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Massacre na escola

Por Carlos Eduardo Rios do Amaral (*) | 09/04/2011 10:17

O massacre dos alunos mortos ocorrido na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste da Cidade do Rio de Janeiro, traz ao atemorizado cidadão a indagação sobre como anda a realidade manicomial brasileira e nossa política pública de saúde mental.

Em artigo de minha autoria, intitulado “Um olhar sobre a Lei Maria da Penha: portadores de deficiência mental” (1/3/2011), tive a oportunidade de fazer algumas considerações sobre o crescente e assustador número de famílias envolvidas com questão da doença mental entre algum ou alguns de seus membros e a problemática da violência doméstica e familiar.

O núcleo familiar, sem nenhuma dúvida, é a sede primeira onde sentido e verificado os primeiros sintomas da pessoa portadora de transtorno mental. Mesmo sem um diagnóstico médico-psiquiátrico, os componentes da célula familiar sabem que o parente mentalmente enfermo destoa ou se afasta daquilo que chamamos de “normalidade”. A convivência é implacável no sentido de se atestar que alguma coisa não vai bem.

E, em linhas gerais, pode-se classificar essas famílias que vivenciam este peculiar pesadelo familiar em dois grandes grupos: as que jamais desistem em ajudar o parente mentalmente enfermo, prestando-lhe todo o auxílio possível, e, de outro lado, as que desistem, por diversos fatores conhecidos.

Neste cenário de sincera comoção nacional, urge dizer que a razão que mais se sobressai, dentre todas, para levar muitas famílias a “entregar os pontos” no que diz respeito ao parente insano, acometido de grave enfermidade mental, é a insuficiência de uma política pública de saúde mental universal, regular e gratuita.

Todos que militam nos Juizados da Lei Maria da Penha sabem que no seu triste dia-a-dia a lamentação “doutor, eu só queria uma internação, que ele fosse tratado” é súplica aflitiva constante. Não seria eu um mago ou vidente em dizer que na próxima semana ouvirei essa frase pelo menos umas dezenas de vezes.

Aqui, abro um parêntese, para reconhecer o sucesso dos tratamentos nominados “hospital-dia”, que muito se aproximam de tratamentos ambulatoriais, desenvolvidos também pela rede pública de saúde. Também não me omito em fazer aqui ligeira menção àqueles familiares que vêem numa perpétua internação estratégia para o cruel desterro do parente insano, “para se livrar do problema”.

Acontece que, em determinados casos, sempre os mais gravíssimos e de efeitos mais desastrosos para o seio familiar, a alternativa única e profilática para tratamento do doente mental passa necessariamente por uma pronta internação, para se conter a fúria e inquietação não mais suportada pela família.

Agravando ainda mais toda essa situação familiar, cabe registrar que muitos desses portadores de transtornos mentais, hoje, também fazem uso da barata cachaça e do maldito “crack”. Substâncias que maximizam ainda mais o drama de muitas famílias.

O Código de Processo Penal brasileiro prevê aquilo que chamamos de “incidente de insanidade mental” para substituir a indevida prisão criminal do insano pela medida compulsória de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.

Mas essa previsão legal, nos dias atuais, no plano prático, mais se aproxima da utopia constitucional do salário-mínimo como meio para satisfação de todas as necessidades do trabalhador e de sua família, do que regra processual vigente. Para também desespero de nossa gloriosa e dedicada magistratura nacional que se vê diante de disposição legal impraticável.

O trágico e funesto episódio da Escola Municipal, na Cidade (ainda) Maravilhosa, faz despertar na consciência de toda a Nação a questão da política pública de saúde mental brasileira e a questão da reconstrução de nosso aparato manicomial. Ainda, provoca em cada família do País a necessidade de uma aproximação ainda maior do parente mentalmente enfermo.

Tudo, para que outros massacres patrocinados pela insanidade não arrasem a vida de crianças e jovens inocentes. Jamais esquecendo que o doente mental também é um inocente. A culpa deve ser debitada a todos os fatores reunidos que culminaram na ausência de um tratamento médico-psiquiátrico acessível e eficaz.

(*) Carlos Eduardo Rios do Amaral é defensor público no Espírito Santo.

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