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Sobre tragédias não anunciadas

Por Wal Reis* | 04/05/2019 09:54

Quando estamos falando de psicopatas não há como imputar culpas e nem procurar lógica.

É compreensível que busquemos imputar culpa quando ocorrem episódios como esse, de Suzano. Fica mais acolhedor imaginar que tudo poderia ser evitado se não existissem jogos de videogame violentos, se houvesse policiamento ostensivo ou até detector de metais nas escolas, se as famílias dos assassinos interditassem jovens pelo comportamento estranho (imaginem a quantidade de interdições...) se algum vizinho, parente, professor tivesse dado mais atenção àquela frase meio satânica proferida pelo cidadão...

Mas não. Infelizmente não é assim.

Até meus 12 anos eu escrevia sobre morte quase todos os dias. Quando não era morte, era algum grand finale, que envolvia cadeira de rodas ou doença terminal. Nem eu mesma sei porque fazia isso. Um dia minha mãe foi chamada na escola pela professora de português. Naquela época, mãe chamada na escola significava que a corda ia arrebentar para um dos lados, no caso, o meu. Não sei o que elas conversaram, mas lembro da minha mãe usando todo sua psicologia quando saiu da reunião: “para de escrever essas coisas idiotas, pelo menos na escola”. Problema solucionado. Eu continuei escrevendo meus textos taciturnamente e minhas dissertações, no colégio, passaram a acabar com mensagens positivas, arco-íris e sorrisos. E eu não matei ninguém e também não me suicidei.

Mas podia ter feito - Porque os vilões, em casos assim, moram dentro da gente. Boa parte das psicopatias não é detectável a olho nu. Convivemos com psicopatas no Metrô, no restaurante, no trabalho. Às vezes a casamos com eles. Ou chamamos para almoçar. Porque nem todos os psicopatas vêm com crachá de psicopata. Eles parecem uma pessoa como eu e você: que falam uma ou outra groselha de vez em quando, mas agem de acordo com os protocolos sociais na maior parte do tempo.

Enchentes podem ser negligências de obras de infraestrutura e poderiam ser evitadas. Queda de aviões também. Latrocínios idem. Até algumas doenças. Mas contra uma ação coordenada para matar aleatoriamente? Não há remédio. Porque as motivações são escusas e só descobertas depois que a tragédia já é estatística. Não adianta culpar a posse de arma: nem bandido nem psicopata fica esperando lei para agir de acordo.

Estamos sujeitos: no transporte público, caminhando em um parque, no teatro, em uma viagem internacional, no petshop. É indefensável e por isso choca. Ninguém está a salvo e somos todos alvos. Desgraçadamente.

*Wal Reis é jornalista e mantém a página "Em Outras Palavras" no Facebook.

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