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Cidades

MP recusa acordo por considerar "dano expressivo" em investigação de Terenos

Promotoria quer condenação por organização criminosa, fraudes em licitações, corrupção e lavagem

Por Thailla Torres | 01/10/2025 11:04
MP recusa acordo por considerar "dano expressivo" em investigação de Terenos
Policiais durante operação em Terenos, a 31 quilômetros de Campo Grande (Marcos Maluf/Arquivo)

O MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) decidiu levar até o fim a ação penal que investiga um esquema de fraudes em licitações no município de Terenos, sem acordos. A acusação descartou ANPP (Acordo de Não Persecução Penal) e suspensão condicional do processo.

RESUMO

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O Ministério Público de Mato Grosso do Sul decidiu prosseguir com a ação penal que investiga fraudes em licitações em Terenos, rejeitando acordos e suspensão do processo. A investigação resultou em 16 prisões preventivas e 59 mandados de busca e apreensão, revelando um esquema que envolve manipulação de pregões e superfaturamento. O MP solicita a condenação do prefeito por organização criminosa, fraude em licitação, corrupção passiva e lavagem de capitais. Entre as provas coletadas, destacam-se um cheque de R$ 200 mil e mensagens em celulares apreendidos que indicam combinação prévia de preços. A acusação pede ainda indenização de R$ 10 milhões por dano moral coletivo.

Na avaliação dos promotores, a gravidade dos fatos e a falta de requisitos legais impedem qualquer solução negociada. Traduzindo: o Ministério Público pede que a Justiça receba a denúncia, cite os acusados, colha provas em audiência e julgue o mérito, sem benefícios aos envolvidos.

O ANPP é previsto para crimes sem violência e com pena mínima inferior a quatro anos, mediante confissão formal e condições como a reparação do dano. A suspensão do processo exige critérios objetivos e subjetivos, como pena mínima compatível e circunstâncias favoráveis ao caso.

O MP sustenta que nenhuma dessas portas se abre aqui. A acusação enumera quatro pilares para endurecer a posição: dano expressivo ao erário, com prejuízos milionários; reiteração das fraudes; organização das fraudes, com manipulação de pregões e direcionamento; e superfaturamento.

Assim, o MP cobra resposta penal proporcional para coibir novas práticas e recuperar recursos públicos. Há ausência de requisitos legais, como confissão nos termos da lei e limites de pena compatíveis.

MP recusa acordo por considerar "dano expressivo" em investigação de Terenos
Na operação, houve 16 prisões preventivas e 59 mandados de busca e apreensão autorizados

O pedido mais pesado mira o prefeito Henrique Budke. O MP requer que o chefe do executivo seja condenado pelos crimes de organização criminosa, fraude ao caráter competitivo da licitação, corrupção passiva e lavagem de capitais. O pacote inclui penas de reclusão e multa.

Além da pena criminal, a acusação pede a interdição para exercer cargo ou função pública e para dirigir determinadas pessoas jurídicas, por prazo equivalente ao dobro da pena de prisão que vier a ser aplicada.

Confisco de valores e bens ligados aos crimes, incluindo o que foi apreendido nas buscas e o que represente produto ou proveito de corrupção e lavagem.

Indenização mínima por dano moral coletivo de R$ 10 milhões, para reparar o abalo à coletividade e à confiança na administração pública.

MP recusa acordo por considerar "dano expressivo" em investigação de Terenos
Prefeito de Terenos Henrique Wancura Budke, durante cerimônia de posse em 1º de janeiro deste ano

O que as apreensões revelaram

Houve 16 prisões preventivas e 59 mandados de busca e apreensão autorizados pelo TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). As buscas colheram elementos materiais e digitais. Entre os itens destacados está um cheque de R$ 200 mil, apontado pela acusação como indício de vantagem indevida e de vínculo financeiro entre investigados.

Outro eixo central são os celulares apreendidos. Após autorização judicial, mensagens, registros e arquivos passaram por perícia. Segundo o MP, esse material reforça a existência de um padrão de atuação: combinação prévia de preços, “coberturas” para simular concorrência e tentativas de mascarar a verdadeira dinâmica dos certames.

As conversas, gravadas entre 2022 e 2023, foram destacadas pelo Ministério Público como principais provas do funcionamento da organização criminosa.

09/09/2022 – Prefeito combina certame com empresário

Na primeira interceptação destacada, Budke fala com Eduardo Schoier, dono da Conect Sistemas Elétricos. O prefeito assegura que a licitação já estava definida.

Transcrição:

Henrique Budke: “Fica tranquilo, essa já tá na tua mão. Só ajeita a proposta como combinamos.”

Eduardo Schoier: “Pode deixar, prefeito. Vou arrumar tudo certinho. O senhor sabe que pode contar comigo.”

14/10/2022 – Cobrança de acerto após medição de obra

Um mês depois, o prefeito volta a falar com Schoier, dessa vez cobrando repasse depois de liberação de pagamento.

Transcrição:

Henrique Budke: “Saiu a medição, agora você tem que acertar aquele negócio.”

Eduardo Schoier: “Sim, prefeito, hoje mesmo faço o repasse.”

23/01/2023 – Conversa sobre divisão de contratos

Em diálogo interceptado, o empresário Arnaldo Godoy Cardoso Glagau, da Agpower Engenharia, conversa com outro membro do grupo sobre a partilha de obras.

Transcrição:

Arnaldo Glagau: “A escola fica comigo, a unidade de saúde vai pro Rinaldo. Tá tudo certo.” – Interlocutor: “Fechou, do jeito que o prefeito pediu.”

15/03/2023

Pedido de cobertura política Budke aparece em nova ligação, dessa vez pedindo a um aliado que “segure” vereadores da base para evitar questionamentos.

Transcrição:

Henrique Budke: “Fala com eles, diz que tá tudo dentro da lei, não tem risco nenhum.” – Aliado: “Pode deixar, vou acalmar os caras. Não pode vazar nada.”

27/07/2023 – Prefeito reclama de atraso em propina

Já em meados de 2023, Budke pressiona Rinaldo Cordoba de Oliveira, da Tecnika Construções, pelo atraso em um repasse.

Transcrição:

Henrique Budke: “Você tá atrasado comigo, esse acerto já era pra ter sido feito.”

Rinaldo Cordoba: “Prefeito, eu sei, mas ainda não caiu tudo na conta. Assim que cair eu levo aí.”

Há ainda provas documentais em procedimentos específicos. Um exemplo é a Dispensa 033/2024, cujo processo administrativo completo foi apreendido. De acordo com a denúncia, o caso repete o mesmo modus operandi de direcionamento, com vencedor previamente assegurado e cotações combinadas. O objeto do contrato era a instalação de reservatório no Assentamento Patagônia, por R$ 46.974,24.

Com esse conjunto, o MP pediu, desde o início, que valores e bens apreendidos sejam declarados perdidos em favor do Estado em caso de condenação. É a estratégia clássica para evitar que dinheiro público desviado permaneça no patrimônio dos envolvidos.

Sem acordo e sem suspensão, o caminho é o rito tradicional: análise do recebimento da denúncia, citação dos réus, defesa prévia, instrução com oitivas e novas perícias, alegações finais e sentença. Se houver condenação, além das penas criminais, podem vir medidas cíveis típicas de improbidade, como ressarcimento ao erário, multas e proibição de contratar com o poder público.