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Tecnologias podem zerar carbono do etanol brasileiro, aponta estudo

Pesquisa mostra que uso de captura de carbono e biochar deixaria biocombustível ainda mais competitivo

Por José Cruz | 21/11/2025 14:09
Tecnologias podem zerar carbono do etanol brasileiro, aponta estudo

Estudo da Embrapa Meio Ambiente (SP) em parceria com a Unicamp aponta que o etanol brasileiro pode chegar a uma pegada de carbono próxima de zero — e até negativa — caso tecnologias de captura e armazenamento de carbono sejam incorporadas ao setor sucroenergético.

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Pesquisa realizada pela Embrapa Meio Ambiente e Unicamp revela que o etanol brasileiro pode alcançar pegada de carbono zero ou negativa com a implementação de tecnologias de captura e armazenamento de carbono. O estudo analisou duas soluções: o BECCS (Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono) e o biochar.Com a aplicação dessas tecnologias, o etanol poderia superar até mesmo o desempenho ambiental de veículos elétricos. No entanto, o alto custo de implementação, variando entre US$ 100 e US$ 427 por tonelada de CO₂, ainda é o principal obstáculo para a adoção em larga escala no setor sucroenergético brasileiro.

A análise avaliou duas soluções consideradas promissoras: o BECCS (Bioenergia com Captura e Armazenamento de Carbono) e o uso de biochar, um tipo de biocarvão aplicado ao solo. Os dois processos atuam removendo carbono da atmosfera e impedindo que ele volte a ser liberado durante a produção de etanol.

Hoje, segundo a metodologia do RenovaBio, o etanol hidratado apresenta intensidade de carbono de 32,8 gCO₂e/MJ. Com BECCS apenas na etapa de fermentação, esse número cairia para 10,4 gCO₂e/MJ.

O uso de biochar reduziria para 15,9 gCO₂e/MJ. Em cenários mais ousados, capturando também o CO₂ emitido na queima do bagaço e da palha, o resultado poderia chegar a –81,3 gCO₂e/MJ — emissões negativas.

Captura em duas frentes

O BECCS captura o CO₂ liberado durante a fermentação e na geração de vapor e energia em usinas. Depois, o gás é comprimido e injetado em formações rochosas profundas, onde fica armazenado de forma permanente. A tecnologia já existe no Brasil em usinas de etanol de milho, mas nenhuma unidade de cana opera o sistema.

“A fermentação é a etapa mais simples de capturar, porque o CO₂ é quase puro”, explica a pesquisadora Nilza Patrícia Ramos, da Embrapa Meio Ambiente. Já capturar o carbono emitido na combustão da biomassa pode gerar redução ainda maior, mas custa mais caro e exige infraestrutura para transporte e armazenamento geológico.

O biochar, por sua vez, é produzido a partir do aquecimento de resíduos como o bagaço de cana. Quando aplicado ao solo, funciona como um reservatório de carbono de longa duração e ainda melhora a fertilidade. Uma tonelada de biochar representa o sequestro de até 1,42 tonelada de CO₂ equivalente.

Etanol com desempenho superior ao elétrico

O estudo também comparou o impacto de veículos movidos a etanol, gasolina e eletricidade. Mesmo sem tecnologias adicionais, o etanol de cana já é menos poluente que a gasolina. Com BECCS e biochar, poderia atingir desempenho similar — e em alguns cenários superior — ao de veículos elétricos carregados na média da matriz energética brasileira.

Custo trava adoção

Apesar do potencial, nenhuma das mais de 300 usinas certificadas no RenovaBio adota BECCS ou biochar. O principal motivo é financeiro. Enquanto o crédito de descarbonização (CBIO) vale cerca de US$ 20 por tonelada de CO₂ evitado, o custo para capturar carbono via BECCS varia entre US$ 100 e US$ 200/tCO₂. O biochar custa em média US$ 427 por tonelada.

A pesquisa aponta que, sem novos mecanismos de incentivo, como subsídios, linhas de financiamento ou remuneração semelhante à dos Estados Unidos — onde o crédito 45Q paga até US$ 180/tCO₂ capturado — as tecnologias devem seguir restritas a projetos-piloto.

Impacto nacional

Se aplicadas em larga escala, as tecnologias poderiam capturar até 197 milhões de toneladas de CO₂ equivalente, volume equivalente a 12% das emissões brasileiras de 2022. O cenário mais realista, com BECCS apenas na fermentação, capturaria cerca de 20 MtCO₂e por ano.

Os autores destacam que o Brasil tem potencial para liderar o desenvolvimento de combustíveis de “emissão negativa”, graças à experiência no setor sucroenergético e a políticas como o RenovaBio. Para isso, será preciso ajustar incentivos econômicos e criar regras que tornem a captura de carbono um negócio mais viável.

O estudo conclui que o avanço tecnológico já existe — falta agora o país transformar o carbono negativo em oportunidade econômica para competir globalmente com os combustíveis fósseis, os elétricos e até o hidrogênio verde.