TJMS libera “pílula do câncer” para paciente que busca “última esperança”
Decisão é comemorada pelo esposo, com quem divide a vida há 62 anos: “Ver se salva a minha velha”

O TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) autorizou que uma paciente de 90 anos, em estágio terminal, adquira a “pílula do câncer”, nome fantasia da substância fosfoetanolamina sintética.
O debate sobre o uso da substância no tratamento de câncer ganhou as ruas, tribunais e Poder Legislativo em 2016. Mas naquele mesmo ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) suspendeu a Lei 13.269/2016, sobre produção e uso da pílula do câncer.
No entanto, no último dia 27 de fevereiro, a 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça derrubou decisão da 12ª Vara Cível de Campo Grande e permitiu que paciente compre a substância experimental.
“Observa-se declaração médica no sentido de que os tratamentos convencionais não são mais capazes de surtir efeito que não seja meramente paliativo, encontrando-se em perspectiva de morte em um curto espaço de tempo. Recorrer à fosfoetanolamina é, aqui, a última tentativa de salvar a sua vida”, afirmou o desembargador Dorival Renato Pavan, relator do processo.
A tese de que a substância é a última esperança da paciente foi acolhida pelos desembargadores Amaury da Silva Kuklinski e Odemilson Roberto Castro Fassa, resultando em decisão unânime.
Na apelação, o advogado Carlos Alexandre da Silva Rodrigues destacou que a decisão do Supremo proibiu a comercialização, mas não a aquisição no caso específico da paciente. A compra será de laboratório e não repasse pela USP (Universidade de São Paulo), prática que se tornou comum em 2016.
“Quando se está condenado à morte, qualquer eventual efeito colateral por maior que seja, se torna um bônus, pois qualquer justificativa para deixar de fornecer o medicamento, se traveste em uma sentença de morte!!!”, afirmou o advogado no pedido ao Tribunal de Justiça.
A defesa destacou que houve decisões favoráveis em São Paulo, Santa Catarina, Rondônia e Paraíba. Em Mato Grosso do Sul, a compra também foi autorizada em ações nas cidades de Maracaju e Dourados.
A paciente de 90 anos foi diagnosticada com câncer no esôfago, com metástase pulmonares e de pâncreas. Conforme laudo médico, a mulher é considerada paciente terminal. No processo, devido às condições de saúde, ela é representada pelo esposo.
Conforme a decisão, a fosfoetanolamina sintética deve ser fornecida por laboratório. O pedido é de 1080 cápsulas ou doses. A cápsula tem custo unitário de R$ 3,50, enquanto a dose em pó tem valor de R$ 3.
O MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) foi contra a expedição de alvará judicial para a compra. A promotoria apontou que o pedido foi negado em primeira instância porque a substância está em fase de testes, sem comercialização permitida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
História de amor – Longe de leis, Osório Xavier, 90 anos, aposentado da Marinha do Brasil, comemora a possibilidade de novo tratamento para a esposa Gonçalina Alves Xavier.
“Tivemos uma grande notícia. Agora, estamos aguardando a o alvará e a orientação de como comprar. Ver se salva a minha velha”, diz.
Ele conta que a esposa está em casa, onde recebe atendimento médico. “São 62 anos de casados graça a Deus, um casamento bem-vivido”, diz. A idade avançada não limita a memória e ele viaja no tempo para lembrar a história do casal, que começou em Corumbá, durante a festa de Santa Cecília, padroeira dos músicos. “A sobrinha dela era a rainha da música. Veio namoro, casamento, sete filhos e sete netos", diz Osório.
Pílula - A fosfoetanolamina foi sintetizada pela equipe de pesquisadores chefiada por Gilberto Chierice, do Instituto de Química da Universidade de São Paulo, em São Carlos, há mais de 20 anos, e ficou conhecida nas redes sociais como “pílula do câncer”, pela suposta capacidade de destruir tumores malignos.
No dia 15 de janeiro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criticou a suspensão da Lei da Pílula do Câncer pelo STF. “A Anvisa, por exemplo, não pode protelar por muito tempo a liberação das pautas que interessam à sociedade", afirmou, conforme divulgado pelo UOL.