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Economia

Os limites do “desculpe, seu score está baixo”

Rafael Zanatta | 16/12/2017 10:45

Imagine a seguinte situação. Você está navegando em uma grande loja de comércio eletrônico e escolhe um novo celular para compra. Na hora do pagamento, te oferecem um novo cartão de crédito, sem anuidade. Você aceita, mas se recusa a contratar o seguro contra roubo e furto.

Imediatamente, o banco que opera o cartão de crédito afirma que “seu score está baixo” e que o cartão não pode ser emitido. Você questiona o que é esse “score” e como se chegou a ele. O banco informa que o score é uma avaliação de risco na concessão de crédito e que não pode explicar quais informações são utilizadas.

Parece justo?

Em processo em tramitação na 16ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, a juíza Paula Rocha Formoso analisou um caso com uma situação quase idêntica e chegou a duas conclusões importantes sobre a abusividade da instituição financeira que opera o sistema de pontuação de crédito.

Primeiro, que é abusivo negar a concessão de crédito com base em “credit score” (sistema de pontuação de crédito) sem dar os instrumentos para que o consumidor entenda quais informações pessoais foram utilizadas.

Segundo, que a exigência de que o próprio consumidor “demonstre que não se encontra no grupo de risco” é abusiva e enseja a condenação ao pagamento de indenização por danos morais in re ipsa (decorrente do próprio fato).

Nesse caso recém julgado, não somente o consumidor saiu vitorioso – a sentença exige a emissão do cartão e o pagamento de R$ 3.000 por danos morais, sendo solidários o banco e a loja de comércio eletrônico –, mas todo o sistema de proteção aos consumidores no Brasil.

A decisão é um importante precedente judicial. A mensagem ao setor privado é clara. Quem utiliza sistemas de pontuação de crédito não pode negar acesso às informações que compõem a nota. Também não podem adotar práticas abusivas, como “exigir prova impossível” e contrariar os princípios básicos do Código de Defesa do Consumidor.

A decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo também é importante pois reforça as teses firmadas pelo Superior Tribunal de Justiça em 2014 sobre a garantia de direitos básicos dos consumidores em sistemas de pontuação de crédito e a “máxima transparência na avaliação do risco de crédito”.

No mesmo dia em que a decisão do TJSP foi prolatada, o Idec publicou o manual Por trás da pontuação de crédito: conheça seus direitos. Trata-se de uma guia básico e aberto sobre como funciona o “credit score” e quais os direitos básicos dos consumidores.

Felizmente, a Justiça de São Paulo reconheceu os limites de uma prática comercial que tem crescido no Brasil: informar ao consumidor que “o score está baixo” e que ele não terá acesso a crédito ou benesses econômicas. Não basta informar qual é a nota, mas explicar como se chegou a ela. O contrário disso é prática abusiva que deve ser punida pelo Judiciário.

*Rafael Zanatta, pesquisador em direitos digitais

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