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Capital

"Mata todo mundo": sobrevivente de chacina no Sumatra detalha crime em júri

Mulher, à época grávida de 7 meses, relatou durante julgamento a execução do marido e mais dois homens

Silvia Frias e Bruna Marques | 30/11/2022 10:44
Simei Fonseca e Josiane Nunes durante julgamento esta manhã, em Campo Grande. (Foto: Marcos Maluf)
Simei Fonseca e Josiane Nunes durante julgamento esta manhã, em Campo Grande. (Foto: Marcos Maluf)

“Mata todo mundo”. O depoimento da principal testemunha de tripla execução no Jardim Sumatra, ocorrido em outubro de 2020, descreve com detalhes como as vítimas foram emboscadas e assassinadas a tiros. A mulher, à época grávida de 7 meses, escapou depois da arma falhar por três vezes. “Eu só me entreguei e pedi para Deus ter misericórdia”.

O depoimento está sendo prestado no julgamento dos dois acusados, Simei Fonseca de Araújo, 31 anos, e Josiane Nunes Conceição, 33 anos, em sessão pela 2ª Vara do Tribunal do Júri. Eles são acusados pelo homicídio qualificado por motivação torpe e sem chance de defesa das vítimas Marco Antônio Cavalcante, 36 anos, Alex Vilhagra Ifran, 24 anos, e Weslley da Silva Rodrigues, 20 anos, além da tentativa de homicídio de Odielly Nunes Valente.

O julgamento chegou a ser marcado para setembro, mas foi cancelado a pedido da Defensoria Pública de MS, que alegou necessidade de avaliar informações dos dados telefônicos.

Hoje, Simei e Josiane entraram no plenário, mas, logo em seguida, foram retirados para que Odielly pudesse estar em frente ao juiz Matheus da Silva Rebutini e prestar depoimento.

É o relato dela que traz detalhes dos momentos finais das vítimas, assassinadas por volta das 3h do dia 31 de outubro de 2020, na Rua Augusta Rossini Guidi. Um dos executados era seu marido, Alex.

Simei e Josiane estão sendo julgados por 3 mortes. (Foto: Marcos Maluf)
Simei e Josiane estão sendo julgados por 3 mortes. (Foto: Marcos Maluf)

Odielly conta que ela e o marido haviam saído de reunião política e, de moto, passaram na rua, encontrando Marco Antônio e Weslley mexendo em um carro, indicando que estava com algum problema mecânico.

Alex, que eventualmente prestava serviço para Marco, desceu da moto e passou a ajudar os dois. “Ele [Alex] falou para o Marco apagar a luz do carro porque iria descarregar, aí ele entrou para desligar”, disse.

Logo em seguida, quatro pessoas se aproximaram, armadas. Odielly diz que um deles mandou Alex se deitar no chão. “Achei que era assalto, ele mandou todo mundo calar a boca, grudou no meu cabelo e mandou me deitar”. O homem se virou para Marco e disse: “é você mesmo”. Em seguida, atirou. Depois, deu a ordem para a mulher que chegou com ele. “Mata todo mundo”.

Odielly diz que só gritava e pedia misericórdia. A mulher, armada, atirou na outra vítima, Weslley. Alex se levantou e gritou, pedindo para que não matasse a esposa, grávida de 7 meses. “Foi tudo muito rápido, não sei explicar como eu vi tudo”, disse a testemunha. “O homem saiu correndo atrás do meu esposo, atirou nele, pegou de raspão na mão dele e Alex caiu. No que ele caiu, deu tiro e executou meu esposo”.

Enquanto isso, Odielly ficou imóvel, aturdida. A mulher chamou o outro executor e os dois saíram correndo, na direção da mesma esquina que tinham vindo. Um carro preto estava parado com as portas abertas e eles fugiram no veículo.

Odielly correu até o marido e tentou aplicar técnicas de primeiros socorros, aprendidas em curso de enfermagem. Nesse momento, o carro preto voltou e um dos ocupantes apontou a arma em sua direção e atirou três vezes. “Não sei se a arma negou, eu vi uma voz do além mandando eu correr, aí saí correndo e pedi ajuda”.

Duas das três vítimas executadas no Jardim Sumetra, em 2020. (Foto/Arquivo)
Duas das três vítimas executadas no Jardim Sumetra, em 2020. (Foto/Arquivo)

A sobrevivente diz que não conhecia Simei ou Josiane, mas os reconheceu durante a investigação policial. “Ele que chegou mandando eu descer da moto, me puxou pelos cabelos e me colocou no chão”. Também atribui a ele a ordem de execução geral. “Aí mandou a mulher que estava mirando em nós três, falou que podia matar todo mundo”.

A testemunha diz que, desde o episódio, já sofreu ameaças de parentes dos acusados e vive com medo. “Eu falo que eu tô sobrevivendo pelos meus filhos, psicologicamente não tenho vida mais, não penso no meu futuro”, diz. “Parece que a qualquer momento vai chegar alguém e me matar”, contou, emocionada. “Eles não tiveram misericórdia, se não fosse Deus, não estaria aqui hoje”.

Testemunha sendo ouvida durante sessão da 2ª Vara do Tribunal do Júri. (Foto: Bruna Marques)
Testemunha sendo ouvida durante sessão da 2ª Vara do Tribunal do Júri. (Foto: Bruna Marques)

Defesa – Segundo a denúncia do MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul), a execução tinha como alvo principal Marco Antônio e as outras vítimas foram mortas para que não reconhecessem os acusados. A motivação era vingar a morte de Luiz André Alves Vitório, o “André China”, morto em agosto de 2020, aos 32 anos, no Bairro Campo Nobre.

Os outros dois envolvidos não foram identificados durante a investigação.

No depoimento à Justiça, Simei Fonseca relatou que trabalha como operador de caixa, tem oito filhos e teve passado de envolvimento com crime. Ainda menor de idade, foi apreendido por ato infracional análogo a homicídio e receptação. Aos 20 anos, foi preso por roubo.

No triplo homicídio, negou participação. “De jeito nenhum, não sei porque estão me acusando, estava com o pé quebrado, com seguro desemprego, não tenho nada a ver com isso”.

Sobre Marco Antônio, disse que viu em uma festa, mas não eram amigos. Sobre “André Chinha”, alegou que teve uns “oito meses de amizade”, mas não vingou a morte dele. “Queria que analisasse bem a narrativa dessa mulher, porque ela está perdida de alguma forma”, afirmou.

Josiane Nunes, dona de casa, contou que já foi presa por tráfico de drogas e está terminado de pagar a pena. Sobre as mortes, nega envolvimento. “Nunca peguei em uma arma, nunca matei ninguém, estou sendo acusada porque me relacionei com o Simei, mas não tenho nada a ver com isso”. A acusada contou que teve envolvimento em maio de 2020, mas em outubro já tinha voltado ao relacionamento anterior. “Analisem o caso bem, porque estou sendo julgada injustamente, nunca matei ninguém, seja o que Deus quiser”.

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