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Arquitetura

Em bairro que nasceu da favela, graffiti traz cor e vida a casa da periferia

Cada chuva leva um pouco mais da parede enquanto o telhado é derrubado com a força do vento, mas os moradores não desistem de enfeitar o lugar.

Kimberly Teodoro | 28/03/2019 08:19
Em rua de terra e fachadas padronizadas, Graffiti chama atenção para a personalidade dos moradores (Foto: Paulo Francis)
Em rua de terra e fachadas padronizadas, Graffiti chama atenção para a personalidade dos moradores (Foto: Paulo Francis)

Na rua de terra e entre os entulhos deixados pela última chuva, o cenário um tanto árido parece um canto esquecido de Campo Grande, conhecida pelo verde das árvores se mistura ao cinza do asfalto e, uma vez por ano ganha um toque de magia com a florada dos ipês. Ali, ao lado do Vespasiano Martins, o Irmãos da Cidade de Deus, bairro “provisório”, que nasceu da favela com mesmo nome, moradores encontraram um jeito de dar vida e cor ao caos com pinturas únicas que se sobressaem na quadra em que o tom dominante é o marrom claro do terreno arenoso.

Os primeiros tons de esperança surgem no muro da obra abandonada há anos, endereço apontado pelo google maps como o Ceinf do bairro, que deveria ter ficado pronto em 2018, mas até hoje é apenas mais um elefante branco em uma cidade com tantas obras públicas paradas. Na pintura,a inspiração veio dos rios Aquidauana e Miranda, segundo um dos vizinhos do artista Jeter dos Santos Ferreira, que já teve o trabalho mostrado em 2016 aqui no Lado B, com o “pôr-do-sol colorindo a fachada até em dias de chuva”. Dessa vez não foi encontrado em casa em nenhuma das duas visitas feitas pela equipe de reportagem.

Paisagem inspirada nos rios Aquidauana e Miranda, pintada no muro do Ceinf abandonado (Foto: Paulo Francis)
Paisagem inspirada nos rios Aquidauana e Miranda, pintada no muro do Ceinf abandonado (Foto: Paulo Francis)

Bem ao lado e como sinal de boa sorte, a casa própria de alvenaria ganhou duas carpas, uma vermelha e uma amarela, na fachada. O pedido foi feito pelo morador, Clidiomar Rodrigues e pela esposa, Mariana Gonçalvez, assim que a casa terminou de ser erguida, fazendo com que a pintura branca e opaca ganhasse as próprias cores, se destacando de qualquer outra na mesma quadra. “O Jeter é talentoso, além dos desenhos ele também trabalha com pallet. Qualquer foto que você mandar para ele, ele consegue reproduzir”, conta.

Mariana estava o trabalho, mas Rodrigues abriu os portões feitos de pallet e até tirou o carro da frente da casa para que a foto pudesse ser feita, tudo para valorizar o trabalho do vizinho, que também tem outros trabalhos pelo bairro. Por trás da pintura, um olhar mais detalhado revela as rachaduras na parede e os danos na porta de metal, que por causa das chuvas fortes foi apodrecendo pelas beiradas até ser arrancada das dobradiças. Além da porta, ele explica que a água chega a atingir 1 metro de altura a cada inundação e que por isso já perdeu até sofá e televisão. Por dentro, a casa é simples, mas nem por isso descuidada. Assim como as carpas pintadas na parede, casa detalhe mostra um pouquinho da esperança de prosperidade, de quem conquistou aos poucos tudo o que tem e não desiste de enfeitar a vida, mesmo que as paredes estejam condenadas e o teto seja facilmente levado pelo vento forte.

“Aqui demorou um ano para ficar pronto. Quando viemos da Cidade de Deus, ainda ficamos morando em barracos de lona até acabarem de construir, mas nenhuma casa aqui foi bem feita, tanto que não era para ser provisório e mesmo assim vamos ter que sair, porque aqui foi tudo condenado”, mesmo assim ele afirma não ter nada contra a prefeitura, que tem prestado assistência depois de determinação judicial. Esperançoso, Rodrigues diz que a situação só deve durar mais um ano e que em breve as famílias terão novo lugar para morar.

Rodrigues é morador da "casa das carpas" há 3 anos (Foto: Paulo Francis)
Rodrigues é morador da "casa das carpas" há 3 anos (Foto: Paulo Francis)

Há poucos passos de distância, destoando de todas as outras pinturas, personagens da série de filmes da Marvel, Os Vingadores, são os “guardiões” da casa em que Allefer Gomes e a esposa Miriam moram, também a cerca de 3 anos. Jovens, nenhum dos dois chegou aos 30 anos, mas fazem questão de que o cantinho em que vivem tenha a cara deles.

Quando a equipe de reportagem chegou, a porta estava aberta, enquanto Allefer e Miriam estavam na casa vizinha, tomando tereré e conversando com os amigos com a despreocupação de quem conhece todos os moradores do bairro, passando uma sensação de segurança há muito tempo perdida por quem vive no centro. Alegre, mas simples, eles se intimidaram com a câmera e acharam melhor não aparecer, mas deixaram o fotógrafo registrar a obra inacabada na fachada.

O grande fã dos Vingadores é Allefer, que pagou R$ 150 na pintura. “Quando chegamos aqui as casas eram todas brancas, muito sem graça, então pedi para o Jeter fazer esse desenho. Como acabou a tinta dele, ele ainda não terminou, mas quando der ele vai terminar o Homem de Ferro e o Thor também vai ganhar mais detalhes”, conta.

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Fã dos vingadores, Allefer Gomes não heistou em contratar o vizinho para personalizar a casa (Foto: Paulo Francis)
Fã dos vingadores, Allefer Gomes não heistou em contratar o vizinho para personalizar a casa (Foto: Paulo Francis)
Segundo o morador, a pintura ainda será finalizada e ganhará mais detalhes (Foto: Paulo Francis)
Segundo o morador, a pintura ainda será finalizada e ganhará mais detalhes (Foto: Paulo Francis)
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