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Capital

Terceirização e falta de estrutura no SUS norteiam abertura de Conferência

Flávia Lima | 21/08/2015 13:56
Conferência acontece até este sábado na Câmara de Campo Grande. (Foto:Marcos Ermínio)
Conferência acontece até este sábado na Câmara de Campo Grande. (Foto:Marcos Ermínio)
Secretário municipal de Saúde, Jamal Salém disse que processo seletivo é contínuo para suprir falta d médicos na rede. (Foto:Marcos Ermínio)
Secretário municipal de Saúde, Jamal Salém disse que processo seletivo é contínuo para suprir falta d médicos na rede. (Foto:Marcos Ermínio)

A terceirização do serviço público de Saúde e a falta de estrutura para atender, principalmente grupos sociais específicos, como pessoas com deficiências, indígenas e transexuais foram as problemáticas enfocadas durante a abertura da 7ª Conferência de Saúde de Campo Grande, evento que teve início na manhã desta sexta-feira (21) e que acontece na Câmara Municipal até este sábado (22).

Organizado pela Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública) e o Conselho Municipal de Saúde, o tema da conferência deste ano busca discutir a qualidade do serviço oferecido à população, além de questões relacionadas aos servidores públicos, como a redução da jornada de trabalho.

Participaram da abertura, representantes do Corpo de Bombeiros, servidores municipais, vereadores e o secretário municipal de Saúde, Jamal Salém. Integrantes de grupos sociais também ressaltaram a necessidade de adequação do SUS quanto ao atendimento diferenciado a determinados públicos.

De acordo com o vice-coordenador da Comissão da Conferência, Caio Aguirre, as propostas que serão abordadas durante os dois dias do evento foram retiradas de encontros e reuniões promovidas durante o mês de julho, através de conferências locais e distritais, envolvendo todas as Unidades Básicas de Saúde e Unidades Básicas de Saúde da Família.

Ele explica que no final do evento serão elencadas propostas que serão encaminhadas a conferência estadual e nacional. “O objetivo é dar voz a todos os segmentos e ao servidor, que está diretamente ligado aos problemas diários do sistema de saúde”, ressalta.

A intenção é traçar um diagnóstico das principais deficiências do Sistema Único de Saúde e estabelecer diretrizes para a construção de uma política municipal de saúde, além de fortalecer as discussões sobre formas de ampliar os serviços, oferecendo uma assistência mais humanizada

Logo na abertura, a coordenadora da conferência e conselheira municipal de Saúde, Shirley Gonçalves e o conselheiro estadual Ricardo Bueno, criticaram a possibilidade de uma terceirização do SUS, destacando a falta de transparência que ela pode acarretar ao usuário.

“Quando passamos a gerência de um serviço para a privatização, deixamos de ter acesso facilitado à informações como licitações e aplicação de recursos financeiros. Nem conseguimos saber se os equipamentos comprados são de boa qualidade porque deixamos essa responsabilidade para terceiros”, afirma Shirley.

Ela enfatizou em seu discurso que a falta de recursos financeiros anunciadas pelas gestões nem sempre correspondem à realidade. “É de responsabilidade dos gestores buscarem esses recursos de alguma foram. Temos que cobrar isso”, disse.

A conselheira lembrou que a terceirização é um tema discutido desde os anos 1990 e chegou a ser implantada no Distrito Federal, sem sucesso. “Houve muita reclamação dos usuários quanto ao acesso aos investimentos, sem falar que a estrutura não melhorou muito, o que fez o serviço retornar para as mãos do pode público”, conta.

No entanto, Shirley reconhece que o assunto deve continuar em discussão, mas não pode ser imposto. Ela acredita que a terceirização pode acontecer em alguns tipos de serviços, como nos atendimentos em hospitais, o que já foi implantado em Goiânia. “Precisamos debater o assunto e não impor uma decisão. É fundamental não perdermos o direito de reivindicar e acompanhar a aplicação dos recursos”, diz.

Problemas locais – As questões relacionadas às deficiências urgentes enfrentadas pela rede municipal de Saúde também serão abordadas nos dois dias do encontro. O conselheiro municipal Caio Aguirre destaca a falta de médicos, agravada devido a saída de vários profissionais durante a primeira greve da categoria, em maio.

Segundo Caio a demanda maior é referente a pediatras, nefrologistas e geriatras, além do atendimento básico nos setores de urgência e emergência. Dentro dessa demanda, ele inclui os atendimentos no setor de ortopedia da Santa Casa, sempre abarrotado devido aos acidentes de trânsito.

A urgência na inauguração do Hospital do Trauma é, na opinião de Caio um dos principais objetivos do setor de Saúde da Capital. “O que foi investido lá já daria para construir dois hospitais. É primordial que as gestões cumpram o prometido e entreguem essa unidade até 2016”, enfatiza.

