“Irresponsável, não assassino”, diz mãe do réu por morte de garotinho de 2 anos
Laudo diz que trauma na cabeça de criança é “compatível com queda” e comprova versão de acusado, defende mãe
Temendo pela segurança do filho na prisão, a mãe de Eduardo José Barbosa, de 25 anos, acusado de matar o garotinho de 2 anos e 5 meses, em janeiro deste ano, decidiu quebrar o silêncio. Passados sete meses do dia que viu a vida virar de cabeça para baixo, a trabalhadora autônoma de 43 anos procurou o Campo Grande News para “gritar ao mundo” a versão do réu sobre a morte da criança, mesmo com o processo contra o filho correndo em segredo de justiça.
Ela diz que laudos periciais e outros detalhes da investigação comprovam os fatos conforme narrados pelo acusado. “Meu filho foi irresponsável. Eles foram irresponsáveis. Mas ele não é assassino!”, afirma a mãe, que concedeu à reportagem entrevista gravada por áudio, mas pediu para ter o nome e a imagem preservados, uma vez que precisou mudar de casa e já registrou 4 boletins de ocorrência por ameaças recebidas desde que Eduardo se “envolveu” no que ela classifica como fatalidade.
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“Colocavam bilhetes na minha porta me chamando de ‘mãe de assassino’”, relata.
Eduardo José, também conhecido como “Kadu” pelas ruas dos bairros da região sul de Campo Grande, e Marcieli de Jesus Vieira respondem na Justiça pelo crime de homicídio qualificado por motivo fútil e meio cruel. Em sigilo, o caso já começou a ser julgado e no dia 5 de junho, parte das testemunhas foram ouvidas em juízo.
O bebê, filho da jovem de 19 anos, passou 20 dias em coma na Santa Casa de Campo Grande até a morte ser constatada na tarde do dia 12 de fevereiro deste ano, uma segunda-feira. Mãe e padrasto já estavam presos, desde o dia 1º daquele mês, suspeitos de espancar o menino.
A autônoma diz que o filho a procurou logo depois do ocorrido 23 de janeiro de 2024, e contou o que aconteceu: o garotinho caiu do muro da casa invadida no Jardim Colibri, bairro do norte de Campo Grande, onde Eduardo e Marcieli estavam se abrigando com as crianças há alguns dias.
O réu relatou que, na manhã daquela terça-feira, a moça saiu com filha mais velha, de 4 anos, em direção à casa da avó materna das crianças. Pediria alguma ajuda, já que todos estavam sem lugar para morar, sem comer. No caminho, ela deixaria o celular de Kadu numa conveniência para que fosse carregado, já que o imóvel onde estavam não tinha energia elétrica.
Pouco tempo depois, narra a mãe com base no que escutou o filho contar, Eduardo resolveu deixar a casa e buscar o telefone. Como estava com o garotinho, o colocou em cima do muro lateral da residência para pular e pegar a criança do outro lado. Neste momento, o menino caiu com a cabeça em uma área de concreto.
“Ele viu que o bebê ficou molinho, entrou em desespero e resolveu correr atrás da mãe da criança. Meu filho nunca foi padrasto do bebê. Ele teve um relacionamento com a Marcieli em novembro e dezembro do ano passado, eles terminaram e dois, três dias antes do que aconteceu, ela ligou para o Eduardo dizendo que não tinha para onde ir com as crianças. Meu filho ficou com dó, a buscou na praça e levou para onde ele estava morando”, afirma a mãe.
A autônoma conta que não sabia que o rapaz estava vivendo sob teto invadido. Antes, ele morava em quitinete, mas perdeu o quarto depois de ficar desempregado. A mãe também diz que Kadu fazia serviços braçais, por empreitada – trabalhou em carvoarias, como servente de pedreiro, por exemplo.
A entrevistada completa afirmando que imagens de câmera de segurança juntadas ao processo comprovam a dinâmica – às 10h45, Marcieli aparece na rua com a filha, enquanto Eduardo deixa o imóvel às 11h05, apressado, atrás da mãe da criança. Depois, os três voltam ao imóvel, a mãe deixo o local com o menino no colo e por último, Kadu.
