ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
ABRIL, DOMINGO  28    CAMPO GRANDE 31º

Capital

STXBP1: o erro genético e de difícil diagnóstico no tortuoso caminho de Otávio

Aos 3 anos e 8 meses, Otávio não anda, não fala e tem problemas motores e cognitivos

Silvia Frias | 02/06/2022 16:14
Otávio durante sessão de fisioterapia: luta diára para pequenos progressos. (Foto: Divulgação)
Otávio durante sessão de fisioterapia: luta diára para pequenos progressos. (Foto: Divulgação)

Até os 9 meses de idade, o desenvolvimento de Otávio parecia seguir o de qualquer criança saudável. Foi a mãe, a autônoma Luana Kolschraiber, 23 anos, que notou os primeiros sinais de que havia algo errado com desenvolvimento dele e, graças à insistência e perseverança dela, descobriu erro genético raro e pouco mapeado no mundo.

O menino hoje tem 3 anos e 8 meses e é totalmente dependente: não anda, não fala e apresenta atraso no desenvolvimento motor e cognitivo. A luta da família que mora em Campo Grande, no Bairro Chácara das Mansões, é diária, com sessões de fonoaudiologia, fisioterapia, hidro e terapia ocupacional, vivência que Luana quis divulgar para que a singularidade do caso de Otávio possa ajudar outras mães que estão em busca de diagnóstico para quadro clínico semelhante.

“Ele nasceu perfeito”, lembra Luana. Otávio veio ao mundo no dia 9 de agosto de 2018, com 52 centímetros e 4,2 quilos, na Santa Casa de Campo Grande. A jovem contou ao Campo Grande News que fez o pré-natal e os exames não mostraram qualquer anomalia.

Otávio tem 3 anos e 8 meses: "é um bebê". (Foto: Marcos Maluf)
Otávio tem 3 anos e 8 meses: "é um bebê". (Foto: Marcos Maluf)

Com o passar do tempo, notou que ele tinha desenvolvimento lento, se comparado com o que observou do crescimento da primeira filha, Ana Luiza, à época, com 3 anos. “Otávio não pegava brinquedos, eu chacoalhava, ele até olhava, mas não tinha intenção de pegar”, diz. Foi até o pediatra e relatou o caso, perguntando: “Não é estranho?”

Ouviu como resposta que a lentidão se devia ao fato de Otávio ser gordinho e preguiçoso. “Todo mundo falava que eu tava louca, que era coisa da minha cabeça”, conta.

Com 9 meses de idade, o quadro não avançou. “Ele continuava molinho, não pegava brinquedo, foi muito estranho”. Voltou ao pediatra, insistiu no exame e a criança foi submetida a ultrassonografia da transfontanela (ultrassom na “moleira” para avaliar estruturas cerebrais). Novamente, nada anormal foi detectado.

Otávio chegou ao primeiro ano de vida quase na estaca zero. Apesar do crescimento parecer regular, não apresentava desenvolvimento motor ou cognitivo. Luana procurou neurologista e a profissional começou a investigar.

Eduardo e Luana (pais) e a irmã, Ana Luiza com Otávio (Foto: Marcos Maluf)
Eduardo e Luana (pais) e a irmã, Ana Luiza com Otávio (Foto: Marcos Maluf)

Novo exame identificou epilepsia focal. Os questionamentos continuavam, já que Otávio nunca tinha sofrido convulsão. A ressonância magnética também identificou atrofia no cérebro. “Foi um choque muito grande para mim, para o pai dele, foi um tempo de luto muito grande, jamais imaginei que era problema tão grave.”

A identificação dos danos não significou a solução. De acordo com Luana, a neurologista descartou atrofia muscular ou AME (Atrofia Muscular Espinhal), mas não conseguia identificar a doença.

“Foi agoniante, viver sem saber o que ele tinha”, contou a mãe. Sem diagnóstico fechado, Otávio passou a ser atendido com equipe multidisciplinar, passando por fisioterapia, hidroterapia, fono e terapia ocupacional. “Ele não regrediu, mas não andava, não sentava, muito molinho, não sustentava pescoço”, diz.

Otávio com os avós Adolfo e Sila. (Foto: Marcos Maluf)
Otávio com os avós Adolfo e Sila. (Foto: Marcos Maluf)

Enquanto isso, a investigação continuava e descartando lista de síndromes. “Toda vez que abria campo de apuração, era muito choro, muita dor”. Segundo Luana, a anormalidade encontrada no cérebro não poderia justificar o nível de atraso no desenvolvimento da criança.

Erro - Em outubro de 2021, Luana conta que decidiu procurar outros profissionais e chegou à clínica de neurologia pediátrica em Curitiba (PR). Foi pedido exame exoma, que identifica doenças genéticas e mutações. Ao custo cerca de R$ 10 mil, foi preciso fazer rifa e contar com ajuda para angariar dinheiro.

Pai, mãe e filho foram submetidos à avaliação e somente o teste de Otávio apresentou erro no DNA, especificamente no gene STXBP-1. Isso indicava não se tratar de problema hereditário e, sim, problema genético da criança.

“Foi muito difícil”, diz Luana. O erro no gene STXBP-1 está ligado a algumas síndromes já conhecidas, como a de Ohtahara, de West, de Lennox-Gastaut ou encefalopatia mioclónica, epilepsia focal migratória. Porém, no caso de Otávio, nenhum desses casos se encaixa.

Luana diz que encontrou quadros clínicos semelhantes ao de Otávio fora do Brasil, como estudos de criança com mesmos atrasos na Colômbia e instituição com banco de pesquisa em Israel. Os grupos de pais a que pertence são mistos, encontrados outras síndromes. “Tive que ir me virando, não tinha informação aqui no Brasil.”

Enquanto isso, ela e o marido, Eduardo, fazem acompanhamento de Otávio, sendo auxiliados pelos avós do menino Adolfo e Sila e pela irmã mais velha do menino, Ana Luiza, hoje, com 7 anos. As convulsões são fantasma constante, já que há relatos de que algumas crianças com o erro genético começaram a ter a partir dos 6 anos.

“Ele cresceu, tem 3 anos e 8 meses e continua um bebê”, diz Luana. Com o tratamento, Otávio consegue firmar tronco, pescoço. O raciocínio lógico ainda é lento. O menino se comunica sorrindo, gritando ou chorando. “A gente entende.”

Luana resolveu falar para servir de exemplo e ajudar outras famílias que estão em busca de diagnóstico a casos semelhantes, além de informações sobre os direitos de tratamento disponíveis no Brasil.

Também diz que o caso do filho possa ser estudado, sendo esperança. “Creio sim em um tratamento para Otávio, ele pode ser sim uma fonte de cura para outras crianças ou até para ele mesmo.”

Nas redes sociais, Luana mostra a rotina do filho no Instagram @anjootavio. Também forneceu telefone caso alguém queira mais informações (67) 99663-1083.

Nos siga no Google Notícias