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Comportamento

"Tentei mudar, mas a sensação de estar com um homem era incrível"

Elverson Cardozo | 03/03/2015 06:12
Desde que me entendo por gente, sou muito decidido e corajoso. Sempre dei a cara tapa – pode bater à vontade. (Foto: Arquivo Pessoal)
Desde que me entendo por gente, sou muito decidido e corajoso. Sempre dei a cara tapa – pode bater à vontade. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Se a medida do amor é amar sem medida, porque o seu amor pode e o meu não?” Essa é apenas uma das várias campanhas que circulam na internet e que traz, como pano de fundo, uma discussão sobre diversidade sexual. O Lado B quer ampliar esse debate e, por isso, lança hoje (3) a série “Saindo do Armário” que, como o nome sugere, vai reunir histórias de pessoas que tiveram a coragem de assumir publicamente a própria sexualidade e de como ocorreu esse processo. O primeiro relato, e em primeira pessoa, é de um publicitário de 21 anos.

"Tentei ser hétero, tentei mesmo, mas descobri que não sou capaz de mudar certas coisas"

Nascido e criado em família italiana, tradicional e religiosa, não sei o que seria mais difícil: sair do armário ou continuar nele. Cremos em seres místicos, deuses e fantasmas, mas ainda assim – para alguns – é difícil de acreditar que nós, gays, bissexuais, transexuais, existimos. Ou mais, que viemos ao mundo dessa forma. É comum ouvir que “fulano tá virando gay por causa dos amigos” de pais cético-conservadores. Comigo não foi diferente, mas o pesadelo era maior na minha cabeça do que fora dela.

Desde que me entendo por gente, sou muito decidido e corajoso. Sempre dei a cara a tapa – pode bater à vontade. Quando alguém dizia não, eu era o primeiro pirralho insolente a questionar. O “porque não” nunca me convenceu.

Meus pais sempre souberam, na verdade. Uma vez me pegaram com um namorado ao telefone, eu com 13 anos e ele 16. Meu pai chorou por meses e fingiu que nada tinha acontecido.

Após o incidente, tive um período muito difícil. Chorei muito, terminei, tentei ser hétero – tentei mesmo, com muita força – mas por ele, não por mim, porque eu sabia o que eu queria. Entretanto, descobri que não sou capaz de mudar certas coisas. Seria como tentar mudar a cor da minha pele com um bronzeado, após um tempo a pele retornaria a sua cor original.

Já aos 20, com outro namorado que frequentava nossa casa, ele (pai) tomou coragem para enfrentar o leão (eu), pois saberia que eu dificilmente daria trela. Dessa vez, já maduro o suficiente, com um dinheiro no bolso – just in case – e sem muita paciência, bati no peito e contrário as suas promessas de uma vida melhor, de ser acolhido por Deus e até mesmo de ganhar casa e carro, eu disse que nunca mudaria.

Já tive milhares de incertezas, mas amar alguém do mesmo sexo já não era uma delas. Minha mãe sempre só observava – e pedia para não comentar sobre isso com ninguém. Não recebo os mesmos tratamentos que meus irmãos quando o assunto é nora e genro – mas também dispenso. Essa coisa de apresentar até pra avó, levar nos jantares de família, nunca fizeram meu gosto.

Como disse, tentei mudar dos 13 aos 15 anos. Mas a sensação de estar com um homem era incrível, provavelmente a mesma que os héteros têm, claro. Ao longo dos anos apenas me acostumei com a ideia até chegar ao que sou hoje... Exijo muito respeito, não abaixo a cabeça para ninguém, dou a cara a tapa por tudo em que acredito.

E no fim das contas, não é questão de ter orgulho de ser gay ou algo assim – é orgulho de não deixar que nada nem ninguém me pare. Lembro-me sempre: o preconceito que você tem é problema seu, só será meu se eu deixar que me afete. Mas eu não deixo.

Envie seu relato - Se identificou com a primeira matéria da série? Tem algum história para contar? Compartilhe com a gente! Mande um e-mail para ladob@news.com.br

* Matéria editada em 6/03/2015, às 18h40. Apesar de ter se identificado, escrito o texto em primeira pessoa e autorizado o uso da imagem, o personagem que abriu a série "Saindo do Armário" teve problemas com a família após a publicação da reportagem e, por isso, procurou a redação. O Lado B decidiu, então, alterar o material, apesar das reproduções em outros sites.

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