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Cidades

“Estamos tão longe de casa, buscando recurso maior pela família”

Haitianos em Três Lagoas vivem o drama da separação de seus filhos

Osvaldo Júnior | 11/10/2017 11:42
“Estamos tão longe de casa, buscando recurso maior pela família”

Não se trata apenas do drama de um povo, de uma nação. Trata-se do drama de famílias. Deixar o Haiti custa caro: é um investimento que poderia ser feito apenas por um membro da família, o mais preparado para o mercado de trabalho, em geral, jovem e homem. Com isso, crescem no Haiti crianças com pais distantes.

No plano comum esboçado pelos haitianos, primeiramente viria o homem; depois de empregado e com alguma segurança financeira, traria a mulher e os filhos. “Só que não tem emprego pra todos os homens e menos ainda pra esposas. Quanto a esposa vem, às vezes consegue trabalho, mas muitas vezes não”, relatou Myrlyonord Compere.

Com a dureza da realidade frustrando os planos, os haitianos se separaram de seus familiares, de modo mais acentuado, de seus filhos. As mulheres, embora em menor número (ao menos, pelo que se percebe em Três Lagoas), também migraram em busca de emprego.

A história se repete: homens e mulheres que saíram do Haiti quando os filhos eram muito pequenos, sofrem com a dificuldade de reaproximação.

Edouard Casseus, em seu programa de rádio (Foto: Divulgação)
Edouard Casseus, em seu programa de rádio (Foto: Divulgação)

“Falo com meu filho por Skype. Ele tem quatro anos. Ele sempre pergunta: ‘você é meu pai mesmo?’ Eu falo: ‘Sou sim, filho, sou seu pai’. ‘Mas por que você não vem me ver?’ Eu choro, mas não deixo ele me ver chorando”, conta Edouard Casseus, 30 anos, que retoma, no Brasil, a profissão que exercia no Haiti, a de locutor. Ele desenvolve projeto de rádio pela internet e busca tornar mais conhecido um programa que trata sobre a cultura haitiana. 

Quando Edouard deixou o Haiti, seu filho tinha alguns meses de vida. “Ele ficou doente no Haiti e eu não estava perto dele”, contou, com voz marcada mais pela tristeza que pelo sotaque. “Mas eu saí de lá pra buscar vida melhor pra família”, acrescenta, buscando uma justificativa, que sua história dispensa.

Miterlot é engenheiro civil e realiza serviços gerais em uma fábrica de refrigeradores (Foto: André Bittar)
Miterlot é engenheiro civil e realiza serviços gerais em uma fábrica de refrigeradores (Foto: André Bittar)

O engenheiro civil Miterlot Mezilier, 35 anos, que faz serviços gerais em uma fábrica de refrigeradores, também tem, no Haiti, esposa e filhos que não vê há três anos. “Tenho dois meninos de nove e 14 anos”, informou. “Dá muita saudade. Eu ligo e falo com minha esposa e meus filhos. É uma saudade que dói muito”, disse.

Pouco dinheiro – A maior barreira para rever os familiares é financeira. Os haitianos recebem, geralmente, um salário mínimo (R$ 937). Precisam pagar aluguel – as moradias mais simples são alugadas pelo valor médio mensal de R$ 400. Sobram R$ 537 para outras despesas e para enviar à família.

Walmer, sociólogo, veio ao Brasil quando o seu filho caçula tinha quatro meses (Foto: André Bittar)
Walmer, sociólogo, veio ao Brasil quando o seu filho caçula tinha quatro meses (Foto: André Bittar)

Com esse orçamento e com o custo para viajar ao Haiti, visitar familiares é algo quase inatingível. “O problema da passagem é muito sério. Nós ganhamos R$ 937 e a passagem pro Haiti custa R$ 4 mil. Como vamos ver família no Haiti? Essa passagem devia ser mais barata”, reclama o sociólogo Walmer Meus, 30 anos.

Em Três Lagoas, Walmer trabalha na mesma fábrica que Miterlot. O sociólogo deixou no Haiti a mulher e dois filhos, de quatro e sete anos. “Quando vim pra cá, meu filho mais novo tinha quatro meses”, contou.

Não mais distante de casa – Assim como os homens, as mulheres também sofrem com a distância dos filhos. “Só da minha filha”, respondeu Onite Galaud, 31 anos, sobre o que sente falta do Haiti.

Onite, que é auxiliar de serviços gerais em um hotel em Três Lagoas, saiu do Haiti há quatro anos, um ano depois do marido, que trabalha na construção civil. O filho, de um ano, nasceu no Brasil. A filha, de oito, ficou com a mãe de Onite.

O sonho de Onite é ter a própria casa em Três Lagoas e trazer a filha. “Nós vamos fazer uma casa no Brasil. Gostei muito daqui. Adorei aqui!”, exclamou, mergulhando em seu sonho e trazendo de lá uma Onite feita só de alegria.

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