CGU aponta "fragilidade" em emendas de R$ 15,4 milhões de Soraya Thronicke
Auditoria identificou planos de trabalho genéricos, falta de transparência e risco de desperdício de recursos
Relatório elaborado pela CGU (Controladoria-Geral da União) apontou fragilidades significativas na aplicação de R$ 15,4 milhões em duas emendas parlamentares destinadas pela senadora sul-mato-grossense Soraya Thronicke (Podemos-MS) ao IDS (Instituto de Desenvolvimento Socioambiental), nos anos de 2023 e 2024.
RESUMO
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A Controladoria-Geral da União (CGU) identificou irregularidades na aplicação de R$ 15,4 milhões em emendas parlamentares destinadas pela senadora Soraya Thronicke ao Instituto de Desenvolvimento Socioambiental (IDS). Os recursos, direcionados a projetos agrícolas em Mato Grosso do Sul, apresentaram falhas no planejamento e transparência. A auditoria apontou ausência de extratos bancários, metas pouco detalhadas e prestações de contas inconsistentes. O IDS, que possui apenas um funcionário registrado, terceirizou a execução dos projetos para empresas de outros estados. A senadora Thronicke afirma não ter recebido comunicação oficial sobre as irregularidades e destaca que sua função se limita à indicação dos recursos.
Os recursos federais foram repassados para execução de projetos de suporte à agricultura e pecuária, além de feiras e ações de transferência de conhecimento, tecnologia e inovação voltadas a produtores rurais em cidades do interior de Mato Grosso do Sul, em Naviraí, Aquidauana e Coxim.
A investigação foi conduzida em cumprimento a determinação do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino, relator da ADPF 854, que determinou a auditoria de 100% das emendas parlamentares enviadas a ONGs (Organizações Não Governamentais) e OSCs (Organizações da Sociedade Civil).
As emendas foram formalizadas por meio de dois termos de fomento. O primeiro, no valor de R$ 7,48 milhões, tinha como objeto capacitações e ações de fortalecimento da agricultura e pecuária no Estado, com foco no município de Naviraí. O segundo, mais amplo, de R$ 8 milhões, previa a promoção de feiras agropecuárias, eventos de qualificação e transferência de tecnologia para produtores rurais de Aquidauana, Coxim e Naviraí. Ambos os instrumentos foram assinados entre o IDS e os MAPA (Ministérios da Agricultura e Pecuária) e do MDA (Desenvolvimento Agrário).
Segundo o relatório da CGU, apesar da dimensão financeira dos instrumentos, os planos de trabalho do IDS foram aprovados com baixo nível de detalhamento, sem metas claras e sem indicadores que permitissem aferir resultados. Os auditores destacam que a entidade não apresentou mecanismos de mensuração da efetividade das ações, tampouco justificativas consistentes que explicassem a motivação dos projetos e os critérios utilizados para seleção das atividades e municípios atendidos.
Um dos efeitos dessa ausência de parâmetros foi, segundo a CGU, a impossibilidade de avaliar se o que foi descrito como objetivo se materializou durante a execução dos recursos públicos.
A auditoria também identificou falhas no acompanhamento ministerial, observando que os órgãos repassadores não exigiram correções nas deficiências dos planos de trabalho, tampouco aplicaram rigor técnico no momento da análise e aprovação dos termos. A CGU afirma que o Mapa e o MDA foram pouco criteriosos e, em alguns casos, podem ter feito vista grossa na liberação de recursos, possibilitando que propostas aquém do exigido pela legislação fossem aprovadas sem ajustes. O relatório sugere ainda que a liberação rápida das emendas pode ter levado a análises superficiais, favorecendo a celebração de instrumentos sem controle adequado.
Outro ponto considerado crítico é a transparência financeira. A CGU apontou que o IDS não apresentou extratos bancários completos das contas vinculadas aos recursos recebidos, o que comprometeu a rastreabilidade das operações e impediu que o órgão verificasse integralmente como, quando e para quem o dinheiro foi repassado. Em um dos termos, houve envio parcial de extratos; no outro, a documentação sequer foi enviada, segundo o relatório.
Os auditores afirmam que a ausência de registros financeiros completos representa risco de má aplicação ou desvio de valores e impede a certificação do uso adequado dos R$ 15,4 milhões. A falta de dados financeiros também viola obrigações legais de transparência ativa, que exigem a disponibilização pública de informações sobre o uso de recursos federais.

Apesar de sediada no Rio de Janeiro e de manter filiais em São Luís, Rio Branco e Santo André, o instituto aumentou sua atuação em Mato Grosso do Sul por meio das emendas da senadora. Entretanto, o relatório informa que o IDS, ao longo de sua existência, teve apenas um funcionário registrado formalmente, o que levou à terceirização completa da execução dos objetos financiados.
