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Capital

Versão de confusão vence e Tribunal arquiva denúncia contra procurador

Esposa de procurador perdeu controle da direção e atropelou idosa, que morreu na hora. Carro foi retirado do local por policial da assessoria militar do Ministério Público

Aline dos Santos | 21/02/2019 12:37
Momento em que homem tira carro de local de acidente.  (Foto: André Bittar/Arquivo)
Momento em que homem tira carro de local de acidente. (Foto: André Bittar/Arquivo)

Por unanimidade, o TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) determinou ontem (dia 20) o arquivamento e extinção de procedimento investigatório criminal por fraude processual no trânsito contra o procurador Gilberto Robalinho da Silva e o policial Francisco Ferreira Filho.

Desta forma, prevaleceu a tese de que a retirada do veículo da esposa do procurador, que tinha acabado de se evolver num acidente fatal, foi por confusão. O procedimento é marcado por mudanças de versão do policial, que removeu o carro antes de passar por perícia.

O acidente fatal foi em 13 de setembro de 2017, no cruzamento das ruas José Nogueira Vieira com a Maria do Carmo Ferro, no bairro Tiradentes, em Campo Grande. Conforme testemunhas, Cirlene Lelis Robalinho, esposa do procurador, conduzia um Fiat Uno, quando perdeu o controle da direção, invadiu a calçada e atropelou Verônica Fernandes, 91 anos. Ela morreu na hora.

Paralelo aos procedimentos normais de um acidente com morte no trânsito, o Campo Grande News testemunhou a revolta de familiares porque o carro foi retirado do local. Na ocasião, equipe de reportagem presenciou o momento em que o marido da condutora ordenou que um homem que estava com ele removesse o Fiat Uno, mesmo antes da chegada da polícia de trânsito e da perícia.

Primeiro, a fraude processual no trânsito, prevista no artigo 312 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro), começou a ser apurada pela 4ª Delegacia de Polícia Civil. Depois, o inquérito foi avocado pelo procurador-geral de Justiça, Paulo Cezar dos Passos, por se tratar de membro do MP/MS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul).

Após o acidente, havia três veículos ligados à família Robalinho no local. O Fiat Uno da esposa do procurador, uma caminhonete em que ele foi ao local e um Golf da filha do procurador. Robalinho acionou a assessoria militar do MP/MS e policiais foram ao bairro Tiradentes.

Robalinho (camisa branca, ao centro) foi a local de acidente no bairro Tiradentes. (Foto: André Bittar/Arquivo)
Robalinho (camisa branca, ao centro) foi a local de acidente no bairro Tiradentes. (Foto: André Bittar/Arquivo)

Em depoimento no dia 14 de setembro, data seguinte ao acidente, na PGJ (Procuradoria-Geral de Justiça), o primeiro sargento Francisco Ferreora Filho disse que o procurador lhe entregou a chave do veículo Golf, com pedido que levasse o carro ao Ministério Público.

Diante dos ânimos exaltados dos populares e da família, que não aceitava o pedido de desculpas do procurador, ele foi aconselhado pela assessoria militar a sair do local. Antes, Robalinho pegou a chave do Golf com Francisco e entregou a de outro veículo. A ordem foi “leva o carro embora”. Então, ele deduziu que era para levar o veículo ao Ministério Público.

Na sequência, o policial ouviu que as pessoas queriam atear fogo ao carro. Apertando o alarme, identificou o carro que deveria levar e saiu com o veículo. Na ocasião, disse acreditar que o Golf estava envolvido no acidente, mas, mesmo sabendo da ilicitude da conduta, iria cumprir a ordem. Posteriormente, num IPM (Inquérito Policial Militar), Francisco disse que atuou mais como motorista e desconhecia que retirar o carro era fraude processual no trânsito.

A entrada do carro na sede da Procuradoria Geral de Justiça não foi cadastrada. Mas o servidor da guarita informou que o veículo entrou no local, entre 14h e 15h, conduzido pelo policial, que disse se tratar de carro do procurador Robalinho. O Fiat Uno ficou na sede do MP/MS por meia hora. Questionado do paradeiro do carro por um colega da assessoria militar, Francisco levou o veículo para a Polícia Civil.

Em outro relato, o policial disse que agiu por conta própria, para evitar a depredação. O procurador Gilberto Robalinho da Silva informou que não determinou ou anuiu com a retirada do veículo.

Órgão Especial do Tribunal de Justiça fez sessão na quarta-feira. (Foto: Guilherme Henri)
Órgão Especial do Tribunal de Justiça fez sessão na quarta-feira. (Foto: Guilherme Henri)

Contraindícios – Conforme Paulo Passo, apesar de ter existido indício de que o procurador teria determinado a retirada do veículo do local do fato (consistente na entrega das chaves do veículo), certo é que, com a colheita dos citados elementos informativos no curso do procedimento investigatório criminal, restaram evidentes inúmeros contraindícios.

Conforme o MP/MS, nenhuma das pessoas inquiridas ouviu Robalinho dar a ordem de retirar o carro. O procurador ligou para o delegado-geral da Polícia Civil para pedir agilidade da perícia, que ainda não tinha chegado ao local, portanto, não queria evitar o procedimento.

Ainda conforme Passos, o policial retirou o veículo pela ameaça de depredação e que os vestígios do acidente ainda estavam no carro quando entregue à polícia, portanto, sem intenção de prejudicar a investigação.

Conforme o procurador-geral, embora o sargento Francisco Ferreira Filho tenha afirmado, em um de seus depoimentos, que recebeu as chaves do veículo e a determinação do procurador de Justiça para que retirasse o automóvel do local, no mesmo depoimento esclareceu que pode ter feito confusão, acreditando que deveria levar o segundo veiculo ao Ministério Público. Passos pediu o arquivamento e a solicitação foi acolhida pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça.

Trecho do pedido de arquivamento que relata confusão.
Trecho do pedido de arquivamento que relata confusão.

Acidente – A condutora Cirlene Lelis Robalinho disse à polícia que teve um mal súbito. O processo por crime de trânsito tramita na 3ª Vara Criminal de Campo Grande. A juíza Eucélia Moreira Cassal negou absolvição sumária e marcou audiência de instrução e julgamento para o mês de abril.

Na denúncia, a promotoria informa que ela estava ao celular no momento do acidente. Já laudo pericial apresentado pela defesa aponta que a vítima já estava em desequilíbrio e na pista de rolamento quando foi atingida pelo carro. O documento destaca que não houve dano frontal no veículo.

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