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Comportamento

Depois de amputação, Cristiane sobe ao altar com as próprias pernas

Thais Pimenta | 07/12/2017 08:17
Relacionamento começou com amizade no ano de 2009, (Acervo pessoal\Eternize Momentos)
Relacionamento começou com amizade no ano de 2009, (Acervo pessoal\Eternize Momentos)

Quem vê Cris sorrindo assim e olhando com essa carinha apaixonada para seu noivo, Loivo Knapp, mal sabe a trajetória de vida dessa valente mulher.

Aquidauanense, Cristiane da Silva Ferraz veio pra Campo Grande muito cedo, junto de sua mãe, Carmen da Silva Dias e seu pai, Sady Ferraz. Desde a mudança, instalou-se na Cohab e de lá nunca mais saiu. Na mesma casa, Cris viu seus pais se separarem durante a infância, concluiu o curso de Publicidade e Propaganda, lutou contra a diabetes, amputou primeiro o pé e depois a perna esquerda, e sofreu ao se deparar com a solidão quando sua mãe veio a falecer vítima da mesma doença.

Amor de filha para mãe. (Acervo Pessoal)
Amor de filha para mãe. (Acervo Pessoal)

Cacá, como era conhecida Carmen, nasceu em uma aldeia indígena de Aquidauana e quando veio pra Capital começou a trabalhar como doméstica e babá para sustentar a filha. A diabetes sempre foi sua maior vilã, tanto é que por conta dela sofreu uma parada cardíaca no dia 18 de fevereiro de 2014 e partiu daqui.

As duas eram como unha e carne. Inseparáveis, tinham-se como porto seguro. "Mesmo com as nossas diferenças, na convivência, não passávamos um só dia brigadas, fazíamos as pazes bem rapidinho", se lembra a filha.

Depois do divórcio, a casa na periferia era dividida apenas entre elas. Quando Cacá faleceu, Cris ficou sozinha no espaço e, naturalmente, desenvolveu depressão. "Naquela época não sentia a menor vontade de nada, comer, me cuidar. Eu pedia pra morrer, já não via sentido na vida".

Cristiane em um ensaio fotográfico.(Acervo pessoal)
Cristiane em um ensaio fotográfico.(Acervo pessoal)

A má circulação causada pelo diabetes lhe trouxe uma notícua que a deixou sem chão. Cris teve de amputar o pé esquerdo. Logo em seguida, em 2013, uma osteomelite a obrigou a amputar parte da perna. Nessa época, Cacá ainda estava junto e acompanhou a cria em uma jornada de três meses no hospital por conta da inflamação nos ossos.

A publicitária conta que não foi fácil. "Mentir não adianta, foi um processo muito complicado. Tudo precisou ser adaptado para me receber". Entretanto, a dor da amputação não foi nada quando comparada à dor do luto.

Lionel Messi foi o serzinho responsável por tirar Cristiane da depressão. "O adotei no CCZ dia 5 de maio de 2015. Com ele passei a ter um propósito de vida, tinha que acordar para cuidar dele. Aos poucos então enxerguei um novo começo".

Sorrisos contagiantes: Messi e Cris. (Acervo Pessoal)
Sorrisos contagiantes: Messi e Cris. (Acervo Pessoal)

A tristeza cedeu espaço para a sede de viver. Mesmo assim, o corpo doente apresentou insuficiência renal. "Por alguns meses eu tinha deixado de me alimentar, de me cuidar mesmo. Fui parar na UTI por cinco dias inclusive, era consequência. A hemodiálise passou a ser rotina, junto a fisioterapia", diz.

Frágil por fora, ela resgatou em seu interior aquela força da antiga Cristiane. "Passei a não permitir me vitimizar. Fui conhecer Corumbá, pescar no rio Paraguai, visitar a família no interior. Acho que instituímos limites a nós mesmos".

Ela pescando no rio Paraguai. (Acervo Pessoal)
Ela pescando no rio Paraguai. (Acervo Pessoal)

Uma pessoa em especial esteve sempre por perto. O gaúcho Loivo a conheceu em 2009 em uma rede de supermercados em que trabalhavam. Formaram uma amizade intensa que se mantem até os dias atuais. 

Depois de ter se mudado pro Rio Grande do Sul e voltado para a Capital, os amigos ficaram algumas vezes. "Estivemos enrolados por tempos. Minha mãe não gostava dele porque dizia que ele me enrolava pois nunca me pedia em namoro", brinca ela.

Nos dias ruins, o amigo colorido fazia questão de se fazer presente mesmo que só pelas redes sociais. O cenário mudou realmente há um ano. Loivo a pediu para namorar com ela, contrariando as previsões de Cacá.

O relacionamento deu ainda mais incentivo à Cristiane. Na fisioterapia, se motivou a voltar a caminhar. "Dia 5 de setembro consegui andar sem apoio, em outubro chegou minha prótese".

"Quando eu consegui caminhar sozinha senti como se tivesse dedos nos pés de novo. A gente precisa reaprender tudo. Costumo dizer pra minha fisio que é como se fosse criança de novo", diz, emocionada.

Família reunida. (Foto: Acervo Pessoal\Eternize Fotos)
Família reunida. (Foto: Acervo Pessoal\Eternize Fotos)

Seu parceiro decidiu oficializar a união a pedindo em noivado. Os dois se casam no dia 15 de dezembro, próxima sexta-feira, em uma cerimônia da igreja Messiânica da Capital, que contou com o apoio de um emissora de TV. Ela sobe ao altar com as próprias pernas, em um vestido exclusivo, calçando tênis All Star. "Serei uma noiva moderna", brinca.

Para ela, o segredo da harmonia no relacionamento está fundamentado na amizade. "Começamos a morar juntos já em agosto, depois do pedido. Nos respeitamos e cuidamos um do outro. Loivo sabe das minhas particularidades e me ama assim mesmo", diz.

Quando perguntada se acha que sua mãe está feliz com o casamento, ela não hesita: "com certeza, era tudo que ela queria. Minha mãezinha tinha me pedido pra eu me casar, constituir uma família, voltar a estudar  e viajar", conta.

A família do casal por enquanto só tem filhos de quatro patas. Além de Messi, Tupã, Zeca e Zulu completam o time. Contudo eles não descartam a possibilidade de ter um filho no futuro. "Queremos adotar uma criança".

Depois de amputação, Cristiane sobe ao altar com as próprias pernas
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