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O equívoco do discurso de extinção da Justiça do Trabalho

Francisco das Chagas Lima Filho* | 12/01/2019 17:50

Novamente, e agora pela autorizada voz do Senhor Presidente da República, se volta a defender a extinção da Justiça do Trabalho, como se ela fosse a culpada pelo grave problema do desemprego que, como sabemos, é fruto de uma das mais graves crises econômicas, política e moral em que o pais mergulhou a partir de 2014.

Aqueles que defendem a tese da extinção, agora afirmada pelo mais alto mandatário da República, certamente estão esquecidos da importância social e até mesmo política da Justiça do Trabalho. Ela tem prestado relevantes serviços à sociedade desde sua criação há mais de setenta anos, na concretização dos valores sociais do trabalho, direito fundamental constitucionalmente garantido pelos artigos 1º, inciso IV e 6º da Carta de 1988, representando um dos fundamentos e pilares da República e do modelo de Estado Democrático de Direito adotado pelo constituinte originário e que, por essa razão, constitui cláusula pétrea insucessível de eliminação por emenda constitucional (art. 60, inciso III, § 4º, inciso IV).

De fato, o Direito do Trabalho não é e nem pode ser considerado uma dádiva do Estado, do Poder. Antes, é fruto de lutas e conquistas históricas da classe trabalhadora e também dos empresários, que lutaram na década de 40 e ainda continuam lutando, por melhores condições de vida e de trabalho.

Desse modo, não pode e nem vai ser destruído pela vontade de alguns detentores episódicos do Poder, por mais autorizados que possam ser, apenas porque as decisões da Justiça do Trabalho –criada como instrumento de pacificação social e de equilíbrio das relações de trabalho, marcadas pela desigualdade material– possam em, determinados casos, não agradar a este ou àquele que delas seja destinatário. Isso decorre da própria finalidade dos órgãos do Poder Judiciário que nem sempre agradam a todos o que, aliás, é inerente ao regime democrático de direito, acolhido pelo poder constituinte originário de 1988.

Vive-se no Brasil o início de um governo que inspira esperança e promete combate à corrupção, desenvolvimento, trabalho, renda e emprego para milhões de brasileiros desempregados, o que, com todo respeito, é totalmente incompatível com a surpreendente fala presidencial de que a Justiça do Trabalho poderia ser extinta. A fala, aliás, mereceu por parte das Associações Nacionais de Magistrados e até mesmo da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho, notas públicas de contestação do cogitado pelo Presidente da República. As notas evidenciam o equívoco de uma proposta de extinção desse órgão do Poder Judiciário.

Deveras, num pais de desempregados, de enormes desigualdades sociais e mesmo de miséria, a Justiça do Trabalho continua sendo e continuará a ser um dos mais importantes instrumentos de composição dos conflitos decorrentes do trabalho humano e de equilíbrio das relações laborais. Ela é composta por profissionais com vocação e formação institucional, social e jurídica para essa honrosa missão, o que foi reconhecido pelo constituinte ao erigi-la como órgão do Poder Judiciário responsável pela composição dos conflitos entre o capital e o trabalho.

Nesse quadro, a par do óbice constitucional anteriormente mencionado, seria um terrível equivoco extinguir-se a Justiça do Trabalho, pois isso implicaria na morte do próprio Direito do Trabalho. Seria manifesta violação à proibição de revogação de preceitos constitucionais marcados pela natureza de cláusulas pétreas e, portanto, fora do alcance do poder de emenda constitucional, além de constituir um lamentável retrocesso social.

Espera-se que o discurso da extinção da Justiça do Trabalho seja revisto. Não apenas pelo Presidente da República, mas por todos aqueles que eventualmente possam com ele comungar.

* O autor é desembargador do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso do Sul

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