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As lições da renuncia de Bento XVI para as organizações

Por Marcos Morita | 19/02/2013 13:56

A renúncia do Papa Bento XVI vem ao encontro de um assunto que tratei recentemente em minhas aulas na Universidade. Abordávamos o tema “Antecedentes da Administração”, em suma, acontecimentos ou períodos da história correlacionados com a teoria administrativa anteriores a Taylor e Fayol, ambos criadores da Teoria Clássica.

A igreja católica sempre foi tida como exemplo de hierarquia forte, controle rígido e centralização, citando a instituição secular que conseguiu expandir suas fronteiras de atuação em uma época caracterizada pelas corporações de ofício, artesões e pequenas aldeias com pouca ou nenhuma comunicação entre si. Cardeais, patriarcas, arcebispos, bispos e padres compõem o intrincado organograma composto por cargos como: prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica e Vice-Presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano, só para citar alguns exemplos.

Neste tipo de organização, também denominado como mecanicistas, regras, procedimentos e burocracia são a tônica, gerando um sistema apático, lento e ineficiente, movido a favores e influências políticas, citadas como uma das razões da renúncia. No outro oposto, as organizações orgânicas apresentam maior flexibilidade e estimulo à inovação e criatividade, típicas das atuais startups e empresas de internet. Em épocas de redes sociais e microblogs, não é surpresa que as empresas do segundo grupo tenham maior sucesso num mundo dominado pela rapidez e fluidez das informações.

A igreja também nos leva a pensar sobre a questão da missão, visão e valores das organizações. Duradouras - até certo ponto, já que não se pode mudá-las na mesma velocidade das promoções de vendas - podem e devem ser revistas periodicamente, avaliando-se os cenários e tendências, assim como seus impactos e possibilidade de ocorrência, como destacou o professor da Universidade de Berkeley, David Aaker, em sua matriz impacto versus premência. É clássico também o artigo de Theodore Levitt, Miopia em Marketing, publicado nos anos sessenta na Harvard Business Review, mencionando a derrocada do sistema ferroviário nos Estados Unidos, até então insuperável e insubstituível meio de transporte.

Avancemos algumas décadas até a época dos filmes de 24 ou 36 poses, indispensáveis em qualquer viagem, casamento ou festinha de aniversário. Sua criadora e líder é hoje uma sombra do império que foi no passado, levando-se em consideração o competitivo mercado de imagens digitais. Seus executivos, preocupados em proteger seus empregos ou talvez desdenhando a nova e incipiente tecnologia, foram engolidos pelos novos entrantes. Discos de vinil, CDS e DVDS seguiram a mesma trilha, para a qual se encaminham também livros e jornais impressos.

Um paralelo pode ser feito com a igreja católica no Brasil. Conforme levantamento realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o país foi a nação católica que mais perdeu fiéis nas últimas décadas. Em 1970, mais de 90% dos brasileiros se diziam católicos, número hoje que mal chega aos 65%. Grande parte destes fiéis migrou para as igrejas cristãs pentecostais, as quais passaram de meros 5% para mais de 20% no período, não obstante os esforços de padres como Marcelo Rossi e seu movimento de Renovação Carismática.

Enfim, qualquer executivo ou conselho de administração preocupar-se-iam com o cenário apresentado: perda de clientes, queda na participação de mercado, produtos e serviços desgastados, estrutura hierárquica engessada, excesso de burocracia, falta de inovação, feudos, dissidências internas, escândalos políticos e financeiros, apesar da marca e tradição quase inabaláveis.

De maneira generalista, este será o cenário que encontrará o próximo papa. Apesar da fumaça branca tão esperada com o fim do conclave, o mandato será caracterizado por trovoadas, nuvens negras e desafios, comparável aos mais badalados e bem remunerados CEOS, os quais pagam com o próprio cargo, resultados abaixo do esperado. Isto era impensável na igreja católica. Hoje não mais, graças a Bento XVI.

(*)Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

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