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Uma mulher na Presidência: imaginário e representação social

Por Tânia Navarro-Swain (*) | 14/01/2011 09:03

Sou feminista e historiadora. Deste lugar de fala, observo a ascensão de Dilma Rousseff ao poder. Não sou petista, sequer simpatizante, mas enquanto mulher fiquei muito emocionada com a posse da presidenta.

Enquanto feminista, meu desejo seria ver uma mulher na Presidência por seus próprios méritos e carisma, o que infelizmente não ocorreu. Dificilmente, sem a presença e o apoio do ex-presidente, ela teria alcançado este posto. Acredito que tenha sido sua competência e sua distância em relação à corrupção que pesou na escolha de seu nome. Ser mulher pode ter criado, talvez, algumas hesitações.

Em termos de representação social do feminino não há dúvida de que o poder nas mãos de uma mulher modifica o imaginário social. É este que constrói e institui relações de gênero nas práticas sociais. A existência de gêneros em uma formação social é uma construção: ser mulher ou homem em cada sociedade carrega um sem número de significados, que compreendem comportamentos, imagens, papéis, funções, hierarquias. Em sociedades patriarcais como o Brasil, a “verdadeira mulher” deve encarnar a fragilidade, a doçura, a dependência, a sensibilidade; em termos de comportamento, precisa ser bela, sedutora, sua posição se atrela ao casamento e à maternidade, sem a qual nenhuma mulher poderia ser completa. Seu domínio seria o âmbito privado, a domesticidade, a família.

Dilma Rousseff contorna estas características. É um sujeito social de ação, um sujeito político, no amplo leque de significados desta palavra: sua imagem é de força, de autoridade, o governo lhe é habitual, sua voz é grave e intensa, espelha a diversidade do ser mulher. Modifica a imagem do feminino e ao se afirmar como mulher, várias vezes, apresenta um modelo em que as mulheres podem se identificar, cujo lugar de fala e de ação é de poder.

Há anos o feminismo vêm agindo para o empoderamento das mulheres. A imagem de uma mulher presidenta age mais que um milhão de palavras. Cresce sua auto-estima, pois as mulheres brasileiras ouviram muito bem quando Dilma Rousseff afirmou: “ Nós podemos”. A representação social do feminino tende a se modificar: as mulheres tem um exemplo de ação, poder e autoridade, dando-lhes segurança em sua posição na sociedade. E os homens enxergam uma mulher em posição pública de autoridade máxima, nunca antes por eles imaginada. Assim, no imaginário social a dominância do masculino nas relações sociais deixa de ser “natural”.

As mulheres não mais se sentirão confinadas ao privado: duas mulheres desfilando no carro presidencial, uma mulher chefe suprema das forças armadas e da nação, o símbolo da Presidência em seu peito são imagens para sempre gravadas no imaginário social. Aliás, o fato de ser mulher foi pouquíssimo discutido na mídia, pois de fato ela governou o Brasil enquanto o ex-presidente passeava.

Nestas perspectivas, Dilma Rousseff, presidenta, modifica em segundos uma imagem do feminino forjada em séculos. Nada mais positivo.

Os aspectos negativos de sua ascensão ao poder enquanto mulher?A priori nenhum. Mas as dificuldades são claras: as exigências dos partidos, a corrupção e, sobretudo, o fantasma do ex-presidente que se prepara para, em breve, vir assombrá-la. Os machistas de plantão estão acostumados com ela, suas exigências, sua intolerância com a incompetência, mas serão os primeiros a gritar que, se algo der errado, é porque a presidenta é uma mulher. No mais, quem viver, verá!

(*) Tânia Navarro Swain é professora do Departamento de Históira, da Universidade de Brasília. Possui graduação em História-Bacharelado e Licenciatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, pós-doutorado nas Universidade de Montréal e Québec à Montréa, doutorado em Sociétés Latino-américaines-Universite de Paris III (Sorbonne-Nouvelle) e mestrado em História da América Latina - Université de Paris X, Nanterre. Áreas de atuação e pesquisa: epistemologia feminista, sexualidade, gênero, história das mulheres, teoria e metodologia da história.

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