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A mãe empreendedora

Por Orlando Oda (*) | 09/05/2014 15:08

Dona Tieko nasceu no Japão e veio ao Brasil aos 8 anos de idade. Mal sabia que todos os seus sonhos de estudar e ter uma profissão tinham ficado por lá. Como quase todo imigrante, foi morar no interior do estado de São Paulo, na roça. Longe da civilização, sem conhecer a língua, não havia como estudar.

Assim, tudo que sabia vinha dos dois anos de estudo no primário do Japão: hiraganas, katakanas e operações aritméticas. Para aprender mais foi necessário aprender sozinha alguns “Kanjis”. Isto lhe possibilitou ler revistas e jornais em japonês. Sem TV e rádio, só algumas revistas velhas eram fontes para adquirir mais conhecimentos.

Aprendeu a cozinhar vendo a mãe. Mais tarde, aprendeu também a costurar a roupa vendo as tias costurarem. Nesta altura da vida já havia concluído que todos os sonhos de criança tinham ficado lá, quando saiu do Japão. Deve ter questionado o por quê de ter que viver desta forma sem esperança de qualquer realização pessoal.

Casada e já com filhos, veio morar em São Paulo. As únicas habilidades que possuía eram cozinhar e costurar. Não sabia falar português. O círculo de amizade era muito pequeno, restrito a algumas senhoras japonesas. Tinha que ter uma fonte de renda. As duas únicas possibilidades eram cozinhar ou costurar.

Optou por costurar, por uma razão lógica. Podia trabalhar sem sair de casa. Podia cumprir as funções de mãe, cuidar da casa, cozinha, lavar roupa, cuidar do marido e dos filhos. Embora o trabalho significasse dinheiro, era também a forma de se sentir útil, ajudando no orçamento familiar.

Tinha que cumprir cotas e prazos. Assim, a jornada de trabalho se estendia até altas horas da noite, muitas vezes avançando a madrugada. E a jornada do dia seguinte começava às cinco horas da manhã. Praticamente não tinha finais de semana livres porque na segunda-feira era o dia da entrega das roupas produzidas.

Percebeu que tinha uma oportunidade de ter um negócio próprio e ter mais renda. Em vez de costurar roupas para uma fábrica, ela podia costurar, fabricar e vender as roupas. Tinha muita criatividade, habilidade e força de vontade. Desta forma trabalhar não era problema.

Dotada de uma extraordinária percepção viu que ter um negócio próprio exigia novos conhecimentos e habilidades. Veja: a) especializar-se em um determinado tipo de roupa: masculina ou feminina; b) comprar tecido e aviamentos; c) costurar vários modelos e tamanhos; d) buscar os compradores; e) contratar pessoas f) administrar o negócio: pessoal, pagamentos, recebimentos, caixa e bancos.

Para viabilizar o seu sonho de negócio teria que adquirir novos conhecimentos. Em primeiro lugar, foi aprender português, ter mais contatos, comunicar com clientes, fornecedores, funcionários, ler revistas de moda, entender os noticiários econômicos. Em segundo lugar, aprendeu a gerenciar pessoas, administrar o dinheiro e planejar, sempre visualizando o futuro.

Num caderninho montou o que o pessoal chama hoje de “business plan”. Relacionou as tarefas, as habilidades necessárias, dimensionou máquinas, tempo, dinheiro. Viu que empreender exigia muito mais do que a habilidade de costurar. Exigia muito mais tempo do que apenas para costurar e, além disso, necessitava de tempo para ser mãe.

Optou com sabedoria: ser mãe. A solução sábia: “Filho estuda, você precisa estudar, formar, falar e comunicar corretamente para vencer na vida. Você precisa ser mais do que engenheiro”. Isto porque eu dizia que queria ser um construtor. Sem mesmo empreender, sabia que não bastava só saber produzir. Mãe, muito obrigado por mais essa lição.

(*) Orlando Oda é administrador de empresas, mestrado em administração financeira pela FGV e presidente do Grupo AfixCode.

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