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Reportagens Especiais

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises

Grupo mostra que criar regras contra conflitos e profissionalizar decisões são mais importantes que tradição

Por Cassia Modena | 01/12/2025 09:52
Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Ônibus antigo da Cruzeiro do Sul estacionado em frente ao antigo Hotel Beira Rio (Foto: Acervo da família)

O Campo Grande News publica, a partir desta segunda-feira (1), uma série de reportagens sobre negócios que surgiram e se mantêm nas mãos da mesma família, firmes e fortes. São empresas de diferentes portes que passaram por sucessões, crises, momentos de expansão e se transformaram por meio das novas gerações.

RESUMO

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O Campo Grande News inicia uma série de reportagens sobre empresas familiares que prosperaram em Campo Grande ao longo de décadas. A Cruzeiro do Sul, fundada em 1977 por Oswaldo Possari, é destaque. Com raízes no transporte de passageiros e cargas, a empresa enfrentou desafios como infraestrutura precária e crises econômicas, mas se expandiu para vários estados brasileiros. Atualmente, sete membros da família lideram o negócio, que emprega cerca de 1.500 pessoas. A empresa também investe em sustentabilidade, equipando sua frota com motores menos poluentes. Apesar dos conflitos familiares, a gestão busca equilíbrio entre negócios e relações pessoais.

A primeira na pauta é mais antiga que Mato Grosso do Sul e tem o transporte de passageiros e de cargas como atividades principais.

Cruzeiro do Sul foi o nome que Oswaldo Possari, homem ligado aos astros, escolheu para o negócio em julho de 1977. O mesmo de uma constelação que guiava os povos antigos. É composta por cinco estrelas principais, segundo a astronomia, mas tinha sete no primeiro slogan da empresa: Oswaldo, a esposa Oseli e os cinco filhos do casal representados. Os símbolos foram combinados com o yin e yang para dar o equilíbrio que o fundador queria para o projeto.

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Oswaldo Possari quando foi vice-prefeito de Campo Grande (Foto: Arquivo/Marcos Ermínio)

O negócio está na quinta geração da família. As raízes da empresa estão no interior de São Paulo, onde o avô e o pai de Oswaldo começaram a carregar encomendas de carro entre uma cidade e outra e depois criaram a Viação Jales. Foi com eles que o Possari mais jovem aprendeu a dirigir caminhão, ônibus e a trabalhar com transportes desde os 14 anos. Aos 17, já era arrimo de família.

O que trouxe Oswaldo para o então Mato Grosso foi a convicção de que haveria espaço para a futura empresa prosperar. Ele também considerava ir para o Amazonas ou o Pará. Na visão dos filhos, o pai mirava “onde era mais difícil de lutar, mas mais fácil de vencer”.

Com a Cruzeiro do Sul já consolidada, ele foi vice-prefeito de Campo Grande entre janeiro de 1997 e janeiro de 2005, durante a administração do ex-prefeito André Puccinelli. Morreu em 2022, aos 75 anos.

Entre homens e mulheres, atualmente sete membros da família fazem parte do conselho da empresa e dão continuidade ao negócio. Entre eles estão Osvaldo César Possari (filho mais velho do fundador), Caio Possari (filho de Osvaldo) e Márcio Zanon (genro de Oswaldo), que conversaram com a reportagem. São empregados cerca de 900 funcionários indiretamente e 620 diretamente.

O momento é de expansão, principalmente nas unidades de cargas. A Cruzeiro do Sul já atua em todo o Mato Grosso do Sul e em Mato Grosso, além de estar no Paraná e Santa Catarina. A partir do ano que vem, estará também em Goiás, Distrito Federal e Rio Grande do Sul.

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Da esquerda para direita: Osvaldo César Possari, Caio Possari e Márcio Zanon (Foto: Osmar Veiga)

Dificuldades na estrada

Se hoje ainda falta infraestrutura para rodar por Mato Grosso do Sul, na opinião dos sócios, antigamente era pior. Enxadão, pá e facão eram o kit que os motoristas precisavam carregar para conseguir passar por algumas estradas no interior e até em Campo Grande, ainda na década de 1990.

Apesar disso, o objetivo de ampliar as operações no Estado foi cumprido em só uma semana. “O Oswaldo era um visionário. Decidiu e ‘abriu’ em uma semana todo o Mato Grosso do Sul. Foi um diretor para um lado, outro diretor para o outro e fomos alugando espaço", lembra Márcio, que hoje é o diretor de logística. Foi o pontapé que fez a empresa começar a crescer.

