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Comportamento

Maria “morreu” e teve que renascer quando o filho virou assassino aos 14 anos

Mãe fala como foi reconstruir a vida depois que o filho adolescente cometeu um homicídio dentro da própria casa.

Thailla Torres | 02/06/2019 07:31
Ela veio de longe para rever o filho que matou há um ano e hoje completou um curso profissionalizante para buscar um novo caminho. (Foto: Henrique Kawaminami)
Ela veio de longe para rever o filho que matou há um ano e hoje completou um curso profissionalizante para buscar um novo caminho. (Foto: Henrique Kawaminami)

Faltavam alguns minutos para a refeição da família. A mãe já estava na cozinha quando decidiu ir ao supermercado comprar itens que faltavam, em fevereiro de 2018, numa cidade do interior, a 364 quilômetros de Campo Grande. Naquele dia, não houve almoço, só tristeza e dor. Foram poucos minutos até Maria* voltar para casa e ver o filho todo ensanguentado. Pensou que ele tivesse sido brutalmente agredido. Foi quando ela percebeu que o filho, de 14 anos, matou o melhor amigo.

Maria entrou na cozinha e encontrou o garoto com o rosto todo cortado. O facão usado pelo filho menor de idade estava de lado, coberto de sangue. O susto não a fez pensar em muita coisa naquele momento. Gritou por socorro na esperança de ver aquele jovem, que há meses frequentava sua casa, sobreviver.

De fato, o menino chegou a ser socorrido, mas não resistiu ao dar entrada no hospital da cidade com pouco mais de 13 mil habitantes. Quando recebeu a triste notícia da morte, Maria sentiu que morreu no mesmo instante. “Parece que eu morri naquele momento”, descreve. “É a dor mais forte que uma mãe pode sentir na vida”, descreve sobre a dor da outra mãe que acabava de perder um filho.

O menino que matou a golpes de facão tinha apenas 14 anos. A idade dava voltas na cabeça de Maria que durante muito tempo tentou encontrar respostas para o assassinato banal, sem motivos, embora nenhuma violência tenha justificativa. “Eu fiquei me culpando, pensando onde é que eu tinha errado. Eu nunca ensinei meu filho a matar”, diz.

No celular, Maria* compartilha mensagens de fé para renovar a esperança à espera do filho. (Foto: Henrique Kawaminami)
No celular, Maria* compartilha mensagens de fé para renovar a esperança à espera do filho. (Foto: Henrique Kawaminami)

O adolescente foi apreendido e hoje cumpre medida socioeducativa em Unei (Unidade Educacional de Internação) de Campo Grande. Sobre o que motivou o crime, o adolescente disse a mãe que a desavença começou por causa de um apelido “horroroso” que ganhou do amigo. “É uma coisa muito feia, não tenho como te falar. Mas ele disse que há muito tempo tinha pedido para esse amigo não falar mais dele, ele insistiu, e meu filho acabou fazendo isso. Sei que nada justifica, mas ele diz que foi uma desavença”.

Os dias seguintes à tragédia foram os mais difíceis que a mãe e pai do adolescente viveram. “Eu choro quase todos os dias”. No celular, ela mostra as mensagens de fé e esperança que costuma ler todas as manhãs e encaminhar para cerca de 100 amigos diariamente. “Eu me apeguei muito em Deus para poder renascer”.

Maria diz que ainda sente dor pela mãe que perdeu o filho. “Quando tudo aconteceu eu conversei com ela, ela me disse que eu não tinha culpa, mas todos os dias eu penso nela. Nenhuma mãe merece perder um filho”.

Com ajuda da fé, ela diz que foi reconstruindo a vida, sem perder a esperança de ver o filho em liberdade. “Eu rezo todos os dias por ele. Para que saia da Unei e seja um menino bom, ele só tem 15 anos ainda”.

Encontramos Maria numa cerimônia de formatura de 11 internos da Unei de Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)
Encontramos Maria numa cerimônia de formatura de 11 internos da Unei de Campo Grande. (Foto: Henrique Kawaminami)

Recomeço – Encontramos Maria numa cerimônia de formatura de 11 internos da Unei de Campo Grande, que completaram um curso profissionalizante. A entrega de diploma pareceu mudar não só o sorriso dos meninos, como o olhar de Maria que segurava uma cobertinha colorida nas mãos após horas de viagem até a Capital só para ver o filho dar o primeiro passo longe do crime.

O pai, visivelmente consternado, não quis falar com a reportagem, mas ficou de olhos cheios quando seu menino subiu as escadas para cumprimentar a autoridades e erguer o canudo para o alto.

Maria não só chorou, como filmou, sorriu e se emocionou com o adolescente. “Eu só quero que ele aproveite essa segunda chance e que a vida dê a ele também uma segunda chance. Acredito que meu filho não nasceu para matar e ninguém tem direito de tirar a vida de alguém”.

Quando fala dos absurdos que já ouviu por ter um filho que cometeu um assassinato, as palavras parecem doer menos. “As pessoas gostam de acusar principalmente a mãe. Mas independentemente do que ele fez, eu amo meu filho. Se eu não amar, quem vai?”, questiona.

*Maria é um nome fictício para preservar a identidade da família e do adolescente.

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