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Capital

Nas palavras da pastora, a memória do incêndio que matou menina de 3 anos

Para a dona da casa, o incêndio foi criminoso. O autor seria seu ex-marido, que já teria ameaçado a mãe da menina de 3 anos

Geisy Garnes | 28/09/2018 19:42
A sala de visitas em que o incêndio começou ficou completamente destruída (Foto: Paulo Francis)
A sala de visitas em que o incêndio começou ficou completamente destruída (Foto: Paulo Francis)

O incêndio em uma das casa da Rua Aurélio Leonardo de Souza, no Bairro Center Park, matou N. A. no dia do seu aniversário de três anos. Ali também estavam outras três pessoas que viveram longos minutos de agonia e desespero. Enquanto se recupera, R. A. M., de 40 anos, a dona da casa incendiada, resolveu quebrar o silêncio e contar o que de fato aconteceu naquele 26 de setembro.

Por telefone R. lembrou dos momentos de desespero, de cegueira pela fumaça e da dor. Na manhã daquela quarta-feira, ela e P. ouviram ainda nas primeiras horas do dia o barulho de telhas quebradas, mas não o suficiente para fazer com que eles levantassem. Minutos depois, as duas mães e as duas crianças de viram em meio ao incêndio.

O fogo começou na sala de visita, que ficou destruído. Com a casa inteira fechada, a fumaça se espalhou por todos os outros cinco cômodos do imóvel. “Era um fumaceiro, escureceu tudo, não conseguimos abrir a porta de blindex”, detalhou R..

Com a voz rouca, resultado da fumaça que inalou, ela lembra de P. procurar pela filha, que gritava. As duas não se encontraram, ferida, a mulher de 29 anos pulou pela janela para escapar das chamas, logo depois que as duas amigas tiraram a filha de pastora, uma menina de 11 anos, da casa.

R. conta que foi a última a sair, enquanto ouvia a criança gritar, corria pelos cômodos da casa na tentativa de encontrá-la. “A N. parou de gritar, eu vim para cozinha, eu estava começando a desfalecer e senti que o botijão ia explodir, então pulei a janela”, lembrou.

Do lado de fora, os vizinhos começavam a chegar. Três deles pularam o muro para ajudar as mulheres. A porta de vidro foi quebrada e uma mangueira usada para apagar as chamas, mas ninguém conseguiu tirar a menininha de 3 anos. Quando o Corpo de Bombeiros chegou, N. foi resgatada, mas não resistiu, teve as vias áreas queimadas pela fumaça.

As três sobreviventes foram levadas para Santa Casa. As duas mulheres com o estado de saúde mais grave. R. também com as vias aéreas queimadas, P. com queimaduras e problemas respiratórios.

Mesmo sem poder deixar o hospital e abandonarem mesmo que por algumas horas o tratamento médico, elas saíram nesta manhã para enterrar N.. “O enterro foi dramático. A família da N. quer justiça”.

As vítima conseguiram sair da casa pela janela (Foto: Paulo Francis)
As vítima conseguiram sair da casa pela janela (Foto: Paulo Francis)
Segundo a moradora, a casa estava sem energia (Foto: Paulo Francis)
Segundo a moradora, a casa estava sem energia (Foto: Paulo Francis)

Ameaças e perseguição - Para R. a tragédia foi resultado de um crime. O principal suspeito - que terá o nome preservado para não atrapalhar as investigações - entrou na vida da pastora há quatro anos, mas os anos de convivência revelaram um homem violento. Aos poucos ela foi descobrindo um histórico de agressões contra outras mulheres, até também se transformar em vítima.

“Ele me agrediu, meu nariz sangrou, e os vizinhos denunciaram”, lembrou. R. pediu a separação, mas encontrou um homem irredutível. O suspeito “saiu de casa”, mas na verdade nunca deixou de ir ao local. “Ele tem a chave e fica entrando aqui a hora que quer”, destacou a pastora, que em uma das ocasiões foi obrigada a manter relação sexual com o ex-marido.

No dia 4 de agosto a pastora diz ter vivido momentos de tensão, quando foi perseguida por 40 minutos pelas ruas de Campo Grande. As agressões também vieram de outras formas. A mulher viu as roupas serem destruídas pelo suspeito, um prejuízo de R$ 2,5 mil, teve objetos levados, sem contar o carro e uma chácara compradas por ela e que acabaram nas mãos do ex.

Em meio a tudo isso, a pastora contratou P. como secretária. A situação então se agravou, e a funcionária passou a ser ameaçada pelo suspeito, segundo ela porque a mãe da menina de 3 anos conhecia o ex-marido de R. e “sabia de rolos dele”.

“Ela dormiu aqui em um dia chuvoso e acordou com os cabelos cortados e ele tirando foto dela. Ela está sem um documento, ele deixou o dinheiro que estava na carteira, mas levou os documentos”, contou a pastora.

Segundo a amiga, P. ainda foi perseguida pelo autor três vezes, em uma ele a ameaçou. O caso foi parar na delegacia e um boletim de ocorrência foi registrado contra o homem, que trabalha como auxiliar de coordenação em uma escola. O ápice das violências, segundo a mulher, foi o incêndio que tirou a vida de uma menina de 3 anos.

“A perícia falou que foi curto-circuito, mas não tinha nada ligado na sala”, reforçou a dona da casa. Naquele dia a casa estava sem energia e apenas a geladeira era alimentada por uma extensão ligada a casa de um dos vizinhos. “A extensão está perfeita e a geladeira tá funcionando normalmente”.

Enquanto a hipótese de curto-circuito é a “principal linha de investigação” da 2ª Delegacia de Polícia Civil, R. reforça que o incêndio foi criminoso, que as ameaças do ex-marido são conhecidas de todos os moradores. “A família de N. quer justiça”, falou, mais uma vez antes de voltar aos tratamentos. 

Residência ficou parcialmente destruída (Foto: Paulo Francis)
Residência ficou parcialmente destruída (Foto: Paulo Francis)
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