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O lado negro das startups

Por Pedro Schaffa (*) | 02/09/2015 10:24

Em menos de uma década, a palavra startup saiu do desconhecido para ocupar uma posição consolidada no senso comum de muita gente. Quando se fala em digital, tecnologia ou empreendedorismo, você certamente vai cruzar com o conceito que engloba as empresas em estágio inicial. Criadoras de soluções e facilidades, elas têm alterado as relações sócioeconômicas, mas, agora, começamos a ver os problemas sofridos por esse modelo.

Como uma reação tardia à feroz (e por vezes cega) difusão das startups, cada vez mais se pergunta: qual o verdadeiro significado desse movimento? Por trás de tantos ganhos e vantagens que essas empresas sustentam em seus discursos, onde é que estão as perdas? Elas prosperam em um ambiente verdadeiramente sustentável? Será que lá na frente vamos poder dizer que entre mortos e feridos, salvaram-se todos?

Muitas das questões só serão respondidas com o passar do tempo, mas, como sempre, a história nos permite esboçar algumas conclusões. A primeira delas é que certas rupturas, de fato, já foram consolidadas. Alguns projetos que se apoiam no "sharing economy" (economia compartilhada) confirmam que a criatividade, o compartilhamento, a colaboração e a sustentabilidade de fato impulsionam a uma revisão de processos, instituições e tradições constituídas. Por exemplo o Airbnb, que revolucionou o processo de ocupação de domicílios e o Uber, mudando a cara do transporte público.

Do outro lado, há um mar de casos de insucesso, cujas histórias são varridas para debaixo do tapete como se fosse essencial esquecer deles (e cujos responsáveis, curiosamente, agora são coach e palestrantes de auto ajuda).

A HomeJoy, por exemplo, que intermediava trabalho doméstico nos Estados Unidos da mesma forma como o Helpling o faz no Brasil. Promoveu ruptura, mas não conseguiu seguir com as tão necessárias injeções de dinheiro e, por isso, fechou as portas. Entre as justificativas que levaram o projeto ao fracasso está a falta de respaldo jurídico e o receio de que a startup tivesse que assumir vínculos empregatícios com seus colaboradores.

Chega-se, portanto, à pergunta: quem vai vencer?

Como aconteceu na bolha da internet, algumas novidades terão vida longa e baterão de frente com empresas tradicionais. A grande maioria não vai suportar o rigoroso inverno, pois já nasceu velha, frágil e inadequada. É fundamental que o empreendedor brasileiro saiba exatamente o tamanho, a profundidade e a escuridão do buraco em que está se enfiando antes de se jogar de cabeça.

O primeiro ponto a se pensar bem quando se fala de startups brasileiras é que, até agora, ninguém sabe ao certo como ganhar dinheiro com elas. Todo mundo acha que ter participação numa empresa é como comprar ações do Facebook quando ele era pequeno - você investe mil reais e tira um bilhão de volta. Só que no Brasil são raríssimos os casos de startups que foram vendidas por valores altos e que retornaram uma quantia significativa para o investidor.

Além disso, dificilmente um acionista vai ganhar dinheiro só com dividendos (distribuição de lucros), uma vez que a grande maioria dos projetos necessita de constante alavancagem. Ou seja, a receita que entra é usada para continuar acelerando o negócio. Pelo menos enquanto ele se mostrar viável.

Há milhares de investidores de primeira viagem que ganhariam muito mais aplicando seu dinheiro na poupança do que na loteria das startups.

Outro ponto preocupante é a qualidade das empresas. Às vezes a ideia e o produto são bons, mas a administração é temerária e, na grande maioria, a necessidade e a procura pelo produto (normalmente aplicativos) é inexistente ou já existem competidores internacionais muito melhores.

São raros os casos de bons administradores, bem assessorados, com bons investidores (que não só tem dinheiro, mas conhecem a área em que se metem) e com bons produtos. O que há muito é gente dando murro em ponto de faca até que o dinheiro da empresa se esgota e o empreendedor precisa se socorrer com familiares e amigos para continuar seu sonho, que nessa fase já é um pesadelo. E perde-se muito dinheiro sustentando essas ilusões.

O Brasil não tem (ainda) um impacto internacional relevante na área de tecnologia. Assim, empresas brasileiras de tecnologia tem que se provar mais do que empresas de outros países. Além disso, a cultura empresarial brasileira ainda é vista sob certa desconfiança no cenário internacional. Vide o constante desaparecimento de aceleradoras e investidores internacionais no país.

E por último, muito se ouve nesse mundo de startups que todos falham e que isso não é problema, que você não só pode, como deve quebrar uma, duas, três vezes até alcançar o sucesso. Só que é importante saber que nem sempre o fracasso é um degrau na escalada para o sucesso, às vezes ele é só mais uma passo em direção ao abismo.

(*) Pedro Schaffa é sócio-fundador da SBAC Advogados (http://www.sbac.com.br/), escritório de advocacia que fornece soluções jurídicas para startups e pequenos e médios empresários em um modelo alternativo de atendimento, baseado em planos com preços e serviços tabelados.

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