Outra questão polêmica, lembrada por ele é quanto ao Pronto Atendimento Integrado, antigo Centro Pediátrico, localizado na Avenida Afonso Pena e que atualmente reúne atendimento ambulatorial e o centro de especialidades infantis. O prédio, que é alugado pela prefeitura, foi reprovado pela Vigilância Sanitária e por órgãos de fiscalização da própria rede pública de por não dispor de acessibilidade.

Conforme o relatório, o local não dispõe de elevadores adequados e saídas de emergência. Segundo Caio, como não é possível fazer as alterações devido a normas do contrato de locação, a saída é buscar outro prédio, o que a gestão municipal quer evitar.

O secretário de Saúde, Jamal Salém, reconhece as deficiências e demandas do sistema de saúde, mas acredita que a Conferência é uma oportunidade de dar voz aos usuários e servidores e buscar soluções para os problemas.

Quanto a falta de médicos, ele ressalta que a prefeitura realiza um processo contínuo de seleção para preencher o déficit de 300 profissionais. O secretário diz que toda semana, entre seis e dez médicos buscam a prefeitura interessados em ingressar na rede, mas como a rotativa é grande, leva tempo para suprir a defasagem.

Sobre o antigo Centro Pediátrico, ele afirma que as adaptações recomendadas são possíveis e não cogita a transferência do atendimento para outro prédio, que atende cerca de 400 crianças por dia. “A briga para tirar o centro de lá é só de um grupo de conselheiros. Investimos muito lá e não podemos pensar negativo. É possível fazer as adequações”, garante.

O secretário também adiantou que novos equipamentos para a rede municipal estão sendo adquiridos através de emendas do senador Delcídio do Amaral (PT), no valor de R$ 700 mil e dos deputados federais, Vander Loubet (PT), de R$ 1 milhão e Luiz Henrique Mandetta (DEM), no valor de R$ 800 mil.

Minorias – Se a maioria da população sofre com as deficiências do sistema, a situação é mais grave para as minorias. Na tentiva de serem ouvidos, grupos representando organizações sociais aproveitaram a presença das autoridades para reclamar do descaso que sentem quando buscam atendimento nas unidades de saúde.

A coordenadora do Comitê de Mulheres Deficientes, Mirella Ballatore Tosta, relata que em uma de suas consultas com o ginecologista, uma funcionária cobrou de Mirella a presença de uma pessoa para ajudá-la a ser posicionada na cadeira de exames. "Ela pediu para um segurança do posto me ajudar. Imagine meu constrangimento", disse.

Segundo Mirella, as unidades e postos de saúde não possuem acessibilidade adequada e cita o caso de uma mulher deficiente visual que ao chegar em um posto não teve sua cegueira percebida e os funcionários indicavam os setores que ela deveria procurar, sem prestar ajuda específica. "Temos 31 mil mulheres com deficiência na Capital, mas somos invisíveis para a sociedade", reclamou.

A mesma bandeira foi levantada pelas representante da Associação Estadual de Travestir e Transexuais, Cris Stefanny. Na sua opinião, as políticas públicas para o grupo LGBT não devem se restringir às questões relacionadas ás doenças sexualmente transmissíveis. "Não que o assunto não seja importante, mas nossas necessidades vão além. Precisamos de um atendimento adequado, que não deixe os gays e  transexuais com medo de procurar uma unidade de saúde", diz.

Ela explica que o respeito deve começar obedecendo a portaria do Ministério da Saúde que orienta o tratamento desse público pelo nome social e não o que consta no RG. "É um constrangimento enorme ouvir seu nome de registro na frente de todos", reclama.

Cris elogia iniciativa de outros estados que estão criando ambulatórios específicos para transexuais e travestis, onde eles tem atendimento com psicólogos, fonoaudiólogos, assistente social e até endocrinologistas. Na opinião de Cris Stefanny, muitas pessoas que integram o grupo de LGBT acabam se automedicando ou simplesmente não buscam os postos para um acompanhamento da saúde devido ao preconceito que sofrem. "Aqui em Campo Grande já teve até caso de um transexual que estava passando mal e teve o transporte de ambulância do Samu recusado devido a sua condição", denuncia.

Conselheiro municipal de Saúde, Caio Aguirre defende maior humanização na rede. (Foto:Marcos Ermínio)
Conselheiro municipal de Saúde, Caio Aguirre defende maior humanização na rede. (Foto:Marcos Ermínio)
Mirella Tosta diz que pessoas com deficiência são invisíveis à sociedade. (Foto:Flávia Lima)
Mirella Tosta diz que pessoas com deficiência são invisíveis à sociedade. (Foto:Flávia Lima)
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