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Lei do Inquilinato completa dois anos e não aumenta oferta de imóveis

Ragner Limongeli Vianna (*) | 18/02/2012 09:34

Publicada em dezembro de 2009, a chamada Nova Lei do Inquilinato (Lei de Locações nº 8.245/91) completou pouco mais de dois anos e não ajudou a aumentar a oferta de imóveis no mercado e nem contribuiu para diminuir o valor dos aluguéis.

No momento em que referida lei entrou em vigor, várias foram as críticas e os elogios às alterações por ela introduzidas. Alguns sustentando que se tratava de uma “Lei dos Proprietários” (eis que aumentava o poder desses na relação locatícia, injustificadamente), outros que traria ao mercado de locações de imóveis um incentivo que levaria ao aumento de investimento no setor e à diminuição dos valores dos aluguéis.

Passados dois anos de sua entrada em vigor, o que se percebe é que poucas foram as alterações no mercado. A lei, de fato, produziu importantes alterações nas relações locatícias. No entanto, essas alterações são muito mais sentidas por locatários e locadores em suas relações específicas, do que no meio social e econômico das relações envolvidas.

Desde sua promulgação, defendi que poucos efeitos teriam tais alterações em relação a aumento de investimentos, oferta de imóveis ou diminuição do valor dos aluguéis. A prática está comprovando isso.

É fácil de se compreender os motivos que impedem tais efeitos sociais e econômicos pretendidos. Basicamente, as alterações introduzidas com tal intuito pretenderam aumentar a celeridade dos processos especiais da relação locatícia, com a finalidade clara de atribuir aos proprietários-locadores maior segurança contra prejuízos financeiros. Tais foram as alterações com esse intuito, como a introdução de quatro novas hipóteses de despejo liminar (no prazo de 15 dias e sem sequer ser ouvido o locatário).

São elas:

a) necessidade de reparações urgentes no imóvel determinadas pelo poder público, que não puderem ser efetuadas sem a desocupação do imóvel, ou se possível, não a permitir o locatário;

b) exoneração do fiador, sem que o locatário ofereça novo garantidor;

c) encerramento do prazo contratual para locação de fins não residenciais;

d) falta de pagamento dos aluguéis ou encargos da locação, desde que não haja nenhuma garantia em vigor.

Além disso, dentre as alterações introduzidas, também é possível apontar as seguintes, que têm a mesma finalidade de aumentar a oferta e diminuir os aluguéis:

I)Nas ações renovatórias, a retomada passou a ser possível com a publicação da sentença de improcedência da ação e ainda diminuiu-se o prazo para o despejo do locatário que era de até seis meses para 30 dias. Portanto, não é mais necessário aguardar-se o trânsito em julgado da decisão (diminuindo sensivelmente o tempo de efetiva retomada do imóvel, eis que não há mais necessidade de aguardar o julgamento de recursos – embora reconheçamos haver opiniões minoritárias em contrário);

II)O locatário passou a dispor de apenas uma possibilidade de purgar a mora, em caso de atraso no pagamento de aluguéis e acessórios, a cada período de 24 meses;

Como se vê, no que tange aos despejos liminares (que seriam, em tese, as alterações mais relevantes para tornar mais seguro o investimento em locações imobiliárias), a primeira hipótese é de pequena aplicação prática.

Já a possibilidade de retomada liminar em função da perda, por qualquer razão, da garantia locatícia, vem em proteção do locador. Também a possibilidade de retomada liminar em função do decurso do prazo contratual concede uma proteção desejável ao locador, evitando que seja obrigado a manter uma relação contratual da qual já não mais tenha interesse.

No entanto, essa possibilidade só é aplicável às locações não residenciais. Para as locações residenciais, não cabe o despejo liminar, atraindo a necessidade de todos os trâmites processuais para a obtenção do despejo. Portanto, fica desestimulado, nesse sentido, o investimento e a oferta para locações residenciais, na contramão das maiores necessidades sociais.

Assim, é ´possível afirmar que apesar dessas alterações serem positivas e tenderem, de fato, a gerar maior segurança aos locadores, são as mesmas insuficientes para estabelecer um maior interesse no setor.

Ademais, na circunstância que leva o maior prejuízo aos locadores, e que é mais temida pelos mesmos (ao lado dos danos ao imóvel), o não pagamento dos aluguéis e demais encargos, só poderá ensejar despejo liminar se, e somente se, a locação estiver desprovida de qualquer garantia contratual.

Ora, é sabido que são raros os locadores que dispensam as garantias locatícias, continua o locador desprovido de proteção eficaz e célere, na hipótese em que a mesma mais se mostra necessária: a falta de pagamento. É de se compreender que a “garantia contratual”, a rigor, não é absolutamente segura (está longe disso). Por diversas razões, mesmo havendo garantia estipulada no contrato, o locador pode sofrer prejuízos (seja porque o fiador tornou-se insolvente, porque a caução foi insuficiente, etc...).

Aos locadores, permanece o medo de serem obrigados a suportar um inquilino usando seu imóvel, sem pagar aluguéis, taxas de condomínio e outros encargos, sem que seja possível retomar o imóvel de maneira rápida a evitar maiores prejuízos.

As alterações nas ações renovatórias e a redução do direito de emenda da mora também são positivas, mas estão longe de tornar as relações locatícias um meio de investimento melhor e mais seguro.

Em relação à fiança, seguramente a garantia mais comum nas relações locatícias, e que se revela uma dois maiores problemas para os inquilinos, a nova lei pouco mudou. Na verdade, apenas consolidou posição jurisprudencial já dominante à época.

Para concluir, é necessário que se compreenda que o maior entrave nas relações locatícias não foi, nem poderia ter sido, atingido pela referida lei. O maior entrave está na demora dos processos judiciais. Mesmo em hipóteses de previsão de concessão de liminar em benefício do locador, essa acaba por levar meses para se tornar eficaz.

Quem pretende fazer de locações um meio de investimento, deverá considerar adquirir imóveis em locais cujos fóruns sejam mais céleres. Há fóruns em São Paulo, por exemplo, que levam seis meses para autuar um processo. Pouco adianta a lei determinar o despejo em 15 dias, se o processo leva seis meses para chegar ao juiz para o primeiro despacho.

A legislação e a jurisprudência, em matéria de locações, avançaram muito desde a introdução da Lei 8.245/91. Entendo que as relações entre locadores e locatários são, hoje, uma relação regulada de maneira equilibrada. Foram, assim, superados os equívocos de outrora.

Para que se atinja a finalidade de aumentar a oferta de imóveis, atrair maiores investimentos ao setor, suprir a necessidade de imóveis e reduzir o valor de aluguéis, é necessário, sobretudo, que se dê maior celeridade e eficácia aos processos judiciais. Sem proteção judicial adequada e rápida, as previsões legais jamais atingirão a eficácia desejada.

(*)Ragner Limongeli Vianna é advogado, sócio do Vianna & Gabrilli Advogados Associados, Doutorando em Direito Civil pela PUC de SP e diretor do Instituto de Direito Privado (IDP)

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