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Comportamento

Em ano de eleição, são as mulheres que usam o Carnaval para debate político

"Eu que lute", "Elas Podem", "Mulherão da Porra", frases mostram o quanto elas estão à frente tomando partido nos blocos de rua

Paula Maciulevicius Brasil | 26/02/2020 07:05
Gislaine não se fantasiou, ali era ela mesma como uma mulher da porra.
Gislaine não se fantasiou, ali era ela mesma como uma mulher da porra.

Vestida de si mesma, Gislaine Costa, de 38 anos, estampava uma camiseta com a frase "Mulherão da Porra". Em pleno Carnaval, na Esplanada Ferroviária, ela foi uma das mulheres que encabeçaram um debate socio-cultural e político, fazendo da festividade palco para manifestações e discussões de ideias.

Dançando, ela respondeu que era ela mesma e fez uma relação com o assédio que as mulheres, objetificadas por anos nesta época, ainda sofrem. "Eu sou o mulherão da porra, e a gente não tem que aguentar nem aceitar nada. Meu corpo é meu e só eu posso pegar, mais ninguém", declarou. 

No ano em que Campo Grande escolhe prefeito e os parlamentares que ocupam a Câmara de Vereadores, foram elas que saíram às ruas carregando uma bandeira em defesa das mulheres também na política, se vestindo delas mesmas, sem se aproveitar das sátiras. 

"Elas podem" levam mensagem de coletivo através das amigas Ladielly e Gabriela.
"Elas podem" levam mensagem de coletivo através das amigas Ladielly e Gabriela.

Amigas, as estudantes Ladielly de Souza Silva, de 23 anos, e Gabriela de Lima Bauer, de 21, usavam a tiara "Elas podem" além do bótão colado ao corpo. Questionadas sobre o que elas podem, a resposta foi: "tudo".

"Elas podem dizer não, podem escolher, elas podem tudo. A gente vai se reunir daqui a pouco, várias mulheres, para curtir o Carnaval sem assédio, para dizer que não é não", enfatizou Ladielly. Disseminadores do coletivo #Elaspodem, a dupla não só vê engajamento político na folia, como faz questão de dizer que Carnaval e Política coexistem. "Acho isso muito latente, Carnaval é esse espaço para as pessoas se expressarem e também falar de política", destacou.

No total eram 10 meninas usando a tiara e pouco mais de 300 bótons que foram distribuídos, além dos leques com frases de empoderamento feminino. "O Elas Podem surge para dizer que mulheres podem ocupar espaços de poder. É um grupo voltado principalmente para a política, temos também projetos de empoderamento nas escolas, para mostrar para as alunas que elas têm voz, têm força", diz Gabriela.

Mais adiante, no bloquinho, quem analisava Campo Grande através dos passos e fantasias dos foliões era o sociólogo Paulo Cabral, de 71 anos. Ele explica que costuma cair na folia para dar uma "sapeada" e ver o que está rolando.

Sociólogo Paulo Cabral avalia que com uma sociedade conservadora como a de Campo Grande, é natural a ausência ou pouca presença de política no Carnaval.
Sociólogo Paulo Cabral avalia que com uma sociedade conservadora como a de Campo Grande, é natural a ausência ou pouca presença de política no Carnaval.

"O que eu enxergo de Campo Grande através do Carnaval é que ele não chega a ser um traço cultural local, porque sendo uma manifestação essencialmente urbana, apesar de Campo Grande ter tido um processo de urbanização precoce, o Carnaval não era uma presença local, ele vem importado e é uma expressão popular como em outras capitais brasileiras, tem sua importância, mas não é alguma coisa da nossa raiz", descreve o sociólogo.

Sobre aproveitar o Carnaval para expressões políticas, principalmente em ano eleitoral, Paulo explica que depende da natureza de cada bloco. "No bairro onde nasci tem um cordão muito antigo, o Bloco do Esfarrapado. Eles saem na segunda de Carnaval e uma das características é a sátira política desde sempre, que é uma coisa da natureza do bloco. Aqui temos uma sociedade majoritariamente conservadora, então a ausência de política acaba sendo uma coisa coerente", acredita. Paulo nasceu no bairro do Bixiga, em São Paulo. No entanto, o que se viu foi o protagonismo feminino ao redor das críticas sociais.

A frase "Eu que lute" da tiara resumiu o que Lis tem que fazer em busca da acessibilidade. (Foto: Kísie Ainoã)
A frase "Eu que lute" da tiara resumiu o que Lis tem que fazer em busca da acessibilidade. (Foto: Kísie Ainoã)

"Eu que lute" - A tiara no cabelo de Lis Loureiro, de 29 anos, é a resposta para quem pergunta o que ela vai fazer se quisesse ir ao banheiro no bloquinho. "Eu que lute para achar um escuro e fazer xixi. Não tem nenhuma acessibilidade, nem banheiro químico adaptado", pontua.

Cadeirante, ela frequenta há seis anos o Carnaval de rua e, pelo menos em 2019, tinha um banheiro que comportava ela e a cadeira. "Mas todo ano é a mesma coisa, cadeirante é folião como qualquer outra pessoa", frisa.

O pior não foi nem segurar o xixi e sim receber os "parabéns" por estar ali. "As pessoas têm uma visão muito fechada de quem tem deficiência. Acham que pelo fato de termos limitação somos pessoas que não têm vida social. Quando me veem no bloco, me parabenizam por estar fazendo aquilo que elas também estão fazendo", critica.

Questionada sobre o que falta para que a sociedade não só a parabenize por estar no Carnaval como também se atente a acessibilidade, ela diz: "é mais uma questão socio-cultural. Não é só a acessibilidade, falta educação".

Presidenta - Com a faixa presidencial, a administradora Aimê Barbosa Martins Bast, de 30 anos, é direta ao dizer que Carnaval é uma oportunidade incrível para se fazer críticas sociais. "Vejo só gente entrando em discurso moralista, sobre ter ou não ter Carnaval e sem propor nada que realmente faça a diferença", questiona.

A intenção de se vestir como presidenta foi para mostrar que as mulheres podem e devem pensar em se envolver em cargos de poder. "Precisamos de mais mulheres na política e eu carrego essa bandeira".

Presidenta, Aimê quis levar a bandeira que carrega, de que mulher deve ocupar a política. (Foto: Arquivo Pessoal)
Presidenta, Aimê quis levar a bandeira que carrega, de que mulher deve ocupar a política. (Foto: Arquivo Pessoal)
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