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Economia

Ambulantes desistiram de carteira assinada para lotar calçadas do Centro

Prefeitura estima que haja cerca de 100 vendedores ambulantes na região central de Campo Grande

Tatiana Marin | 25/04/2019 09:43
Vendedores, ditos ambulantes, ocupam as calçadas do centro de Campo Grande. (Foto: Tatiana Marin)
Vendedores, ditos ambulantes, ocupam as calçadas do centro de Campo Grande. (Foto: Tatiana Marin)

Alguns deles aparecem cedinho para vender salgados e quando a maioria das lojas abre no Centro, já foram embora. Outros começam bem depois, lá pelas 9 horas e vão embora no final da tarde. Entre os vendedores ambulantes que voltaram a ocupar as ruas centrais há vendedores de frutas, artesanatos, salgados e produtos diversos. Em comum, eles têm a informalidade e boa parte garante que está ali por opção.

O desemprego afeta mais de 13 milhões de brasileiros e pode contribuir para o cenário, mas estes profissionais, autônomos, como alguns fazem questão de frisar, dizem que escolheram as vendas e “vão muito bem, obrigado”. Não pensam em procurar um emprego com carteira assinada. “Prefiro trabalhar para mim mesmo”, justificam. 

Pelas ruas do centro, na manhã do dia 24 de abril, a reportagem conseguiu visualizar cerca de 40 vendedores no perímetro que compreende as ruas 13 de Maio a 14 de Julho, entre Afonso Pena e Dom Aquino. Somente na Afonso Pena, na calçada da Praça Ary Coelho, haviam 16, entre estes, a maioria de hippies vendendo artesanatos.

Dona Izeni vende salgados até o comércio abrir as portas. (Foto: Marina Pacheco)
Dona Izeni vende salgados até o comércio abrir as portas. (Foto: Marina Pacheco)

Histórias - Dona Izeni Menino de Queiroz, de 53 anos, largou o emprego de doméstica há 16 anos, para se juntar ao marido, que dois anos antes já havia desistido da CLT para vender salgados. “A gente trabalha muito, mas o resultado é melhor”, ressalta. Com a renda criou os filhos e pagou faculdade.

Antes do comércio abrir, atendendo as pessoas a caminho do trabalho, dona Izeni e o marido ficam em diferentes pontos - ela na Afonso Pena e ele logo ali na 13 de Maio -, mas somente até a abertura das portas. “Comércio abriu, tem que circular”.

No outro lado da Afonso Pena, seu Algeu Vaz, de 54 anos, vendia seus produtos na antiga rodoviária, mas quando o transbordo dos ônibus intermunicipais mudou-se para o novo prédio na saída para São Paulo, ele passou a trabalhar no centro. Ficava na 15 de Novembro e em outros pontos, até fixar sua banca próximo à Praça Ary Coelho.

Seu Algeu prefere trabalhar por conta própria para ter tempo e cuidar da esposa doente. (Foto: Marina Pacheco)
Seu Algeu prefere trabalhar por conta própria para ter tempo e cuidar da esposa doente. (Foto: Marina Pacheco)

Ele conta que como precisa frequentemente auxiliar a esposa que sofre de câncer, não consegue cumpri horários. “Tenho que ter tempo. Às vezes tenho que desmontar tudo e sair para levar ela no médico”, relata. Das 6h até por volta das 17h30 na rua, as vendas garantiram, e garantem ainda hoje, o sustento da família.

A renda de Edson Vital, de 46 anos, vem da venda de água de coco no cruzamento da Afonso Pena com a 14 de Julho. Antes de comprar o carrinho, vendia títulos de capitalização, também pelas ruas do Centro. “Passei a trabalhar para mim”, diz o vendedor que consegue lucro de até R$ 2.500,00.

Seu João vende frutas no centro há 43 anos e garante que tem Alvará. (Foto: Tatiana Marin)
Seu João vende frutas no centro há 43 anos e garante que tem Alvará. (Foto: Tatiana Marin)

Em frente, na outra esquina, seu João Vicente Ferreira, de 59 anos, ganhou a vida vendendo frutas. “Não tive chance de estudar, aquela época era difícil”, relembra. Há 43 anos no ponto, ele faz questão de mencionar que possui alvará e não tem problemas com fiscalização da Prefeitura e, segundo ele, há vendedores que comercializam frutas, churros e garapa tem permissão para a atividade.

