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As violentas cólicas do autoritarismo sindical

Por Normann Kalmus (*) | 20/05/2019 08:31

Começo com uma citação do genial Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, o “Barão de Itararé”: “O Brasil é feito por nós. Está na hora de desatar esses nós”.

Depois de uma certa idade você começa a perceber que por trás de uma crítica a qualquer avanço, existe um medo atávico pelo novo. Evidentemente quem teme a mudança é quem está satisfeito com o que já conquistou.

Os cem dias de administração Bolsonaro têm sido duramente criticados por diversas razões, mas, em essência, tudo se resume ao medo em relação ao futuro porque, a mudança de poder acarreta a saudável alternância de pensamento, o que me lembra de outro pensador brasileiro, Millôr Fernandes, que resumiu o problema com uma frase deliciosa: “Democracia é quando eu mando em você, ditadura é quando você manda em mim”.

No entanto, não resolvi escrever este texto por conta dessas pérolas geniais, mas por ter lido uma declaração, publicada no website da Fecomércio MS, na qual a entidade orgulhosamente apresenta a tese de seu consultor jurídico que critica a mudança das relações de trabalho, em especial, a contribuição sindical.

Veja você que a mencionada tese foi apresentada no 35º Congresso Nacional de Sindicatos Empresariais do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNSE), ocorrido em Fortaleza, CE. Em especial, o advogado critica a cobrança indireta da contribuição sindical, ou seja, ele é contra a medida provisória que determina que o sindicato precisa receber diretamente do associado.

Se houve no governo Michel Temer um avanço significativo para a sociedade brasileira, esse foi exatamente a flexibilização das relações trabalhistas, que já não mais estão calcadas em princípios estabelecidos no início do Século XX, mas reconheceram que, afinal, o trabalhador não é um ser descerebrado e que pode, sim, estabelecer de comum acordo o que lhe é mais conveniente. No entanto, essa entidade (suponho que o consultor tenha feito a apresentação em nome da entidade que representa) aparentemente defende o retorno às trevas.

A crítica é tão absolutamente insana que resolvi entender as razões pelas quais uma entidade que declara em seu website atuar com “programas de resultado, evitando a autopromoção”, está envolvida na conjuração para criticar um dos mais importantes nós desatados pelo governo federal.

A razão aparente não poderia ser outra que não o medo pelo novo e pelas consequências das mudanças vindouras.

A Fecomércio faz parte do CNC – Confederação Nacional do Comércio, que, por sua vez, faz parte do famigerado Sistema S, que tem frequentado o noticiário recente por não concordar, veja você, com a sua inclusão das entidades na Lei de Acesso à Informação, o que as obriga a simplesmente disponibilizar as informações sobre seus gastos.

Vale um esclarecimento: as receitas dessas entidades originam-se de recolhimentos de tributos, portanto, são recursos públicos (ou do público), mas seus dirigentes consideram inconstitucional a exigência de permitir à sociedade que saiba onde tais recursos são gastos. Não quero nem por sonho pensar que eles tenham algo a esconder, portanto, só posso supor que tudo se restrinja ao receio por um novo ordenamento legal que os coloque em uma situação desconhecida.

Para quem não sabe, o “Sistema S” é composto por nove entidades (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Sebrae, Senar, Sescoop, Sest e Senat) e foram, desde antes da posse do novo governo, alvo de declarações do ministro Paulo Guedes, que afirmou ser necessário estabelecer novos critérios para a aplicação dos seus recursos.

Mas não estou falando somente desse amontoado de entidades e de sua renitente disposição em segurar o tempo, mas de todo um sistema supostamente lógico das entidades brasileiras que simplesmente não querem aceitar que a mudança é absolutamente inevitável.

Recentemente nossa corte suprema tentou sem sucesso censurar dois sites de notícias por haver, pasme, noticiado um fato absolutamente verdadeiro (incômodo, é verdade, mas verdadeiro). Agora essa vetusta entidade resolve insurgir-se contra a cobrança sindical indireta, como se fosse a coisa mais absurda do mundo o prestador de serviço cobrar diretamente o seu cliente, afinal, supostamente o sindicato representa os interesses de uma categoria, ou seja, essa categoria é sua cliente... ou não?

Bem, considerando a atuação da entidade no recente dissídio coletivo, começo a ter dúvidas também em relação a isso, mas não vou entrar nesse mérito.

Mudaram os tempos e não adianta estrebuchar. Como forma de comprovar o argumento, eu tive o capricho de registrar em Blockchain a notícia que deu origem a este texto. Sabe o que significa isso? Que ninguém poderá alterar qualquer item, por menor que seja, do que estava publicado naquele instante, ainda que o site ou a notícia sejam excluídos.

Ficou curioso, né? Pode acessar o registro completo através do link: e-hash.ly/fecomercio

Os nós que o Barão de Itararé há muito tempo identificou que precisariam ser desfeitos, devem causar cólicas em muita gente, mas não se pode fazer uma omelete sem quebrar os ovos, portanto, aos renitentes minha sugestão: relaxem e aproveitem porque os novos tempos chegam a todo momento, sem pedir autorização.

(*) Normann Kalmus é economista-chefe da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande (ACICG), especialista em Gestão do Conhecimento (COPPE/UFRJ), Administração de Projetos Logic-Frame (BID) e Educação Ambiental (SENAC).

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