Entre camadas de concreto, professor encontra relíquia de 1930

Entre a terra, pedras e o contrapiso do quintal, Hugo Cezar Fernandes Gondim encontrou o que ninguém mais via, o passado preservado em pisos sobrepostos, em outras palavras, ladrilhos hidráulicos que podem ser de 1930. Foi em meio à demolição, de parte da casa no bairro Amambaí que o professor, sem querer, descobriu um tesouro escondido sob o concreto moderno: uma relíquia vermelha chamada de "vermelhão".

A obra está sendo feita na segunda casa dele. Ambas preservam a cara dos séculos passados, mas com adaptações e melhorias internas. Quando Hugo decidiu comprar o primeiro imóvel, a ideia era ampliar a área externa e garantir uma garagem com a segunda casa ao lado. A hipótese de que o ladrilho seja dessa época é porque a primeira casa foi construída no ano.

“Isso é olhar pra algo que foi literalmente enterrado como ultrapassado ou velho e dar novamente uso, valorizando a história e a construção de Campo Grande.” O intuito da obra do professor era reformar as casas sem mexer na estrutura ou sem alterar características que marcam o tempo da construção.

“Meu objetivo sempre foi encontrar pisos hidráulicos, assim como o chão de taco. São muito bonitos e não entendo por que as pessoas hoje desvalorizam e jogam fora. Provavelmente vou utilizar o piso hidráulico vermelho na área externa, mas isso precisa de uma revisão no projeto novamente. Estamos na esperança de achar mais coisas, quem sabe um piso decorado. Mas esse foi só o começo.”

Embora fosse conhecido e usado na Europa desde 1867, o ladrilho hidráulico ganhou força no Brasil entre os anos de 1920 a 1950. Na época, ele teve destaque nos projetos arquitetônicos de casas e empresas.

"Encontramos camadas e mais camadas de piso, um sobre o outro. Quando tiramos a parte mais superficial, demos de cara com ladrilhos hidráulicos vermelhos. Ainda tenho esperança de achar algum decorado."

A reforma conta com o olhar técnico da arquiteta Vivianne Maria de Freitas, especialista em restauro. O local virou uma espécie de “escavação arqueológica urbana” para ela.

“O bairro Amambaí foi o primeiro bairro de Campo Grande. A casa do Hugo, a primeira, é da década de 1930. Começamos o restauro dela na esperança de encontrarmos ainda os ladrilhos hidráulicos, porém eles já haviam sido removidos e trocados por cerâmica. Quando o Hugo decidiu comprar a casa ao lado, vimos que a casa já era bem mais moderna, com alvenaria convencional, pilares de concreto, então nem imaginamos que haveria algo histórico.”

Segundo ela, o único indício de que havia algo era o desnível de 50 cm da casa um para a casa dois.

“Como precisaríamos nivelar a área do fundo, começamos a quebrar o piso e começamos a achar as camadas de pisos. Depois de chegarmos à última camada, que são os tijolinhos, entendemos o desnível de 50 cm, então conseguimos saber um pouco da história e ver que realmente existia uma casa no mesmo estilo ali.”

Ela conta que, apesar do tempo e das inúmeras camadas sobre os ladrilhos hidráulicos, muitos sobreviveram sem danos e que eles eram muito utilizados no interior das casas a partir da década de 1920.

“Entre a camada de cerâmica e o ladrilho temos algo entre 20 cm, o que foi usado para nivelar a área externa, provavelmente. Isso explica a preservação dessa camada. A última camada de porcelanato sobre os ladrilhos tem mais uma camada de contrapiso com cimento, o que ajudou na preservação dos ladrilhos.”

Assim como Hugo, ela também acredita que exista mais história enterrada na casa. Porém, a obra não vai demolir nada na parte interna.

“Temos fortes indícios de que eles ainda existem na parte interna da casa que não vamos demolir, então ficará essa incógnita. Provavelmente a parte em que ainda existem ladrilhos fazia parte do interior da antiga residência.”

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