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Comportamento

De segurança e cliente, Everson e Márcio passaram a ser casal em "desconstrução"

"Se você nunca conheceu um homem que pegasse na sua mão e saísse pela rua, você acaba de conhecer", disse Everson a Márcio

Paula Maciulevicius | 23/02/2017 07:45
Quando sentir vontade de soltar as mãos, segure firme. (Foto: Alta Fotografia)
Quando sentir vontade de soltar as mãos, segure firme. (Foto: Alta Fotografia)

A sessão de fotos na construção abandonada quer mostrar o amor livre. Everson e Márcio passaram de segurança e cliente, de um restaurante, a casal. As paqueras de Márcio não eram bem vistas por Everson, que entre várias questões ainda não tinha se assumido gay, mas quando o fez, saiu do armário para defender que não dá para ficar preso ao que os outros estão pensando.

Juntos há 3 anos e 8 meses como namorados, cada um em sua casa, com sua família, os dois ficam noivos nesta sexta-feira. E às vésperas de trocarem a aliança de compromisso pela de noivado, fizeram um ensaio de fotos por acreditarem que eles também têm o direito de seguir o rito como os outros casais. O lugar escolhido foi a obra que deveria ser a nova rodoviária de Campo Grande, e as imagens seguiram até a Praça Itanhangá,

"Foi uma experiência muito boa, algo que eu sempre falo é uma construção em cima de uma grande desconstrução. Nós sabemos a sociedade em que a gente vive e que o preconceito é uma coisa que sempre vai existir e também bateu à nossa porta", diz o porteiro Everson Pires de Arruda, de 31 anos. 

Casal em fotos na Praça Itanhangá. (Foto: Alta Fotografia)
Casal em fotos na Praça Itanhangá. (Foto: Alta Fotografia)

A história deles começa bem antes dos quase quatro anos de relacionamento. No restaurante onde Márcio sempre almoçava junto de uma amiga, Everson era quem fazia a segurança. "Eu paquerava ele toda vez e ele ficava com raiva de mim. 'Como assim você está mexendo com uma autoridade'? imaginava o servidor público Márcio de Aquino, de 36 anos. 

E na cabeça de Everson, Márcio e a amiga eram um casal. Passado um tempo, com o segurança já assumido como gay, os dois se encontraram, mas de imediato não fizeram associação entre o restaurante e as investidas do servidor. 

"Eu dei uma carona que ele aceitou com medo e meio que chegando próximo à casa dele, a gente descobriu quem era quem quando começou a falar de trabalho", lembra Márcio. 

O namoro começou como um marco para Everson, que até então nunca tinha namorado homens. "Passei por todo aquele processo de aceitação própria. Eu ficava naquela 'será que pode? Será que não pode? Porque tinha toda questão social de igreja, da minha família... Até que um dia eu parei para observar que alguns casais gays que eu conhecia ficavam sempre escondidos e eu não queria viver uma vida assim", narra. 

Com a consciência plena de que não estava fazendo nada de errado e nem agredindo ninguém, Everson passou a segurar firme a mão do companheiro. "É uma coisa suja, pecaminosa? Eu acho que sujo e pecaminoso é você roubar seu próximo, odiar as pessoas. É deixar de trabalhar, é ficar falando mal do vizinho, desejar o mal para alguém", enumera o porteiro. 

Dos casais que eles convivem, muitos até hoje mantém uma postura de serem só amigos diante da sociedade. Márcio era um dos que tinham o que o namorado atribui como "vícios" assim. "Aí eu fui dizendo a ele: você é livre, não deve nada a ninguém. Não tem que querer suprir alguma coisa por causa disso. Nós somos o que somos e somos normais, como qualquer pessoa", repete Everson. 

De segurança e cliente a casal, os dois encontraram o amor um no outro. (Foto: Alta Fotografia)
De segurança e cliente a casal, os dois encontraram o amor um no outro. (Foto: Alta Fotografia)
A troca de carinhos é a certeza de que eles não estão fazendo nada de errado. (Foto: Alta Fotografia)
A troca de carinhos é a certeza de que eles não estão fazendo nada de errado. (Foto: Alta Fotografia)
Juntos, eles desconstroem e constroem todos os dias a liberdade de se viver o amor. (Foto: Alta Fotografia)
Juntos, eles desconstroem e constroem todos os dias a liberdade de se viver o amor. (Foto: Alta Fotografia)

Essa ideia de viver o amor livremente foi sendo passada, aos poucos, ao namorado e Everson admite que ficou eufórico com o sentimento a ponto de querer que o mundo todo ficasse sabendo. "E ele dizia: 'calma, não é bem assim... E eu afoito. Mas nós merecemos noivar, nos casar e foi bom e tem sido muito bom", avalia. 

Ao serem questionados 'quando descobriram que eram gays', o casal responde com outra pergunta: "e você? Quando descobriu que era hétero?" "Ninguém vira gay, opta por ser gay. Não é uma escolha e também não é uma orientação, porque não tem como você orientar alguém a ser gay. É a nossa condição e nós escolhemos vivê-la e ser livre para ser feliz, para viver o amor", declara Everson. 

Márcio completa que tanto o discurso, como a prática, sempre partiu mais do namorado. Até a aliança de compromisso, colocada dois anos atrás, foi ideia de Everson. "Eu sempre tive muito receio, muito mais da questão de trabalho do que de família", desabafa.

No mercado de trabalho, infelizmente Márcio vê que muitas pessoas às vezes parecem querer confundir "condição sexual, com capacidade profissional e intelectual" e o maior medo foi de que essa mudança de visão ou mesmo desconstrução, pudesse lhe atrapalhar e até mesmo impactar na escolha quanto a promoção em melhores cargos.

"E ele me ajudou a desconstruir isso com muito cuidado, devagarzinho", agradece ao companheiro. 

O ensaio, para o casal, foi dar um recado, em especial aos LGBT's. "Eu sempre falo que quero me casar justamente por todos aqueles gays que vivem uma vida muito fechada. Que não estão em liberdade de pegar na mão do seu companheiro, que moram juntos, mas na rua agem como dois amigos por medo. Quando resolvemos fazer a foto, quis mostrar isso: liberdade.

Somos livres. Não somos aberrações e não temos que ficar fechados entre quatro paredes. Longe disso. Somos livres para vivermos o nosso amor e uma coisa que nós somos e infelizmente me dói muito saber e conhecer pessoas que não vivem esse amor", enfatiza Everson. 

Quem ama vive, quem deixa de amar é que vai morrendo aos poucos. Já diziam por aí que quem perde é quem não dá amor. No ensaio, Márcio diz que "travou" quando viu famílias olhando e comentando a sessão na praça, mas teve segurança plena ao pegar na mão do companheiro e dizer: "Eu quero me casar com você".

E Everson repete o que já havia dito anteriormente: "se você nunca conheceu um homem que pegasse na sua mão e saísse de peito aberto pela rua, você acaba de conhecer".

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"Eu quero me casar com você", diz Márcio a Everson. (Foto: Alta Fotografia)
"Eu quero me casar com você", diz Márcio a Everson. (Foto: Alta Fotografia)
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