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Em Pauta

Dos alquimistas aos químicos

Mário Sérgio Lorenzetto | 27/11/2018 12:40
Dos alquimistas aos químicos

A química como ciência séria e respeitável surgiu em 1661, quando Robert Boyle, de Oxford, publicou "The sceptical chymist" (O químico cético) - a primeira obra a distinguir os químicos dos alquimistas. No entanto, essa transição foi lenta e irregular. Até o século XVIII, os estudiosos conseguiam se sentir estranhamente à vontade nos dois campos. O exemplo mais conhecido desse "viver em dois mundos antagônicos" - química e alquimia - é dado por Johann Becher. Ele produziu uma obra irrepreensível sobre mineralogia, mas também estava convencido de que poderia se tornar invisível.
Talvez nada exemplifique melhor a natureza estranha e muitas vezes acidental da ciência química que a descoberta de um alemão chamado Hennig Brand, em 1675. Ele convenceu-se de que o ouro poderia ser destilado da urina humana. Começou recolhendo cinquenta baldes de urina humana, que manteve durante meses em seu porão. Converteu a urina primeiro em uma pasta venenosa e depois em uma substância maleável e translúcida. Claro que nada daquilo produziu ouro. Mas, após algum tempo, a substância começou a brilhar. Além disso, quando exposta ao ar, muitas vezes entrava em combustão espontaneamente. A urina queimava.

Dos alquimistas aos químicos

A grande fábrica de fósforos.

O potencial comercial da urina que queima - que logo se tornou conhecida como "fósforo" (do grego e latim: que traz a luz) - não passou despercebido a homens de negócio, mas as dificuldades de fabricação tornavam cara demais sua exploração. Uma onça (28 gramas) de fósforo custava, no varejo, seis guinéus (quinhentos dólares). Era mais caro que o ouro.
No início da fabricação do fósforo, soldados foram solicitados a fornecer a matéria-prima, mas esse esquema não era propício à produção em larga escala. Na década de 1750, um sueco chamado Karl Scheele descobriu um meio de fabricar fósforo em grande quantidade sem a sujeira ou o cheiro da urina. Devido a essa técnica, a Suécia se tornou, e permanece, o maior produtor de palitos de fósforo do mundo.

Dos alquimistas aos químicos

O Indiana Jones da química.

Scheele foi um sujeito extraordinário e extraordinariamente azarado. Farmacêutico pobre, desprovido de aparelhagem avançada, descobriu oito elementos: cloro, flúor, manganês, bário, molibdênio, tungstênio, nitrogênio e oxigênio. Uma façanha típica de Indiana Jones, impossível de ser repetida. Todavia, Scheele não ficou com a fama de descobrir nenhum desses elementos. Suas descobertas passaram despercebidas, ele não fez alarde de nenhum desses elementos.
Mas Scheele não ficou "apenas" com a descoberta de tantos elementos. Foi ele quem descobriu a amônia, a glicerina e o ácido tânico. Também foi o primeiro a ver o potencial do cloro como branqueador. Descobertas revolucionárias que o tornariam o homem mais rico do planeta em todos os tempos. Mas não foi isso que ocorreu.
Scheele tinha um (mau) hábito curioso. Insistia em provar uma pitada de todas as substâncias com que trabalhava. E o hábito matou o químico. Em 1786, aos 43 anos de idade, foi encontrado morto em sua bancada de trabalho. Estava cercado por tantas substâncias tóxicas - fatais - que não souberam dizer qual delas o matou.
Se o mundo fosse justo e o idioma sueco predominasse, Scheele desfrutaria da aclamação universal. Em vez disso, a fama ficou com uma maioria de químicos de língua inglesa. Scheele descobriu o oxigênio em 1772, quem levou a fama foi Joseph Priestley, em 1774. O cloro, como dissemos, é descoberta de Scheele, mas a fama foi para Humphry Davy 36 anos depois. Com Scheele, os grandes descobridores aprenderam uma lição: não basta descobrir ou inventar, têm de divulgar e se associar com os ricos para colocar a descoberta no mercado.

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