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O ensino da ética e a corrupção

Por Willyans Maciel (*) | 10/04/2017 13:53

No aniversário da Operação Lava Jato fomos surpreendidos pela Operação Carne Fraca, que trata da corrupção na fiscalização de grandes e renomadas empresas brasileiras do ramo frigorífico. Este tipo de escândalo nos choca mais do que qualquer outro, pois trata de produtos que utilizamos para alimentar nossos filhos e familiares. Tudo parece pior quando se trata da nossa comida, sentimo-nos agredidos na base da nossa sobrevivência e a corrupção nos faz vítimas diretas.

A carne brasileira é de boa qualidade, o esquema de corrupção envolveu, até onde sabemos, menos de 0,5% das unidades frigoríficas fiscalizadas, um volume que felizmente apresenta risco baixo para a saúde pública. Ainda assim, foi suficiente para disparar o alerta de clientes externos e internos, bem como a repulsa moral da população. A moral não trata de volume, mas de atitudes e juízos.

Embora felizes que o esquema tenha sido desmantelado, temos a sensação de que deveríamos ser capazes de impedir ou ao menos mostrar que este não é o padrão. Neste ponto entra a ética, sua prática deveria ser o padrão ouro de agentes públicos e privados, e o seu ensino uma possibilidade de solução a longo prazo para esta cultura de corrupção e o famoso "jeitinho brasileiro".

Nós gostaríamos de deixar de ser o país do "jeitinho", mas como poderíamos compreender o que é preciso para superar este cenário? Estas são questões levantadas pela disciplina de ética em todos os níveis de ensino, mas que são tão mais eficazes no aperfeiçoamento moral dos nossos jovens quanto mais cedo forem introduzidas na educação.

Na raiz da infração ética temos a questão cultural. Cada indivíduo é dotado de capacidade moral, a capacidade humana de avaliar o que é bom ou ruim. Esta é influenciada por diversos fatores, entre eles a genética, a plasticidade neuronal e a forma como este indivíduo foi educado, especialmente nos primeiros anos, no seio da família. Esta capacidade moral gera uma visão de mundo, que é a base individual dos valores e pode ter elementos em comum com outros indivíduos, facilitando a relação com aqueles que compartilham nossa opinião em alguma medida.

Quando pensamos em termos de sociedade, há uma combinação dessas visões de mundo e neste âmbito se faz a ética por meio do diálogo proporcionado pelos pontos em comum. Se não somos capazes de encontrar tais pontos entramos em conflito, se somos capazes configura-se um diálogo que se estende ao longo do tempo e da sociedade em que vivemos.

Este diálogo formará as normas pelas quais consideramos um comportamento aceitável ou não, compreendendo aquilo que valorizamos como sociedade, os valores sociais. A combinação destes valores é uma espécie de visão de mundo coletiva, a qual nós chamamos "cultura".

Este processo, no entanto, não inclui apenas elementos que consideramos bons, mas inclui também aqueles que individualmente podemos considerar como ruins, porém que parecem aceitáveis dentro do contexto social. Por exemplo, podemos considerar que a corrupção é má, mas ao ver que "todo mundo faz" sentimo-nos impelidos a acreditar que não há problema fazer.

Isto acontece porque seres humanos não são perfeitamente racionais, e nem devem ser. Porém, quando nossas ações afetam a sociedade, é preciso promover um diálogo baseado na razão, para formar uma cultura ética. O primeiro passo seria que cada atitude extrapolasse a esfera individual e focasse no comprometimento com os valores fazendo com que os responsáveis por decisões importantes pensem no impacto de suas escolhas na sociedade.

Como por exemplo o auditor fiscal federal que com sua denúncia desmascarou um pedaço do que pode ser uma ferida grave na comercialização de carnes no Brasil. Além de mostrar as fraudes, que foram mais econômicas que sanitárias, o exemplo dado foi importante para revelar a força que uma pessoa íntegra pode ter em um meio corrupto e viciado. Já dizia o Arcebispo Fulton J. Sheen “os princípios morais não dependem dos votos da maioria. Errado é errado mesmo se toda a gente estiver errada. Certo é certo mesmo se ninguém estiver certo”.

(*) Willyans Maciel é mestre em Filosofia e professor do TECPUC.

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