O erro deles foi não ter contado toda a verdade. A Marcieli ficou com medo de perder a guarda das crianças e meu filho teve medo de ser preso, mas se eles tivessem falado a verdade desde o começo, não estariam até hoje na cadeia. Foi uma fatalidade, não foi um crime”, afirma a mãe.
Laudo - Outro dado que comprova a versão de Kadu, segundo a autônoma, está em laudo de médico legista juntado ao processo no dia 5 de junho, três meses depois que o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) já havia oferecido a denúncia contra o casal por homicídio qualificado por motivo fútil e meio cruel, além do agravante previsto pela Lei Henry Borel – crime praticado contra menor de 14 anos. Eduardo e Marcieli foram denunciados à Justiça no dia 4 de março e o MP embasou-se na investigação da DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente).
O exame feito no corpo do garotinho no Imol (Instituto de Medicina e Odontologia Legal) aponta que o trauma na cabeça da criança é “compatível com queda”. Diz ainda que, diferente do que foi apurado pelo Campo Grande News com fonte na Santa Casa à época, “não é possível afirmar que houve perda de massa encefálica”, isso porque “perdas de pequena monta nem sempre deixam sinais observáveis em exame de imagem (tomografia)”.
A mãe, por fim, nega que o filho estivesse em fuga quando foi “pego” pela PRF (Polícia Rodoviária Federal), no dia 30 de janeiro, na BR-262. “Ele estava indo trabalhar numa horta na BR. Eu que arrumei o serviço para ele”.
Naquele dia, Kadu foi ouvido e liberado, mas no dia 1º, acabou preso preventivamente. Desde então, permanece em presídio. A trabalhadora autônoma relata, contudo, que no dia 31, ela estava com o filho em delegacia. Os dois registraram boletim de ocorrência por difamação contra página no Facebook que divulgava “informações” sobre a morte da criança, fotos e outros dados. “O mandado de prisão contra eles só saiu depois, às 19h26 do dia 31”, explica.
A mãe acredita que tudo será esclarecido ao longo do processo e espera que o filho tenha um julgamento justo. “Meu filho não é assassino, não foi julgado até o momento, ele não foi condenado. Eu tenho fé que ele vai responder em liberdade”.
Ela contratou advogados para defender o rapaz e pedido de revogação da prisão preventiva, com base nas novas informações, já foi feito à Justiça.
Enquanto isso, Eduardo corre sérios riscos na prisão, afirma a mãe. “Ele está jurado de morte. Falam que ele é assassino de criança. Já foi trocado de pavilhão três vezes”.
Vida nômade – Os 2 anos e 5 meses do bebê não foram de uma vida estável. Mesmo assim, o garotinho demonstrava nem ligar para o que lhe faltava, como na foto que congelou o tempo no momento em que os olhos do pequeno são espremidos por sorriso espontâneo.
O clique que circulava nas redes sociais quando o garotinho ainda estava em coma mostra o menino feliz, apesar da camiseta maior que o corpinho e dos chinelos improvisados. O cenário é uma calçada de cimento de uma casa simples, assim como era o imóvel onde ele viveu os últimos dias, no Jardim Colibri, região do Universitário, no sul da Capital.
O endereço foi um dos muitos pelos quais a criança e a irmã passaram na companhia da mãe. A família vivia em situação de rua, dormindo em imóveis abandonados e até numa Kombi deixada em via pública, afirmou a delegada Nelly Macedo, da DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente), responsável por investigar o que levou o garotinho ao coma por traumatismo craniano, no dia 1º de fevereiro.
Detalhes do que aconteceu no interior do imóvel não eram conhecidos até aquela coletiva e a perícia poderia ajudar a esclarecer. Mas, a delegada afirmou na ocasião que o casal havia contado três histórias diferentes para justificar o estado em que o menino estava quando acionaram socorro, nenhuma delas compatível com as lesões que a criança apresentava.
Com a criança já desmaiada, uma quadra acima do imóvel invadido, o casal acionou o socorro, pouco depois das 11h do dia 23 de janeiro. O Corpo de Bombeiros foi chamado, mas o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) enviou uma ambulância. Para a equipe de socorristas, os dois contaram que a criança havia caído ali mesmo, no meio da rua. No hospital, já sem o rapaz, a mãe disse que o acidente havia acontecido numa escada pequena, na porta de casa. Só na delegacia apareceu a versão de queda de muro.
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