Campo-grandenses anticonsumismo recuperam até panela de pressão estourada
Oficinas de conserto dizem que conseguem lucrar com clientes que nadam contra a onda do descarte fácil
Em tempos em que o meio ambiente exige menos descarte, há campo-grandenses que colaboram consertando o que estragou em vez de comprar outro para substituí-lo. Até panelas de pressão “renascem” depois de uma explosão, quando o consumidor tem boa vontade. Assim, oficinas tradicionais resistem, apesar do consumismo, com clientes em busca também de economia, é claro.
RESUMO
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Em Campo Grande, a prática de consertar utensílios em vez de comprar novos tem se tornado uma alternativa econômica para muitos moradores. Oficinas de conserto, como a de Antenor Santos, que há 40 anos repara panelas de pressão, e a sapataria de Paulo Antonio dos Santos, atraem clientes em busca de durabilidade e economia. Os serviços variam de preços acessíveis, como a troca de cabos de panelas a partir de R$ 15, até consertos mais complexos, como reformas de roupas que podem custar até R$ 300. Apesar da crescente adesão ao conserto, alguns consumidores ainda consideram os preços elevados, o que pode afastar quem possui menor renda.
Há 40 anos, Antenor Santos, de 61 anos, trabalha em uma oficina de conserto de panelas na Rua Dom Aquino. A profissão foi herdada do sogro. “Conserto todo tipo de panela, menos a elétrica”, explica.
Os serviços prestados vão desde trocar o cabo do utensílio à restauração completa. Até os casos “impossíveis” são solucionados por Antenor. “Quando explode a panela de pressão, não tem mais conserto, mas ainda tem solução. Nós a cortamos e fazemos uma panela nova, assim, dá para recuperar”, afirma.
Para salvar a panela estourada, é preciso investir R$ 30. Já para desempenar, cobra-se entre R$ 35 e R$ 45; sendo este o serviço mais caro oferecido na oficina. O mais barato é a troca do cabo, que custa a partir de R$ 15. O conserto é rápido e leva cerca de uma hora para ser concluído.
Entre os clientes de Antenor estão grandes restaurantes, escolas, donas de casa. “Meus clientes já são fidelizados, porque estou aqui neste ponto há 33 anos. Trabalho o dia inteiro, às vezes fecho aqui às 17h e fico até às 20h na oficina para terminar e poder entregar as panelas aos clientes no dia seguinte”, conta.
Luis Fernando Rondon, de 80 anos, é um dos clientes fiéis que optou pelo conserto da panela em vez da troca. Nesta quinta-feira (30), o aposentado levou pela segunda vez a panela de pressão que já está com ele há pelo menos duas décadas.
“Prefiro consertar porque compensa. Trouxe a minha para trocar a borracha, a válvula e o cabo; tudo ficou em R$ 45. Você não compra outra panela por esse preço. Ele desentorta, desempena e fica como uma panela nova”, contou.
Outro item que já entrou na lista dos consertos foi o guarda-chuva. O item é facilmente encontrado nas lojas com preços a partir de R$ 20, mas na banca de José Teixeira, de 76 anos, o equipamento ganha uma segunda chance com preços a partir de R$ 5.
“Antigamente vinham mais clientes, porque agora vêm menos pessoas para o Centro e, antes, a mercadoria era mais forte. Agora os produtos são mais fracos e, quando estragam, acabam não tendo mais conserto”, explicou.
Apesar de ter diminuído a procura por esse tipo de reparo, logo nas primeiras horas da manhã, Maria Gomes, de 69 anos, já levava seus dois guarda-chuvas para serem arrumados. A aposentada conta que os itens estão com ela há pelo menos 20 anos.
“Essa é a segunda vez que eu conserto eles, comprei os dois lá no Rio de Janeiro. Acho que compensa arrumar, porque esses novos que estão vendendo são muito pequenininhos e são fracos. Esses novos só duram três, quatro dias e já tem que jogar fora. Os meus não, eles são grandes e resistentes”, relata.
Os saltos e sapatos também entram na lista dos que recebem reparos para poderem ser usados por mais alguns anos. Na Avenida Calógeras, a sapataria de Paulo Antônio dos Santos, de 70 anos, mais conhecido como Paulinho, acumula clientes até de outros países.
