ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, SEXTA  19    CAMPO GRANDE 20º

Artigos

Um homem tosco e “mal acabado”

Por Leo Daniele (*) | 18/09/2014 14:58

A indiferenciação, que avança como uma gangrena, é um mal característico de nossos dias.

Para o new look hodierno, tudo se passa como se o prejudicial ao homem fosse seu acabamento. Pareceria existir uma preferência pelo menos bem acabado enquanto inteligência, equilíbrio, habilidade, sexo, percepção, etc., e pelo tosco em todos os sentidos, desde que se apresente como manda o figurino hipermoderno, ou seja, sorridente e despreocupado.

Vejamos alguns exemplos.

As diferenças entre as idades são relativizadas. O que antigamente era “um homem feito”, hoje frequentemente é um “adulto de bolso”… Quase não conta mais, para efeitos práticos, que a pessoa tenha ou não atrás de si, muitos anos e sabedoria acumulados. Ou, se conta, é para que lhe seja negado emprego por “excesso de idade”, o que, conforme o ramo, já começa a acontecer aos 30 anos. Por mais que a pessoa coloque de lado qualquer ideia de dignidade e procure parecer jovem, esportiva, não conseguirá ter pleno trânsito, nem na sociedade em geral, nem mesmo entre seus coetâneos. Pleno trânsito quase só o possuem aqueles que, por sua condição, têm pouca experiência da vida.(1)

Fala-se em promover “o homem pardo da ONU”, ou “o homem bege”, a saber, a média cromática entre o branco, o preto, o vermelho e o amarelo. Um homem indeterminado, sem raça definida, destituído o quanto possível de características próprias e, a fortiori, de sua ascendência familiar. A ONU arroga-se assim o direito de corrigir o que certamente considera um “erro” da natureza… Ora, a natureza é uma obra de Deus. Será que a ONU julga ter altura para corrigir a Deus?

A palavra “unissex”, tão corrente, mostra a tendência à fusão dos sexos, quanto o permita a natureza, ou esquecida esta. A voga do homossexualismo está para os sexos como o “homem pardo da ONU”está para as raças. O meio termo em todos os campos é a grande obsessão.

Observa Edgar Morin: “O homem se efemina: fica mais sentimental, mais terno, mais fraco. Ao pai autoritário sucede o pai maternal, ao marido-chefe, o companheiro. [...] Inversamente, à emancipação masculiniza, certas condutas femininas: a autodeterminação sociológica adquirida pela mulher se torna autodeterminação psicológica. [...] A mulher está presente por toda parte, mas a mãe envolvente, desapareceu”.(2)

Também vão diminuindo cada vez mais as diferenças entre pais e filhos, bastardos e filhos legítimos, esposas e concubinas, homens normais e tarados, bêbados e sóbrios, professores e alunos, patrões e empregados, ricos e pobres, índios e “caras-pálidas”, bem-educados e cafajestes, civilizados e bárbaros, história e devaneio, fato e versão, realidade e ficção, música e ruído, obras de arte e brincadeiras de mau gosto… e até mesmo entre padres e leigos. Por vezes, fico pensando que mesmo alguns representantes do sagrado vão se despindo de seus véus de mistério para poder habitar no vale poluído da humanidade em liquidação de si mesma.

Hoje em dia, a superioridade muitas vezes inferioriza. Por exemplo, a natural ascendência própria à idade. Afirma Valéria Propato: “Ter a hierarquia do conhecimento invertida é uma experiência completamente nova em nossa sociedade. Por assimilarem a mídia digital com mais rapidez, crianças e jovens hoje têm uma autoridade em relação aos adultos que nunca tiveram”.(3)

O ridículo dá as mãos ao pedante na mania do “politicamente correto”, ou seja, na tentativa por vezes vã de evitar termos que exprimam desigualdades passíveis de ferir as susceptibilidades dos que sob algum aspecto estão abaixo da média. Os velhos tornaram-se “homens da terceira idade”; os cegos, “deficientes visuais”; os loucos, “usuários de serviços psiquiátricos”; as mães solteiras, “mães celibatárias”, etc.

Manifestações de uma tendência ainda mais extremada consistem em amortecer as diferenças existentes entre os homens e os bichos. Fala-se cada vez mais em “direitos” dos animais, artigos em revista de veterinária chamam-nos de “pacientes”, constroem-se hotéis para gatos, escovam-se os dentes de cachorros,(4) seus corpos são enterrados em “cemitérios” com direito a lápide e flores, etc.

Curioso que, em se tratando de animais, fala-se muito da importância de manter a biodiversidade da natureza; mas pouca atenção se dá em manter os povos com suas características próprias. Procura-se prestigiar os bichos e depreciar ao máximo a velha e notável espécie humana…(5)

(*) Leo Daniele é escritor e colaborador da ABIM.
____________________
Notas:

1. “O blue jeans, traje deliberadamente popular introduzido nas universidades americanas por estudantes que não queriam parecer com seus pais, terminou surgindo, em dias de semana e feriados, ou mesmo, no caso de ‘ocupações criativas’ e outras avançadinhas, no trabalho, embaixo de muita cabeça grisalha” (Hobsbawn Eric, Era dos Extremos (Companhia das Letras, São Paulo, 1998, p. 320).

2. op. cit., I, p. 140 e 152.

3. “Isto é”, S. Paulo, 9-4-2000.

4. “O Estado de S. Paulo”, 1-2-99, p. A9.

5. “O homem, dotado de alma espiritual, foi colocado por Deus acima da escala dos seres vivos, como príncipe e soberano do reino animal” – Pio XII, Alocução de 30-11-1941.

Nos siga no Google Notícias