MPF diz que União é responsável por conflito entre fazendeiros e índios em MS
Na outra ponta do processo, Funai admite ter estrutura insuficiente no Estado

O MPF (Ministério Público Federal) deve pedir, por meio de ações civis públicas, que a Justiça Federal responsabilize o Estado brasileiro pela situação dos cerca de 50 mil índios Guarani Kaiowá que vivem em Mato Grosso do Sul.
A informação é do procurador da República em Dourados, Marco Antonio Delfino de Almeida, que informou que planeja entrar com as primeiras ações em janeiro do ano que vem.
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Os processos podem, entre outros desdobramentos, obrigar a União a acelerar o processo de demarcação de novas reservas.
"Isso vai demandar tempo porque, para não sermos levianos, vamos precisar de laudos técnicos que comprovem os prejuízos em cada um dos casos. E também porque apenas dizer que os índios foram prejudicados é muito pouco", declarou Almeida, revelando que o levantamento de informações para comprovar a exata dimensão dos prejuízos causados aos Guarani Kaiowá já foi iniciado.
"Cada comunidade tem um histórico de violência e de mazelas decorrentes desse processo de confinamento, como a desnutrição infantil e a violência. É importante caracterizar como a União contribuiu para isso em cada um dos casos", afirma o procurador.
Para Almeida, a União não apenas tem sido omissa em relação ao conflito fundiário causado pelo estímulo à produção agropecuária no Centro-Oeste, como, inicialmente, contribuiu para que a situação chegasse ao ponto que chegou.
Segundo o procurador, durante as primeiras décadas do século 20, a pedido de fazendeiros recém-chegados ao estado, onde adquiriam, legalmente ou não, terras, a União passou a remover os índios de seus territórios tradicionais. Eles foram concentrados em reservas, liberando as demais áreas para a agropecuária. "Um processo semelhante à formação de guetos de judeus" que, segundo o promotor, resultou na disputa fundiária que já se arrasta há décadas, provocando não só prejuízos aos índios, mas também um clima de insegurança jurídica que prejudica o próprio setor produtivo.
Funai ineficiente - Entre os atores envolvidos na complexidade do assunto, a própria Funai (Fundação Nacional do Índio) admite ter estrutura insuficiente para lidar com o conflito fundiário em Mato Grosso do Sul. A afirmação é da coordenadora regional do órgão em Dourados, Maria Aparecida Mendes de Oliveira.
“A demanda de trabalho é muito grande. Mesmo nas oito reservas indígenas já demarcadas no estado, que abrigam uma grande população, há vulnerabilidade social. E nas áreas menores, onde a densidade demográfica acaba sendo muito alta [devido ao número de habitantes em relação ao tamanho da área], há guetos habitados por uma população étnica desassistida pelo Estado brasileiro, o que leva a um grau de fragilidade muito alto", disse Maria Aparecida durante a visita de integrantes da Comissão de Direitos Humanos e Minorias e da Frente Parlamentar Pelos Povos Indígenas ao estado, no último final de semana.
“Por isso é importante a vinda dos parlamentares à região. Abrir espaço para ouvir quem vivencia esta situação de conflito é fundamental e permite aos nossos representantes sentir de perto e compreender a situação que os índios vivenciam. E também a fragilidade da própria Funai neste momento de conflito e tensionamento”, declarou a coordenadora.
Para ela, os índios são vítimas da miséria, fome e preconceito, o que influi na violência interna e aumento da população carcerária indígena. “Há uma lentidão por parte da Justiça para julgar os culpados pelas mortes dos índios [vítimas do conflito fundiário que se arrasta há décadas]. A cada nova ocorrência é aberto um inquérito policial. Alguns avançam, mas, de 28 processos judiciais, apenas dois foram a júri”, lembrou a coordenadora, referindo-se aos casos de Marçal de Souza e de Marcos Veron.
*Com informações da Agência Brasil