“Eu tenho clientes no Japão, no Canadá, em Nova York e em Las Vegas. Eles mandam pelo correio para mim. Antes eu ficava próximo a um hotel, então fidelizei muita gente que vinha a trabalho e precisava de um reparo. Minha cliente de Nova York trouxe uma sacola cheia da última vez, porque ela disse que lá não encontra esse tipo de serviço”, explicou.
Paulinho detalha que os serviços mais procurados são de colagem de solas e troca de sola, principalmente de saltos. “A procura é maior entre os ricos. Eles vêm arrumar porque o sapato é bom e não se importam com o preço.”
Os serviços da sapataria têm preços que iniciam em R$ 10, como a colagem simples, e outros que podem passar dos R$ 60, como a costura de um tênis. “Tem serviços que chegam a R$ 80, R$ 100”, complementa.
Cleuza Alves de Oliveira, de 67 anos, está entre a clientela de Paulinho. Para a aposentada, o conserto dos calçados é escolhido como uma forma de economizar ao longo do mês. “Mas, antes de mandar arrumar, tem que ver se compensa consertar ou comprar outro. Mas, se dá para recuperar, é lógico que vou escolher essa opção.”
A escolha de dar uma segunda chance ao que estragou também se estende a outros itens, como roupa e eletrodomésticos. “Eu compro novo só quando não dá mais mesmo. Se ainda dá para recuperar, eu vou usar até não dar mais, porque para comprar novo tem facilidade, mas está tudo muito caro”, afirma Cleuza.
A costureira Izis Barbosa, de 70 anos, também está entre os autônomos que lucram com os consertos. “A procura por reparos sempre foi grande e, nos últimos anos, tem se mantido estável, mas sempre aumenta em algumas épocas, como no inverno”, comentou.
Em seu ateliê, o carro-chefe é a reforma de roupas que ficaram muito grandes ou de peças que são levadas para serem renovadas. “Os meus clientes são de classe média e alta, então eles trazem roupas que não dá para jogar fora ou passar para a frente assim”, explica.
Izis ainda informa que a reforma de uma camisa inteira é realizada a partir de R$ 130 e, para fazer a barra, é cobrado R$ 50. Serviços mais complexos, como ajustes em vestido de noiva, chegam a R$ 300.
“Meus clientes são todos fidelizados, mas também têm muitos que são novos. Eles chegaram depois que publicamos um anúncio no Google. Atendemos pessoas de todas as idades e sexos; há dias em que atendemos mais homens do que mulheres.”
Entre os clientes que adotaram o conserto como estratégia de economia está o servidor público Sidinei Tiago Paniago, 62 anos. Ele chega a ir a um bairro vizinho para dar nova vida a móveis e roupas. “O conserto faz parte da economia. Entre comprar um móvel novo e consertar, compensa consertar. Reformamos o sofá e os pufes; ficou tudo como novo.”
Nem todo mundo, porém, vê vantagem. Juliana Inacia, 43 anos, vendedora, acredita que o preço elevado dos reparos afasta quem tem menos renda. “Hoje, mandar consertar é caro. Às vezes, o novo é mais barato.”
Entre os mais jovens, o hábito de conservar também divide opiniões. Para Carmem de Oliveira dos Santos, 20 anos, caixa, a decisão varia conforme o estrago. “Se dá para consertar, eu conserto. Mas, se não tiver jeito, compro outro. Cresci vendo minha mãe e minha avó preferirem o conserto, então peguei delas isso.”
Já Adriano Riquelme, 31 anos, estagiário, transformou o conserto em hobby. “Eu prefiro consertar tudo o que é eletrônico. No começo era economia. Depois peguei gosto. Via vídeos no YouTube e fazia.”
No extremo oposto está Wilson Isac Cavalcante, 28 anos, vendedor que prefere trocar a arrumar. “Infelizmente, hoje os produtos são mais fracos e te obrigam a trocar. O reparo do celular da minha esposa ficou em R$ 3,5 mil. Mais fácil comprar outro.”
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