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Comportamento

"Saí calmamente, mas a partir daquele dia dancei Rihanna sem medo de dar pinta"

Elverson Cardozo | 31/03/2015 06:15
Não existem mais barreiras quando você se aceita. Preconceito tem em todo lugar, mas só te afeta se você deixar. (Foto: Arquivo Pessoal)
Não existem mais barreiras quando você se aceita. Preconceito tem em todo lugar, mas só te afeta se você deixar. (Foto: Arquivo Pessoal)

Na quinta reportagem da série "Saindo do Armário", o corajoso da vez é o estudante de Publicidade Guilherme Freiras de Souza Ferreira, de 22 anos. Criado em um meio conservador e tradicionalmente religioso, ele só conseguiu sair do armário aos 18 anos, depois de buscar a "cura" em namoradas. Primeiro contou que era gay a um amigo e, depois, à mãe, pelo WhatsApp. A despedida de "Nárnia", como ele mesmo diz, foi lenta, pé a pé. Mas, hoje, Gui, como é carinhosamente chamado, dança Rihanna sem medo de dar "pinta". Leia o relato escrito por ele.

"Buscava em namoradas a minha cura"

Pela primeira vez, me forcei a analisar todo o processo que é "sair do armário". Hoje, vejo de um jeito mais fácil, porém, delicado. Não por você ser quem é, mas pela preocupação que tem com as pessoas que ama e, também, pelo medo da rejeição. Minha despedida de “Nárnia” não foi com pontapés. Como era o momento de quebrar uma barreira, preferi sair andando calmamente.

Sinto atração pela figura masculina desde criança, mas, como cresci em uma família tradicionalmente religiosa, onde o preconceito ainda existia, negava. Às vezes pensava: “é apenas uma fase. Logo vou ver uma menina e sentir atração por ela como sinto pelos meninos”.

Nunca contei meus desejos ocultos a ninguém, mas buscava em namoradas a minha cura. É claro que não me “curei”. Não dá para curar o que não é doença e nem mudar a essência. Depois de lutar muito, me aceitei, mas guardei esse segredo comigo por mais um tempo.

"Como era o momento de quebrar uma barreira, preferi sair andando calmamente". (Foto: Arquivo Pessoal)
"Como era o momento de quebrar uma barreira, preferi sair andando calmamente". (Foto: Arquivo Pessoal)

Morei uma época em São Paulo e, lá, criei forte ligação com um amigo do Ensino Médio. Em uma de nossas conversas de MSN, ele me contou que era gay e que estava feliz. Aquilo mexeu comigo. Eu queria dizer a mesma coisa, “gritar” junto, mas tive medo.

Surgiu, então, a possibilidade dele me visitar em um final de semana. Foi aí que tomei coragem e confessei, aos 18 anos, que também era gay. Debochado, ele abriu um sorrisinho no canto do rosto querendo dizer: “eu já sabia". Sei que me senti a pessoa mais livre do mundo. É como se estivesse começando a viver. A partir daquele dia, dancei Rihanna sem medo de dar "pinta".

Minha mãe estava morando em Portugal quando contei a ela, dois anos depois. Foi pelo WhatssApp. Me sinto frustrado por isso, mas foi a única forma que encontrei de comunicar. Ela reagiu do jeito mais natural possível. Foi carinhosa, cheia de compaixão e ternura. Me acalmou e deu palavras de conforto dizendo “está tudo bem. Nada mudou e nem vai mudar”.

Eu chorei. Não por tirar um elefante de meus ombros, mas de vergonha por não ter contado antes. Chorei porque estava de alma lavada e, então, agradeci a Deus. De volta ao Brasil ela confessou que, no início, foi difícil, mas depois entendeu que eu continuava sendo filho e que o amor que ela sentia nunca mudaria. Nos tornamos muito mais cúmplices. Para o meu pai eu nunca contei. Ele sabe, mas, embora não aceite muito bem, respeita.

Hoje, assumido, morando fora de casa, eu entendo que nada é fácil, mas sei que isso não tornam as coisas impossíveis. Meu namorado convive normalmente em meio a meus irmãos, tios, avós, sobrinhos e etc. Somos uma família normal. Temos problemas de famílias normais e programas também, como churrascos aos domingos de manhã e até um grupo no WhatsApp.

No meu trabalho todos sabem da minha sexualidade, assim como na faculdade, redes sociais e por aí vaí. Saí do armário, mas continuei sendo filho, amigo, neto, irmão, tio e o sobrinho que sempre fui. A diferença? Agora sou sincero comigo mesmo.

Não existem mais barreiras quando você se aceita. Preconceito tem em todo lugar, mas só te afeta se você deixar. Entendi isso depois de ouvir meu irmão de 11 anos dizer: "Eu amo o Gui do jeito que ele é. Ele é meu irmão." Eu nunca precisei dizer a ele que era gay.

Envie seu relato - Se identificou com a história da Guilherme? Tem alguma para contar? Compartilhe com a gente! Mande um e-mail para ladob@news.com.br

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