Consultoria projeta salto de 11 milhões de toneladas de celulose em MS
Indústria investirá bilhões em infraestrutura para garantir escoamento eficiente da produção
A Consultoria Falconi, uma das mais requisitadas do setor no País, tem uma projeção animadora para o mercado da celulose em Mato Grosso do Sul: a previsão para os próximos cinco anos é de um acréscimo de quase 11 milhões de toneladas por ano. No entanto, Caio Devanzo, diretor de Papel e Celulose da consultoria, ressalva que o desenvolvimento exige planejamento conjunto entre governo e iniciativa privada para garantir infraestrutura e mão de obra qualificada, condições essenciais para a sustentação do Vale da Celulose a médio e longo prazos.
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Caio Devanzo afirma que, diante da morosidade da máquina pública, caberá à indústria investir cifras bilionárias em infraestrutura para assegurar logística mais eficiente no escoamento da produção ao longo dos próximos anos.
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Um levantamento com base em dados oficiais e abertos mostra que os investimentos públicos e privados projetados para o Vale da Celulose somam quase R$ 100 bilhões até 2030, incluindo ampliação da capacidade produtiva e obras logísticas. A expectativa é que esse movimento transforme a matriz econômica regional e posicione Mato Grosso do Sul como hub logístico e exportador, com rodovias modernizadas, ferrovias conectando fábricas a portos e uma cadeia florestal competitiva.
“A própria empresa fará investimentos para melhorar a logística entre a floresta e a indústria, por exemplo, além da necessidade de investimentos públicos para aumentar o poder de escoamento e para que as empresas possam operar em boas condições.”
Operações dessa magnitude, ressalta Davanzo, exigem investimentos em rodovias de acesso e em infraestrutura capaz de atender todo o ciclo produtivo, da floresta ao porto, garantindo sustentabilidade ao setor exportador.
“Quando existe um plano de expansão de uma fábrica de celulose ou um projeto sendo implementado, não é somente a questão do ativo fabril. Também é necessário pensar em todo o entorno da indústria”, disse. “Ou seja, como será feito o escoamento da produção, como transportar a matéria-prima da floresta até a fábrica? Como será empregada a mão de obra, seja na floresta ou na indústria propriamente?”
Apesar dos desafios, como formação de trabalhadores, competitividade internacional e sustentabilidade ambiental, a articulação entre empresas e governo indica um planejamento integrado para que, a partir de 2028, a expansão da celulose seja acompanhada pela infraestrutura necessária, assegurando escoamento eficiente da produção crescente.
Consolidação do Vale da Celulose
Novos investimentos puxados por Suzano e Eldorado, já instaladas na região, e pela chegada das gigantes Arauco e Bracell consolidam o leste de Mato Grosso do Sul como um dos maiores polos mundiais do setor, avalia Davanzo.
Em Três Lagoas, a Eldorado prevê investir R$ 25 bilhões na ampliação da segunda unidade, com capacidade para 2 milhões de toneladas anuais, incluindo aportes em ferrovias e rodovias. A Suzano, que já opera duas linhas na cidade, inaugurou neste ano em Ribas do Rio Pardo uma unidade de R$ 22,2 bilhões, com capacidade para 2,55 milhões de toneladas.
Em Inocência, o Projeto Sucuriú, da Arauco, prevê R$ 25 bilhões e início das operações em 2027, com até 3,5 milhões de toneladas por ano. Já em Bataguassu, a Bracell investirá R$ 16 bilhões em uma fábrica de celulose solúvel com capacidade de 2,9 milhões de toneladas anuais.
O setor de papel e celulose nacional prevê investimentos de R$ 105 bilhões até 2028 em todo o País, grande parte em Mato Grosso do Sul. Entre eles, a Rota da Celulose deve receber R$ 10 bilhões da iniciativa privada em obras de pavimentação, duplicação e manutenção de estradas, reduzindo a necessidade de gasto público. Somente na MS-377, entre Três Lagoas e Inocência, são R$ 24 milhões em obras ligando florestas às indústrias.
Outra frente estratégica é o Porto de Santos, principal via de exportação da celulose brasileira. O governo federal prevê leilão do terminal Tecon Santos 10, o maior da história do país — em meados de dezembro, com investimentos de R$ 5,6 bilhões ao longo de 25 anos e aumento de até 50% na capacidade. A licitação ainda depende de aval do TCU (Tribunal de Contas da União).