Segundo a CGU, a execução dos eventos e serviços nas cidades do interior foi feita por empresas de fora do Estado, como a DNL Serviços, de São Luís (MA), a Tudo Press, do Rio de Janeiro (RJ), e o Instituto Reinventar Educação, Cultura e Sustentabilidade, também sediado na capital fluminense. Essa dependência de terceiros, aliada à falta de estrutura operacional própria, elevou o risco de fragilidade na implementação das ações.
Com os recursos, o IDS financiou ações e eventos em Naviraí, Aquidauana e Coxim, como feiras agropecuárias, atividades nomeadas como “Cozinha Show” e concursos de merendeiras, além de destinar parte dos valores ao Pantanal Tech, evento associado ao governo estadual.
Contudo, as empresas responsáveis pela execução apresentaram prestações de contas incompletas e inconsistentes. A DNL Serviços, contratada por R$ 3,2 milhões para organizar a feira e o “Cozinha Show” em Naviraí, entregou notas fiscais com descrições genéricas, sem detalhamento de quantidades, especificações técnicas ou preços unitários e totais de serviços como montagem de estandes, instalação de banheiros químicos e fornecimento de internet.
Já no concurso de merendeiras, que custou R$ 2,49 milhões, a Tudo Press informou no portal Transferegov.br que 610 merendeiras participaram do evento, enquanto o contrato previa 33 participantes e a lista nominal entregue à CGU indicava apenas 32 nomes. No caso do termo subcontratado ao Instituto Reinventar para realizar eventos nos três municípios, nenhuma prestação de contas foi apresentada.
A CGU concluiu que o conjunto de fragilidades identificadas, falhas de planejamento, falta de transparência financeira, inconsistências na comprovação da execução e pouca exigência técnica por parte dos ministérios, configura risco de uso ineficiente ou irregular dos recursos públicos, com possibilidade de desperdício e de superfaturamento.
O órgão resumiu que, sem extratos bancários completos, sem metas detalhadas e sem comprovação de compatibilidade de preços com o mercado, não é possível confirmar que os R$ 15,4 milhões cumpriram a finalidade prevista em lei. Os ministérios auditados afirmaram ter adotado medidas para aprimorar gestão e controles internos.
O IDS, por sua vez, alegou ter apresentado documentação financeira e afirmou ter criado fluxos padronizados de monitoramento, mas a CGU contestou a veracidade das informações e destacou que as medidas adotadas não foram suficientes para corrigir as fragilidades identificadas.
A senadora Soraya Thronicke, procurada sobre o caso, afirma que não recebeu até o momento qualquer comunicação oficial da CGU sobre supostas inconsistências envolvendo as emendas destinadas ao IDS. Segundo ela, diante da circulação da informação pela imprensa, sua assessoria oficiou a CGU solicitando esclarecimentos formais sobre eventual existência de apuração, auditoria, sindicância, investigação ou qualquer outro procedimento, formal ou informal, relacionado às emendas. O objetivo, de acordo com a parlamentar, é obter conhecimento oficial e detalhado dos fatos, caso existam, para só então se manifestar com base técnica e responsabilidade.
Soraya afirma também que sua responsabilidade sobre emendas parlamentares se restringe à indicação dos recursos e ao acompanhamento político de sua correta aplicação, sendo a análise técnica, aprovação dos planos de trabalho, liberação de valores e fiscalização da execução atribuições exclusivas dos ministérios responsáveis.
Segundo ela, todos os repasses foram realizados diretamente pelo MDA e pelo Mapa, conforme critérios técnicos e procedimentos internos de cada órgão. A senadora ressaltou que acompanha os projetos com o propósito de assegurar que os recursos sejam utilizados conforme o interesse público e que todas as indicações seguem princípios constitucionais como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Em sua manifestação, a parlamentar destacou ainda que os recursos direcionados ao IDS foram encaminhados com total transparência para execução do Prospera MS, projeto que, segundo ela, fortalece a agricultura familiar e o empreendedorismo no Estado, promovendo feiras, capacitações, ações tecnológicas e atividades culturais.
De acordo com Soraya, o Prospera MS já atendeu cinco municípios sul-mato-grossenses, Naviraí, Aquidauana, Coxim, Jardim e Ponta Porã, e terá Corumbá como próxima etapa. A senadora defende que os projetos têm impacto positivo no interior e afirma que seguirá acompanhando o programa, com foco na ampliação das ações e no atendimento de mais comunidades rurais.



