruição de patrimônio público e privado, Tito Machado considera que essa atitude é reflexo da sociedade. “A sociedade brasileira anda muito violenta mesmo, de uma maneira geral e não é de hoje. Como essas manifestações terminam expressando o conjunto social, essa violência expressa isso também”, ponderou.

Se por acaso o movimento persistir da maneira como está e reivindicando tudo, acredita Tito, os grupos violentos tendem a aumentar.

Para Tito, a violência não está só nos bairros da periferia nem demanda de grupos organizados para quebrar tudo. “As pessoas estão também nas universidades, nas escolas”, afirmou ele. “No caso dessas pessoas, basta um empurrãozinho para elas começarem a radicalizar”, finalizou.

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