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ABRIL, QUARTA  24    CAMPO GRANDE 22º

Política

Juiz rejeita ação contra Bernal baseada no relatório da CPI do Calote

Josemil Arruda | 16/01/2014 19:38
Bernal não teria fabricado emergência, segundo a decisão do juiz (Foto: arquivo)
Bernal não teria fabricado emergência, segundo a decisão do juiz (Foto: arquivo)

O juiz da 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, David de Oliveira Gomes Filho, rejeitou hoje a ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público Estadual (MPE), com base na denúncia apresentada pela CPI do Calote à Câmara de Campo Grande e em cujo relatório se norteou a criação da Comissão Processante. Na mesma decisão, em que viu apenas uma irregularidade, a contratação da Salute Distribuidora de Alimentos, mas a considerou "culposa", o juiz determinou a extinção do processo.

Em sua sentença, o juiz afirmou que o simples inadimplemento ou atraso a pagamentos contratuais não caracterizam ato de improbidade administrativa. Considerou que os inadimplementos existentes foram objeto de prévia análise técnica que apontava para irregularidades dos contratos, justificando a precaução da administração municipal. E concluiu:”Não houve emergência fabricada, mas emergência real”.

As contratações emergenciais na gestão do prefeito Alcides Bernal, como com as empresas MegaServ, Jagás e Salute, teriam ocorrido, na avaliação do juiz David de Oliveira, “pelos menores preços, dentre os apresentados, firmando-se, na seqüência, contratos de curto período de duração”.

Fabricação de emergência – No pedido de condenação por improbidade administrativa, o promotor Alexandre Capiberibe Saldanha, afirmou que o prefeito Alcides Bernal teria atrasado pagamentos para empreiteiros ou simplesmente teria deixado de pagar as contas da Prefeitura Municipal com estes empreiteiros para forçá-los a desistir do contrato, abrindo, assim, caminho para a contratação emergencial de serviços com outras empresas. Esta conduta, segundo alega, se enquadraria na hipótese do art. 10, VIII e do art. 11, II, da Lei de Improbidade Administrativa.

“A realidade, entretanto, se apresenta diferente daquela que consta da inicial. Não foi constatado dolo na conduta atribuída ao Prefeito Municipal (participação consciente e direcionada para um fim ilícito), não foi constatado dano ao erário público e sequer foi demonstrado na inicial a vinculação entre os fatos delatados e a conseqüente contratação suspeita de fraude. Referidos inadimplementos não tipificam a omissão ou o retardamento a que se refere o art. 11, II da Lei de Improbidade e sequer representam uma indevida dispensa de processo licitatório a que se refere o art. 10, VIII da Lei de Improbidade”, fundamentou o magistrado.

Inadimplência de órgãos públicos a obrigações legais ou contratuais, infelizmente, segundo o juiz, é uma realidade comum em todos os níveis da administração pública brasileira. Basta ver o número de ações judiciais que existem por conta da omissão do Município, do Estado, da União ou das suas autarquias no pagamento de dívidas ou de contratos com particulares, com empresas e com prestadores de serviços. “Basta ver o número de precatórios atrasados ou não pagos. Atraso a pagamento para empreiteiros é uma questão de interesse particular e, de regra, não se trata de interesse social”, sustentou,considerando dessa forma que o atraso em si está longe de configurar um ato de improbidade administrativa.

Cautela necessária - Este raciocínio já bastaria para reconhecer a improcedência do pedido, conforme o magistrado, mas considerou ainda que Bernal trouxe motivos bastante razoáveis para ter maior cautela nos pagamentos de algumas empresas. O juiz analisou a situação de cinco empresas com pagamentos atrasados - Norbeoil; MDR Distribuidora de Alimentos; CG Solurb; Vyga; e Total – e considerou que os atrasos foram justificáveis.

Na avaliação do juiz, com o fim dos contratos mencionados, o serviço de limpeza de unidades públicas, o estoque de gás e de alimentos para creches, escolas e outras unidades passaram a correr o risco de desabastecimento. “Foi exatamente isto o que constou das respectivas justificativas existentes neste processo e o que se conclui da própria dinâmica dos fatos como algo lógico”, apontou o magistrado.

O contrato com a MDR Distribuidora de Alimentos, por exemplo, não teria sido renovado porque se entendeu que a terceira renovação contraria o art. 57, § 4º da Lei n. 8.666/934. “O contrato com a empresa Total Administração de Serviços Terceirizados Ltda., que prestava serviço de limpeza, não foi assinado por suspeita de fraude na licitação e de superfaturamento; e a licitação para a compra de gás liqüefeito, em que foi vencedora a empresa Micmar, não terminou no tempo previsto em razão dos recursos interpostos”, sustentou na sentença.

Desta forma, destacou o juiz, “os serviços de limpeza de postos de saúde, de fornecimento de gás e de aquisição de alimentos para merendas escolares evidentemente não poderiam parar e exigiam uma solução, que foi dada com a contratação das empresas Salute Distribuidora de Alimentos Ltda., MEGASERV e JáGás”.

