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Aposentadoria pelo INSS e a exoneração do cargo público

Dr Henrique Lima | 23/01/2019 09:00
Aposentadoria pelo INSS e a exoneração do cargo público

É frequente a seguinte indagação: aposentei pelo INSS e fui “exonerado” do cargo público, isso está certo?

Não, não está. Mas por que acontece com tanta frequência?

A confusão decorre, principalmente, da previsão da Constituição Federal que veda o recebimento simultâneo de proventos de aposentadoria e de remuneração de cargo, emprego ou função pública (par. 10, art. 37, CF). Já o Estatuto dos Servidores Públicos Federais (que é parcialmente copiado em muitos Estados e Municípios), ao regulamentar essa disposição constitucional, estabelece que a aposentadoria implica em vacância do cargo (VIII, art. 33, Lei 8.112/90). É assim que, por vezes, o servidor aposentado pelo INSS é exonerado do cargo público.

Entretanto, a questão não é tão simples. Em primeiro lugar, devemos indagar: por que o servidor público se aposenta pelo INSS? Esse problema surge quando se trata de um município que não possui regime próprio de previdência (RPPS) e, por isso, seus servidores são vinculados ao regime geral de previdência social (RGPS - INSS). Para se ter uma ideia da quantidade de municípios nessa condição, os números aproximados são: 27 no Mato Grosso do Sul (34% do total); 39 no Mato Grosso (27% do total) e 232 no Paraná (58% do total). No Brasil, são mais de 3.500 municípios sem RPPS (cerca de 62,8% do total).

Os servidores dos municípios sem regime próprio de previdência social (RPPS), portanto, acabam sendo bastante prejudicados em algumas situações como, por exemplo, a não paridade com os servidores da ativa, a limitação da aposentadoria ao teto estabelecido pelo INSS – fato este que pode causar grande prejuízo, cabendo-lhes ingressar com ação pedindo a complementação –, dentre outras.

O que venho tratar aqui, especialmente, é sobre a situação do servidor público vinculado a um município que não possui RPPS, caso em que, por óbvio, pedirá sua aposentadoria junto ao INSS, mas que mesmo após aposentado, pretende continuar ocupando seu cargo público em contrapartida. Nesses casos, ao descobrir que o servidor teve a aposentadoria concedida pelo INSS, é provável que a Administração Pública busque meios para exonerá-lo.

Em algumas situações – como aconteceu com um grupo do interior do Tocantins que atendi recentemente –, os servidores são pressionados a assinar uma carta “pedindo” exoneração sob a ameaça de que, se não o fizerem, serão obrigados a devolver para a administração pública municipal as remunerações recebidas após a aposentadoria. Um verdadeiro absurdo.

Em outro caso, no interior do Mato Grosso do Sul, houve dezenas de servidores exonerados por estarem aposentados pelo INSS, acontecimento que se revelou ser apenas uma desculpa, já que a verdadeira motivação foi o fato de o prefeito ter “estourado” todos os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal e, por isso, achou que esta seria a “grande” solução para seus problemas.

Logo, o debate jurídico ocorre porque a Administração Pública só pode fazer o que está previsto em lei (princípio da estrita legalidade) e, nesse sentido, o parágrafo 10 do artigo 37 da CF diz que: “É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.”

Ora, a Constituição Federal só veda o recebimento simultâneo nos casos de aposentadoria pelo Regime Próprio de Previdência (RPPS – art. 40), ou quando envolver os militares dos Estados e do Distrito Federal (art. 42), ou os militares das Forças Armadas (art. 142).

Em outras palavras, a Constituição Federal não restringiu a percepção simultânea da remuneração devida aos servidores – como contraprestação por seu labor – com a aposentadoria eventualmente recebida do INSS (RGPS) – como consequência das contribuições que fez ao longo da vida.

Vale ressaltar que não se trata de uma “falha” da Constituição, pois, na verdade, não há qualquer motivo para vedar a percepção concomitante nesse caso, uma vez que são fontes pagadoras distintas (município e INSS).

Portanto, os servidores que sofreram semelhante afronta ao seu direito, com a declaração de vacância de seu cargo ou mesmo com sua exoneração após passar a receber aposentadoria perante o INSS (RGPS), devem buscar orientação jurídica a respeito, pois, além da reintegração ao cargo, ainda possuem direito a todos os valores (remunerações, benefícios etc.) que deixaram de receber no período em que estiveram afastados do serviço público em decorrência da arbitrariedade cometida pelo Administrador Público.

Aposentadoria pelo INSS e a exoneração do cargo público

Advogado (www.henriquelima.com.br)

Mestre em direito pela Universidade de Girona – Espanha e pós-graduado em Direito Constitucional, Civil, do Consumidor, do Trabalho e de Família. Autor de livros e artigos, jurídicos e sobre temas diversos. Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/5217644664058408.

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