Além disso, o setor defende mais investimentos públicos em ferrovias para “garantir operações sustentáveis em longo prazo”.
Morosidade da máquina pública
Davanzo lembra que a ampliação do Porto de Santos é aguardada há anos pelo mercado e critica a lentidão da máquina pública no fomento à infraestrutura, fator que, na prática, trava o dinamismo econômico regional.
Em Mato Grosso do Sul, o governo assinou há quase um ano contrato com o BNDES para crédito de R$ 2,3 bilhões em infraestrutura de transportes, incluindo R$ 300 milhões de contrapartida estadual. Os recursos preveem a transformação de 800 km de rodovias, mas foram liberados apenas parcialmente. Segundo o banco, o desembolso é “gradual, de acordo com o avanço físico-financeiro dos projetos previamente aprovados”.
O Estado também negocia com o BIRD (Banco Mundial) um crédito de US$ 250 milhões (cerca de R$ 1,36 bilhão) no programa Rodar MS, que prevê restauração de rodovias como a MS-377 e MS-240, com modelos de concessão de longo prazo. O processo ainda aguarda análise da Secretaria do Tesouro Nacional.
A Rota Bioceânica, ligando Porto Murtinho (MS) a Carmelo Peralta (Paraguai), é outro ponto estratégico. “O principal benefício da Rota é o potencial de diversificar várias rotas de exportação da celulose e outros produtos sul-mato-grossenses. Isso dará mais possibilidades para a exportação”, afirma Davanzo.
Investimentos federais e privados
Segundo o Ministério dos Transportes, o governo federal celebrou convênio para delegar trechos das BR-262/MS e BR-267/MS, totalizando 576 km, viabilizando a concessão da Rota da Celulose, que também inclui rodovias estaduais estratégicas (MS-040, MS-338 e MS-395).
O projeto abrange vias estratégicas para o escoamento da produção de celulose e do agronegócio na região, com previsão de cerca de R$ 10 bilhões em investimentos. Estão previstas obras como a duplicação de 146 km, implantação de 245 km de faixas adicionais e 38 km de contornos viários. O leilão e a gestão do contrato estão a cargo do governo estadual.
Em abril de 2025, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) autorizou a Arauco a construir e operar um ramal ferroviário de 46 km em Inocência (MS). O contrato tem validade de 99 anos e o projeto está atualmente em fase de licenciamento ambiental.
Para o Ministério, as autorizações ferroviárias são de natureza privada, cabendo às empresas autorizadas a implementação dos projetos.
Perspectivas
Para o especialista da Falconi, os investimentos do setor têm caráter de longo prazo, com retorno gradual às comunidades. “Esse grau de investimento tem retorno de médio e longo prazo. Uma planta dessa é para durar de 50 a 100 anos. Isso dá confiança para que todo o ecossistema seja montado visando um desenvolvimento sustentado da cidade.”
Segundo ele, a tendência é de que a cadeia do setor, responsável hoje por mais de 10% do PIB estadual, dê um salto a partir de 2028 com a entrada em operação das novas indústrias. “A participação do setor da celulose tende a aumentar de forma significativa no PIB do Estado”, afirma, sem estimar percentuais.
Empregos
Davanzo calcula ainda que a indústria deve gerar 100 mil empregos em Mato Grosso do Sul até 2028. No curto prazo, só o Projeto Sucuriú da Arauco abrirá 10 mil vagas imediatas. “Esse é um grande fator que vai contribuir com o desenvolvimento do Estado”, afirma.
A alta demanda deve acirrar a disputa por trabalhadores qualificados, tanto na produção industrial quanto no plantio de eucalipto — área considerada mão de obra intensiva. Para suprir a carência, programas de capacitação vêm sendo articulados por Senai, Senac, Sebrae, Famasul e Senar em parceria com empresas e governo. O governo estadual também acelerou iniciativas que vinham em marcha e lançou outras, como a Rede de Excelência em Qualificação Profissional. Via Senai-MS, capacitou 4,5 mil alunos na área florestal entre 2021 e 2024, um investimento de R$ 24,5 milhões, por exemplo.