O início foi na base do fazer para crer, conta. "A frota a gente já tinha e começamos a adaptar, mas chegamos a ir até Chapadão do Sul com um carro próprio, uma Parati, levando uma caixinha só. Arrancamos os bancos e banheiros de ônibus para deixar só o ‘salão’ para transportar carga”.

Na época, era comum os motoristas chamarem regiões pelo nome de “Vaca Parida” e “Canta Galo” porque era preciso esperar bezerros nascerem no meio da estrada ou galo cantar para desatolar um ônibus e seguir viagem.

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Filho mais velho do fundador e um dos diretores, Osvaldo César fala de memórias e o momento atual da empresa (Foto: Osmar Veiga)

A Cruzeiro do Sul teve até braço na pecuária nos anos 2000 porque, além de astros, o fundador gostava de fazenda e animais. Chegou a ser premiado pelo feito da primeira inseminação em bovinos no Brasil.

O começo da empreitada foi curioso: um cientista que fazia parte da primeira equipe foi parado numa rodovia, a 140 km/h, e justificou que corria porque carregava embriões de vacas no útero de uma coelha. “Tenho que chegar em Campo Grande com eles vivos”, falou o motorista. O policial respondeu: “Uma mentira dessa, ninguém nunca me contou”.

Embriões chegaram a ser vendidos para Costa Rica e México antes de a família vender todo o rebanho.

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Márcio Zanon entre um caminhão e uma van que fazem parte da frota (Foto: Osmar Veiga)

Novos tempos

Mesmo com as concessões de rodovias e as obras da Rota Bioceânica na atualidade, as dificuldades seguem, principalmente nos trechos que recebem intervenções e por onde passam pesadas carretas carregadas de minérios, além da ponte sobre o Rio Paraguai.

“Às vezes a gente faz um projeto e a infraestrutura não chega junto. Não é uma crítica aos governos, mas temos que dizer que nosso Estado ainda carece muito dessa infraestrutura”, fala Osvaldo, que é o diretor administrativo-financeiro.

Os efeitos da reforma tributária estão a caminho e o preocupam, hoje. “O que vai ser em janeiro do ano que vem? Nós não sabemos ainda. Tem muita coisa sendo ajustada e regulamentada. É uma insegurança. Quando aumenta R$ 1 no diesel, aumenta mais de R$ 500 mil em custos para nós por mês. Isso não depende de nós, da nossa gestão”, avalia.

Com um mundo que faz acordos para reduzir a emissão de gases poluentes e clientes que exigem essas medidas para transportadores, a Cruzeiro do Sul decidiu equipar toda a frota com o motor Euro 6, que é menos poluente, e participa de um programa que mede o nível de fumaça emitida pelos veículos.

“Fazemos, mas também somos exigidos pelo mercado. Temos que atender a esse padrão alto de qualidade”, diz Osvaldo.

Já na 5ª geração, empresa familiar cresceu enfrentando estradas ruins e crises
Sede administrativa da Cruzeiro do Sul, em Campo Grande (Foto: Osmar Veiga)

Nada é perfeito

As crises também estão na relação entre os parentes, mas nada que alimente o senso comum de que “trabalhar com parente não dá certo”.

Para evitar confusão, os grupos de WhatsApp são separados. O acordo é não tratar de negócios no grupo da família e não tratar de família no grupo do conselho. “A gente tenta separar, evoluímos muito nisso. Já tivemos vários consultores”, conta o diretor administrativo.

“Graças a Deus, os conflitos diminuíram muito. Mas é lógico que ainda existem, conflito existe em todo lugar. Meu pai costumava dizer que conflito só não tinha no cemitério, porque lá acabam todos os problemas. Nós nos gostamos muito, isso ajuda”, continua Osvaldo.

E a família que leva passageiros para tirar férias ou ver parentes no interior do Estado raramente consegue ela própria tirar férias concomitantes. É porque cada um cuida de uma parte do negócio que não pode ser deixada de lado em determinadas épocas do ano, explicam os sócios.

Isso era possível quando o negócio ainda era pequeno e deixou memórias especiais. “Meu pai gostava de ir para a praia, ele tinha uma Belina branca e a gente colocava um colchão no porta-malas, naquela época podia. A minha mãe fazia um frango na panela de pressão, um pão, uma Coca-Cola, uma azeitona e isso era o nosso almoço daqui até a praia. Depois foi melhorando, a gente começou a ir de Veraneio, de avião”, conta o primogênito do fundador.

Se a Cruzeiro do Sul chega à sexta geração ou não, é uma questão que os sócios não discutem. Os netos são muito jovens e vão decidir no seu tempo, defendem os atuais administradores.

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