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Capital

Na rua, muitos resistem a sensação térmica de -2ºC para não ir ao Cetremi

Também pesa nessa balança um problema menos temporário do que a massa de ar polar: a dependência química

Aline dos Santos e Mirian Machado | 06/07/2019 08:27
Cobertor e chinelo: morador de rua na 15 de Novembro, Centro da cidade. (Foto: Henrique Kawaminami)
Cobertor e chinelo: morador de rua na 15 de Novembro, Centro da cidade. (Foto: Henrique Kawaminami)

Com rajadas de até 45 km/h, o vento, que corta Campo Grande e traz sensação de frio de -2º, varre a calçada onde Eber Luiz Gimenez, 32 anos, tenta dormir. Na manhã deste sábado (dia 6), em Campo Grande, ele é um dos muitos moradores de rua que enfrentam os perigos do frio, que pode levar a morte por hipotermia, e se recusam a aceitar abrigo no Cetremi (Centro de Triagem e Encaminhamento do Migrante).

A maioria não quer seguir as regras do local onde tem hora para comer, tomar banho, mas também pesa nessa balança outro drama: a dependência química. No Cetremi, drogas são proibidas. Na rua, vê-los com cachimbo para consumir droga e visivelmente alterado pelo entorpecente é lugar-comum, como testemunhado pela reportagem.

Eber conta que é pedreiro e morava em São Paulo. Quando se separou da esposa, com quem teve dois filhos, veio para Campo Grande, onde nasceu. Sem parentes por aqui, mora há três anos na rua. “Prefiro ficar na rua. Acho o Cetremi ruim”, diz.

O frio severo não colabora com o sono de quem tem apenas um casaco, touca e coberta fina. “Só vou conseguir dormir quando começar a esquentar”. Se as roupas de frio são escassas, a sorte é melhor no quesito alimentos, com distribuição de comida por grupo de voluntários.

Eber está há três anos nas ruas de Campo Grande: sem documento e sem passagem para voltar. (Foto: Henrique Kawaminami)
Eber está há três anos nas ruas de Campo Grande: sem documento e sem passagem para voltar. (Foto: Henrique Kawaminami)

Ele diz que quer voltar para São Paulo, mas não consegue emprego e nem ajuda para comprar a passagem. “Esse negócio de amor ao próximo não existe não”. Também reclama que não pode ter documentos porque a segunda via do RG custa quase R$ 100.

Com o cachimbo numa das mãos, Eber conversava lúcido, enquanto seu colega, visivelmente estava sob efeito de drogas e a todo tempo tentava encerrar a entrevista. Ele usava chinelos e tinha uma fina coberta.

Na rua 7 de Setembro, próximo ao Mercadão, três pessoas dormiam juntas na calçada. Elas não quiseram falar com a reportagem. Na rua Goiás, no Jardim dos Estados, região nobre da cidade, um morador de rua, que também não quis de identificar, usava edredom e abriu guarda-chuva para deter o avanço do vento.

Trabalho árduo – Enquanto a chegada da massa de ar polar faz as pessoas se preocuparem com os moradores de rua, em arroubos sazonais de solidariedade, funcionários do Centro POP (Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua), localizado na Joel Dibo, mantém o trabalho o ano todo e já sabem que é árdua a missão de tirar alguém da rua.

Equipe do Centro POP consegue um sim de morador de rua. Na foto, ele chega ao Cetremi. (Foto: Henrique Kawaminami)
Equipe do Centro POP consegue um sim de morador de rua. Na foto, ele chega ao Cetremi. (Foto: Henrique Kawaminami)

No começo da manhã, o centro recebeu denúncia e enviou equipe para atender uma pessoa na rua 26 de Agosto, perto da avenida Ernesto Geisel. O Campo Grande News acompanhou a abordagem. Primeiro, o homem de 32 anos disse muitos nãos. Explicando que logo alguém iria buscá-lo, apesar de estar há 25 dias sem teto.

A tentativa só teve sucesso quando foi destacado que, além de abrigo, teria café da manhã. A reportagem o acompanhou até ao Cetremi, perto do Parque dos Poderes, não foi autorizada a entrar. Entre sexta-feira e hoje, 110 pessoas passaram pelo local.

Já o Centro POP fez 33 abordagens e apenas nove aceitaram sair da rua. As equipes trabalham circulando pela cidade, a chamada busca ativa, e também recebem denúncias.

Apesar de difícil,  Valdete da Silva e Iranilda Batista, educadora sociais no Centro POP, afirmam que é gratificante quando conseguem ajudar e que a maior preocupação é de que o frio seja fatal para quem mora na calçada. Elas explicam que o serviço social não pode levar a pessoa à força. A equipe oferece abrigo e encaminhamento ao posto de saúde. Para quem decide ficar, é entregue cobertor.

Ajuda para moradores de rua podem ser solicitadas ao serviço de assistência social pelos números (67) 98404-7529 e (67) 98471-8149. 

No Jardim dos Estados, morador de rua dorme com edredom e usa guarda-chuva para se proteger do vento frio. (Foto: Henrique Kawaminami)
No Jardim dos Estados, morador de rua dorme com edredom e usa guarda-chuva para se proteger do vento frio. (Foto: Henrique Kawaminami)
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