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Comportamento

Após vida cortando árvore, Firmino enfrenta calorão ‘morrendo de dó’

“Mato” era refúgio do calor, mas hoje aposentado sente que já não há para onde correr

Por Aletheya Alves | 19/03/2024 07:00
Firmino conta que viu o calor aumentar junto com sua idade. (Foto: Alex Machado)
Firmino conta que viu o calor aumentar junto com sua idade. (Foto: Alex Machado)

Sem árvores em frente de casa, a união entre a sombra do muro, uma leiteira cheia de gelo, garrafa de água e o copo de tereré na mão foi o que salvou Firmino Sanches Duarte enquanto Campo Grande registrava sensação térmica de 39°C. Tendo crescido na roça e trabalhado em diversas fazendas, o aposentado conta que precisou passar boa parte da vida desmatando, mas que sentir as temperaturas extremas se tornou um lembrete de que o refúgio no meio do mato existe cada vez menos. E de que na cidade o cenário é pior ainda.

 “A gente destruía (trabalhando), mas hoje dá dó, hoje eu tenho dó de cortar uma árvore”. A conversa era sobre o fim do verão e, no fim das contas, Firmino dividiu um pedaço de sua tarde contando sobre como o sofrimento generalizado com as temperaturas infernais se liga, de uma forma ou de outra, com o que viu durante a vida.

Do lado de fora da casa de concreto e forro de PVC, o homem de 70 anos dividia o tereré com o amigo que desistiu de trabalhar momentaneamente justamente pelo calor. Motorista da Uber, Joel Miguel viu que o ar condicionado do carro não estava dando conta e se juntou ao aposentado para enfrentar a tarde desta segunda-feira (18).

“Esse calor tá forte demais mesmo, e olha que já trabalhei em lavoura, na roça”, respondeu Firmino sobre a impressão desse verão. Sem cravar os motivos que acredita serem os responsáveis pela piora no clima, a conversa do homem foi caminhando para o desmatamento.

Isso porque, para Firmino, hoje em dia já não dá mais para fugir para a natureza e tentar se esconder do calor dentro de um rio. “Vai correr para onde? No Pantanal, o calor deve estar pior”.

Aos 9 anos de idade, seu trabalho era com plantação ao lado da família na região de Fátima do Sul, em uma comunidade que se chamava Vila Brasil. Por lá o calor era sofrido, mas Firmino diz que a intensidade era diferente.

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“A gente sentia calor, mas chovia na época certa, vinha frio na época certa” e, além disso, a meninez também devia ajudar a enfrentar as temperaturas, diz Firmino.

Seguindo a linha do tempo, aos 14 anos, fugiu de casa e conheceu Corumbá. Por lá, cuidou de uma lancha por dois anos e conheceu o calor de quem vive ao lado do Rio Paraguai. Depois dessa fase é que a relação com o desmatamento começou, quando aprendeu a dirigir trator e trabalhar como operador de máquinas.

“Hoje, para você arrancar uma árvore precisa de licença e eu concordo com isso, aqui já foi muito desmatado. Você vê que tinha o cerrado, saía de Aquidauana até Corumbá e via, mas agora já não vê mais”, descreve, fazendo uma ligação entre o aumento da sua idade e da derrubada de verde.

Trabalhando em fazendas, o homem narra que precisou fazer de tudo um pouco e, na época, não tinha nem tempo para pensar. “Já trabalhei em desmatamento, puxando correntão, com escavadeira fazendo bebedouro para gado no pantanal, tanque de peixe”.

De volta para o agora, ele defende que as reservas ambientais deveriam ser maiores, assim como os investimentos em defesa da natureza. “Na beira do rio mesmo, deveria deixar a mata livre”, diz.

E, imaginando como será o calor do próximo verão (que, conforme as previsões, deve seguir ficando mais complicado), o aposentado completou a conversa dizendo que a gente não tem mesmo para onde fugir, o jeito é pensar. “E aí, o que a gente faz?”.

Joel, ao lado de Firmino, narra que a preocupação vem com as mudanças. (Foto: Alex Machado)
Joel, ao lado de Firmino, narra que a preocupação vem com as mudanças. (Foto: Alex Machado)

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