Herdeiro de receita famosa, Tadashi também é parte dos 100 anos da Feira Central
Com preparo à moda de Okinawa, barraca dos Katsuren é uma das mais antigas da cidade e tem muita história

Tadashi Gabriel Nishihira Katsuren cresceu assim: correndo entre bacias de legumes, tropeçando em caixas de isopor, com o cheiro das carnes do sobá colando no nariz e o som de pedidos apressados ecoando pela barraca da família na Feira Central de Campo Grande.
Nesta semana, a Feira chegou aos 100 anos. Centenária, sim, embora tenha mudado de endereço e de cara ao longo do tempo, manteve o coração intacto. E o coração, muitas vezes, tem cheiro de sobá.
Tadashi é hoje o rosto visível da sobaria da família. Terceira geração de uma história que começou com os avós, Hiroshi e Yasuko Katsuren, ele se reveza entre as panelas e as lembranças. A barraca tem nome da mãe, Níria Nishihira Katsuren, homenagem a que ajudou a transformar um dos pratos de Okinawa em símbolo de uma capital no Centro-Oeste.
Foi ali, na antiga Feira Central da Rua Abrão Júlio Rahe, que Tadashi viveu a infância. O lugar ainda carrega uma cicatriz discreta da presença da feira: uma casa de azulejos, que insiste em continuar no mesmo lugar, como quem guarda segredo antigo. Mas isso a gente lembra logo mais, vamos à história dessa família.
“Cresci na feira antiga. Era uma criança correndo de um lado para o outro na barraca, brincava muito lá. Quando a feira mudou para a Esplanada, eu já tinha uns 10, 11 anos. Com uns 14, 15, já atendia às mesas. Pouco a pouco, comecei a assumir algumas coisas da barraca, porque meus pais foram envelhecendo, enfrentando problemas de saúde.”

Tadashi conta que a barraca da Níria é uma das mais antigas da feira, com 43 anos de história, ao lado da Tókio e da Ichiban. Depois delas, há outras com 30, 20 anos de atividade.
Em 1965, os avós começaram a vender sobá na antiga feira e permaneceram por cerca de dois anos. Depois, se afastaram para cuidar de outro negócio. O retorno à feira aconteceu em 1982, com a mesma receita do avô. Desde então, a barraca nunca mais parou.
Ele lembra que só durante a pandemia foi necessário interromper o funcionamento, e que, fora isso, nunca tirou férias. Para alguns, essa frase pode soar triste, mas para ele é motivo de orgulho.
“Cresci, estudei, fiz faculdade. Desde adolescente trabalho na barraca, ajudo em casa, mexo com os temperos das carnes. Aprendi muito novo. Até hoje sou eu quem tempera. Aprendi o caldo, o yakisoba. Faço praticamente toda a preparação e o pessoal finaliza.”
A infância vividana feira foi divertida e, segundo ele, a vida ainda é. Apesar do ritmo corrido, trabalhar com o sobá é continuar a história da família. Mesmo tendo passado grande parte da vida no espaço da feira, Tadashi garante que não perdeu nada.
“O pessoal brinca que eu nasci na segunda e, na terça ou quarta, minha mãe já estava na feira. Foram escolhas. Trabalhar na feira significa abrir mão de finais de semana, por exemplo. Mas tive uma infância e uma vida adulta felizes. A gente se acostuma. Minha vida foi inteira na feira.”

A mãe de Tadashi faleceu em 2020, vítima de câncer, e o pai está adoentado. Agora, a responsabilidade de manter a tradição é toda dele. “Eu já assumia grande parte das tarefas da barraca. Depois que ela faleceu, tudo ficou comigo. Desde então, é um corre danado para dar conta e manter os clientes com a gente. Nossa clientela é muito grande.”
Primórdios da Feira
Os azulejos na fachada da Rua Abrão Júlio Rahe ainda guardam os últimos vestígios da antiga Feirona. Até 2022, a autônoma Márcia Sakugawa morava no local. À reportagem, ela contou que cresceu entre as estruturas da antiga Feira Central e chegou a trabalhar em uma das barracas de sobá.
Ela era a última moradora remanescente das famílias que integravam a feira naquela rua e ainda vivia na casa que, por anos, funcionou como um dos pontos comerciais.

Segundo Márcia, a família alugava o imóvel e trabalhava em outras barracas. Várias casas da rua seguiam o mesmo padrão, com fachadas revestidas de azulejos para facilitar a limpeza.
Como os espaços eram utilizados pelas barracas, os muros serviam tanto como paredes de “cozinhas” quanto como áreas para alimentação.
Depois disso a Feirona foi transferida para a Rua 14 de julho, e a maior parte das famílias começaram a se desfazer das antigas casas.
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