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Comportamento

Depois da morte ou separação, pais ensinam os filhos como é viver sem as mães

Paula Maciulevicius | 14/08/2016 07:05
Depois que a mãe partiu, Clara e Abraão têm aprendido juntos como é viver sem Miriam. (Foto: Alcides Neto)
Depois que a mãe partiu, Clara e Abraão têm aprendido juntos como é viver sem Miriam. (Foto: Alcides Neto)

Abraão, Miriam e Clara. Há cinco meses o trio perdeu uma das integrantes. Miriam morreu de câncer em março deste ano, deixando ao marido a lição de ser dois, mas sozinho. Na segunda história, depois que a mãe deixou o filho Patrick com a avó para morar em outra cidade, Rogério descobriu que ser pai ia além de ficar com o menino nos finais de semana. Neste Dia dos Pais, o Lado B escolheu falar sobre como é para os pais ensinar os filhos a viverem sem as mães.

Clara é a caçula de Abraão. Tem 5 anos, um sorriso lindo e a cor dos olhos iguais aos do pai. Uma filha planejada pelo casal, a pequena teve de dizer tchau muito cedo à mãe e sem nem ao menos saber exatamente o que a despedida significa.

Da descoberta do câncer no ovário ao término, foi tudo muito rápido. "A gente descobriu em novembro e em março ela partiu e não tem uma preparação", conta o pai, engenheiro civil Abraão da Silva Lemos, de 50 anos. 

Cuidar de Clara sempre foi muito natural para ele. Apesar de ter sido criado de uma forma diferente, nunca fez em casa a separação do que era papel de pai e de mãe. "Para mim é a mesma coisa. A Clara sempre foi criada por mim, sempre cuidei como se fosse pai e mãe e não era porque a mãe era ausente, era porque era assim", exemplifica. 

A despedida da mãe foi um vídeo em que Clara diz: 'mamãe, eu te amo, só que você volta logo? (Foto: Alcides Neto)
A despedida da mãe foi um vídeo em que Clara diz: 'mamãe, eu te amo, só que você volta logo? (Foto: Alcides Neto)

Do choro que ele nunca só comunicou à mãe, sempre agiu também aos rabos de cavalo que precisa fazer, Abraão acredita que a parte mais difícil de viver sem Miriam ainda seja para ele. "A criança, eu não sei se ela está preparada para tanta dor, mas desde que a Miriam ficou doente, eu nunca escondi dela, inclusive eu ia falando: 'filha, daqui uns dias a gente vai ter que dar tchau para a mamãe', porque a gente já sabia que o processo seria irreversível", conta. 

A despedida foi um vídeo em que Clara diz: 'mamãe, eu te amo, só que você volta logo? Amém', seguindo de um Pai Nosso ao lado do pai e um "vai com Deus mamãe". 

"Quando eu falei vamos dar tchau para a mamãe, não sei se ela sabe direito o que é um tchau. Nesse dia eu escrevi uma despedida para ela e levei a oração e na madrugada ela partiu. Tem gente que diz que ela estava só aguardando esse tchau", narra Abraão. 

Junto da descoberta do câncer, os três se mudaram para a casa dos pais de Miriam, de onde Abraão ainda não conseguiu sair. A menina às vezes cobra, pergunta, quando é que eles vão voltar para casa que é deles. E a resposta do pai é só uma: "não sei".

O trio completo, com Miriam, que fez de Clara e Abraão uma dupla mais forte.
O trio completo, com Miriam, que fez de Clara e Abraão uma dupla mais forte.

O que pai e filha estão aprendendo a lidar é com a companheira para quem Clara não vai poder questionar algumas coisas. "Ela tinha acabado de me perguntar por que o nome dela é Clara? E eu falei: 'olha, sua mãe que escolheu desde pequenininha, ela queria ter uma Clara e também é uma homenagem à vó dela que chama Clarinda'". "Clarinda?" repete a menininha. 