A alegação do Ministério de que existiam processos licitatórios em curso, para o magistrado, é insuficiente para afastar a emergencialidade da medida, pois a avaliação sobre a necessidade destes produtos depende do conhecimento do estoque de produtos existentes (no caso dos alimentos e do gás) e este dado não foi apurado pela CPI e nem no procedimento prévio do Ministério Público. “De mais a mais, os produtos em questão, são gás de cozinha, comida e serviço de limpeza. Seria de gigantesca temeridade permitir ou arriscar permitir que tais produtos faltassem”, argumentou.”Assim, existiu efetivamente uma situação emergencial não criada pelo requerido”, acrescentou.

Inadimplência justificável – O juiz David de Oliveira Gomes Filho fez uma análise detida quanto à alegada indimplência contratual na gestão de Bernal, que, segundo o Ministério Público, teria a intenção de “fabricar emergência” para contratar empresas amigas. Veja abaixo a análise que o juiz fez para cada uma das cinco empresas elencadas pelo MP, com base no relatório da CPI da Inadimplência:

 Norbeoil  - Não consta do processo por quais motivos a Empresa Norbeoil teve o pagamento atrasado. O que se sabe é que o crédito era de R$ 29.787,64 pelo consumo de combustível na segunda quinzena de dezembro de 2012. Este período (16 de dezembro a 31 de dezembro) é uma época que abrange o recesso natalino na sua maior parte e um gasto de quase R$ 30.000,00 em combustível (gasolina), realmente, aparenta ser bastante expressivo para o período em questão. De qualquer forma, o atraso a esta empresa não se desdobrou na contratação de nenhuma das outras empresas apontadas pelo Sr. Promotor de Justiça. Consequentemente, o tema parece irrelevante para a causa.

MDR Distribuidora de Alimentos - O contrato da Empresa MDR Distribuidora de Alimentos estava vencido desde maio de 2012 e a atual administração municipal anulou o 3º termo aditivo, em ato devidamente motivado e sob o argumento de que a renovação do contrato contrariava expressa disposição de lei (art. 57, § 4º da Lei n. 8.666/93) que proíbe prorrogação de contrato por prazo superior a 12 meses. Consta, ainda, do documento de fls. 2.555 que houve acréscimo de 25% no preço das mercadorias na primeira prorrogação do contrato, ocorrida na gestão anterior.

Veja-se, ainda, o conteúdo dos documentos de fls. 2.460 a 2.462. Todo o histórico das contratações desta empresa constam às fls. 2.383/2.634 e 3.375/3.433. Nestas circunstâncias, não há como concluir que a recusa da administração em fazer a "terceira" renovação do contrato com a Empresa MDR, com preços superiores ao contratado, se enquadraria numa das hipóteses da Lei de Improbidade Administrativa. Lembro que a prorrogação de um contrato é matéria discricionária, cabendo apenas à Administração Pública, numa análise de conveniência e de oportunidade, dizer se era ou não do interesse da administração a renovação do contrato.

Neste particular, a inicial não dispensou uma linha sequer para defender a legalidade da prorrogação deste contrato. Repita-se uma "terceira" renovação de contrato, por preços superiores ao contratado e sem que houvesse um procedimento licitatório, em benefício da Empresa MDR Distribuidora de Alimentos.

Concluindo, a questão é controversa o suficiente para afastar o dolo do prefeito no ato denunciado na inicial (recusa em prorrogar o contrato).

CG SolurbO contrato com a Empresa Solurb, por sua vez, foi anulado pela Justiça, que reconheceu a existência de vícios no processo licitatório. Veja-se a sentença do processo n. 0038391-94.2012 que consta às fls. 2301/2335.

Se o contrato foi anulado em juízo, certamente que o receio do prefeito municipal em cumpri-lo não pode ser considerado um ato de improbidade, ainda que este receio tenha ocorrido antes da sentença.

Vyga - No que se refere à Empresa Vyga, o depoimento transcrito na inicial revela que houve atraso no pagamento de R$ 840.000,00, mas também comprova que o contrato foi cumprido até o final. Não consta que tenha existido rescisão ou distrato contratual antes do tempo. A bem da verdade, o documento de fls. 484 revela que o contrato venceu no tempo pré-determinado e sem este término forçado do acordo, a tese do promotor de justiça não se sustenta. Lembre-se que ele alega que o requerido "forçou" um final antecipado dos contratos, para negociar com outras empresas.

Total - Finalmente, a licitação concluída em dezembro de 2012, em que foi vencedora a Empresa Total, foi alvo de inquérito administrativo, por suspeitas de direcionamento e de superfaturamento. Não se sabe se a questão foi levada ao Poder Judiciário, ou comunicada ao Ministério Público, mas a conclusão da auditoria externa apresentada às fls. 3364/3370 foi pela revogação do contrato.

Ora, os motivos apresentados pelo requerido para a revogação do ato são graves e mereceriam profunda e isenta investigação pelo Ministério Público. Enfim, o ato atribuído ao Prefeito Municipal, de não dar continuidade a contrato suspeito de direcionamento e de superfaturamento, está longe de configurar improbidade administrativa.

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