A esposa de seu João, com quem tem 4 filhos - todos crescidos, criados e casados, ressalta ele -, também vende frutas no centro, atividade que sempre os manteve. “Vendo todas as frutas aqui, agora é época de caqui”.

Marcos Vinícius vende doces para ajudar a família. (Foto: Tatiana Marin)
Marcos Vinícius vende doces para ajudar a família. (Foto: Tatiana Marin)

Diferente da característica da maioria dos vendedores que já tem os filhos criados, Marcos Vinícius dos Santos, de 17 anos, é o filho que ajuda a família. Ele cursa o 1º ano do ensino médio em uma escola das Moreninhas e durante o dia vende doces no centro, já que o benefício da mãe, afastada pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), foi interrompido. “Ela tem um problema no braço por causa de um acidente onde ela trabalhava como faxineira, mas ela vai voltar a receber”, diz ele se referindo ao processo de perícia pelo qual passam os beneficiários.

O adolescente chega por volta das 8h da manhã e fica “até quando dá”. Ele faz curso de informática na escola e treina esportes antes das aulas começarem, às 19. Por enquanto, ele não almeja cursar o ensino superior e pretende seguir carreira no exército ou trabalhar no comércio.

Gabriel é um dos artesãos na calçada da Afonso Pena. (Foto: Tatiana Marin)
Gabriel é um dos artesãos na calçada da Afonso Pena. (Foto: Tatiana Marin)

Gabriel Marques de Souza, de 36 anos é um deles. Vivendo “da sua arte” há 20 anos, ele conta que também já trabalhou diversas posições como pintor e com manutenção de ar condicionado. “Todo trabalho assalariado é meio que escravo. Tem que obedecer, ficar ali, nem sempre ganha pelo que faz. Prefiro ser meu próprio patrão”, explica.

Fiscalização - Entre os diversos vendedores com quem a reportagem fez contato nas ruas da Capital, a relação com fiscais da Prefeitura diverge. Alguns veem a administração como parceira, outros falam de perseguição.

Segundo alguns vendedores, há um tipo cadastro para permanecerem dentro dos limites da Praça Ary Coelho, mas o movimento e as obras na 14 de Julho atrapalham a atividade no local. “Eles ‘estão deixando’ a gente ficar aqui (na calçada) por enquanto. Quando acabar a obra, não sei o que vai ser”, disse uma vendedora que não quis se identificar.

Seu Algeu conta que até ganhou a banca do prefeito Marquinhos Trad e que ele o apoia desde que trabalhava na antiga rodoviária. “Ele é mais compreensivo”, afirma. Outro vendedor que atua na calçada da Ary Coelho, na Afonso Pena e não quis revelar o nome, relatou ter tido sua mercadoria apreendida.

Produtos expostos na calçada no centro de Campo Grande. (Foto: Tatiana Marin)
Produtos expostos na calçada no centro de Campo Grande. (Foto: Tatiana Marin)

Gabriel conta que ele e outros artesãos já tiveram não só o artesanato apreendido, mas também até material de limpeza. “Há uma lei federal que permite a exposição de artesanato em qualquer área pública. Por enquanto (durante as obras do Reviva) estamos aqui (na calçada da Ary Coelho). Vamos ver se depois eles vão cumprir a lei federal”, sustenta.

Com dados da Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano), a Prefeitura de Campo Grande estima que haja cerca de 100 ambulantes que passam pela área central da Capital e cita o Artigo 5º da Lei 2.909 de 28 de Julho de 1992, que instituiu o Código de Policia Administrativa do Município de Campo Grande onde determina que “é vedada a utilização dos logradouros públicos para atividades diversa daquelas permitidas neste código”. Portanto, realiza rotineiramente ações de fiscalização em todas as regiões.

Apesar de destacar que não há amparo legal para a atividade, em fiscalizações e monitoramentos, percebeu-se que "os ambulantes dessa região são geralmente pessoas de outras localidades (cidades/estados/países) e que estão apenas de passagem pela cidade" e "como a própria denominação já diz, são ambulantes, não permanecem num mesmo local".

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