"Na verdade, ninguém ensina a viver sem ninguém. É um processo que você tem que enfrentar. É o simples processo de continuar vivendo. Para mim, todo mundo é insubstituível até ser substituído, só que a gente nunca está preparado, principalmente nessa situação", reflete o pai. 

E quando Clara questiona por que a mamãe foi embora? O pai empresta do lúdico a resposta, quase que desenhando para a filha uma imagem da mãe lá em cima. "Eu falo: filha, papai do céu estava precisando de companhia lá e escolheu sua mãe'. Não tem como você explicar isso", desabafa.

E o que mudou em ser um pai que precisa ensinar a filha a viver sem a mãe? O amadurecimento. "Converso bastante com a Clara, mas em determinadas situações, não adianta. Ela não tem um nível de entendimento ainda, mas o importante é que você não desista e converse, porque o legado que você vai deixar para os filhos, é a educação". 

Enquanto o pai falava, Clara já tinha trocado de roupa, passado batom e glitter nos cabelos. Questionada se Abraão é o melhor pai do mundo, rindo ela confirma. "É, porque ele faz carinho, ele brinca comigo, faz cosquinha na barriga, no pé e nas costas". 

Rogério e o parceiro de vida, o filho Patrick.
Rogério e o parceiro de vida, o filho Patrick.

Publicitário, Rogério Oliveira tem 41 anos e há sete cria o filho, Patrick, sozinho. O garoto tinha 10 anos quando saiu da casa da avó, depois que a mãe partiu para outra cidade a trabalho e veio viver com o pai. "Ele vinha dando trabalho para avó e ela pegou e mandou para mim. Agora ele está aqui comigo e não vai embora", brinca o pai. 

Rogério assumiu a responsabilidade por completo, arrumou apartamento e organizou a vida para levar e buscar filho na escola. "Na verdade, eu não ensinei ele, eu fui aprendendo também. As pessoas me falavam: 'você está aprendendo mais com ele do que seu filho com você e é assim", conta. 

Entre erros e acertos, Rogério aponta que não tinha uma fórmula a seguir a não ser o caminho da parceria. "Nós sempre fomos muito amigos, muito juntos, muito parceiros". Sobre a mãe, o publicitário diz que evitar falar com Patrick, mas sabe que é o único familiar na cidade com quem o menino pode contar sempre. 

"É muito aprendizado e um exercício constante de paciência. Agora ele faz o almoço dele, se criou, mas antes não. Eu acordava 10 para 6 da manhã, fazia lanchinho para ele comer na escola e botava ele na bike, levava ele no cano da bicicleta para a escola", conta. Quando o filho ficava doente, ele tinha de faltar no trabalho para dar os cuidados. Coisa que para a mãe é normal e fica mais fácil quando há dois responsáveis para dividirem.

"No começo foi bem complicado, eu penei muito para aprender a lidar com ele, mas depois que se adapta, vai ficando mais fácil. Hoje a gente é uma família amiga e feliz". Quanto às broncas, é em Rogério que dói mais. "Se tivesse outra pessoa, ia ser bem mais fácil dividir a responsabilidade. O duro é que só tem eu para brigar, então você sempre tem que ser o chato e ele fica emburrado, achando que você é o pior pai do mundo e não é assim", comenta o publicitário. 

O garoto, hoje adolescente, diz que a maior dificuldade era a comparação. Na casa da avó, recebia mais carinho. "A gente brigava muito por causa de escola, mas porque eu era preguiçoso. Depois que comecei a conviver com meu pai e ter regras, ficou tudo bem mais de boa", diz Patrick Gomes de Oliveira, de 17 anos. 

Nas férias de julho, Patrick foi para a casa da avó e para o pai, a saudade bateu doído. "Parecia que estava faltando uma perna e olha que eu só brigo com ele", brinca Rogério. 

"O que meu pai é para mim? Ele é meu herói. Eu aprendi muita coisa boa com ele e percebi que cresci muito com ele", resume o filho. 

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