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Comportamento

Em entrevista para vaga de garota de programa, repórter descobre o seu "preço"

Nossa repórter é branca, então vale mais no mercado de Campo Grande

Da Redação* | 06/03/2017 09:14
Anúncio aparece quase que diariamente em jornal impresso.
Anúncio aparece quase que diariamente em jornal impresso.

Dois anúncios nos classificados de um jornal impresso, em Campo Grande, oferecem vagas para mulheres em "casa de massagem". Na descrição, o maior apelo é: "ganhe de R$ 50,00 a R$ 400,00 por dia".

O texto chama atenção para um local discreto e com clientela formada. Usando um nome fictício, o Lado B resolveu falar nesses lugares para saber como funciona o ''mercado'' que atrai tantas mulheres à prostituição. Entre as informações reveladas, surgiu o racismo e o perigo à saúde, com incentivo ao sexo sem preservativo.

O primeiro contato foi por telefone. Quem atende a ligação não se identifica, mas diz que é necessário ir pessoalmente falar com Adriana. Na linha, a pessoa pergunta a idade da candidata e se a pessoa já teve experiência fazendo programa.

Pessoalmente, sou recebida por um homem em uma residência discreta na Avenida Calógeras, região do Monte Líbano. A casa de prostituição estava aberta desde às 9h da manhã. Ele pede para esperar em uma sala, onde outras duas meninas andam de um lado para o outro de salto alto, arrumando a maquiagem para começar o dia.

A casa é grande e cheia de cômodos de portas fechadas, exceto a cozinha, onde é possível ver um varal cheio de toalhas e um armário, onde as meninas guardam objetos pessoais.

No escritório, o agenciador chama para uma conversa, o clima é tenso pelo silêncio, olhares e câmeras nos cantos. Logo de cara,  ele questiona a idade e pede um documento. Sem nada em mãos, alerta que só seria possível trabalhar com a apresentação da carteira de identidade. Mas não demora muito para ele explicar como a casa funciona.

O agenciador explica sobre a tabela de preços que está na parede. O valor por 15 minutos de programa é R$ 60,00, mas só metade do dinheiro fica com a mulher. O preço dobra para o valor de meia hora e chega a R$ 250,00 durante 1 hora sexo se o trabalho for ''completo".

Mas é preciso trabalhar bastante para ganhar bem, adverte ele. Geralmente, as meninas atendem até quatro clientes por dia. "Vai depender do seu desempenho. Eu não sei como você trabalha, mas você tem um fator que conta", afirma.

Sem mencionar a roupa ou padrão físico de preferência dos clientes, ele fala o que tem peso na hora de conquistar a clientela. "Você é branca e o campo-grandense é racista", afirma, categoricamente. A informação preconceituosa parece nem surtir efeito sobre nele, que segue dando informações de como tudo funciona.

No escritório bem iluminado, estão livros, uma geladeira, preservativos e garrafas de uísque, para drinques que são oferecidos aos clientes. "Cada dose custa R$ 30,00", avisa.

Para que a oferta fique mais atrativa, ele abre um caderno rabiscado com todos os programas feitos na casa. Uma das páginas, é de uma menina que ele diz ser loira. "Olha o tanto que ela fez", mostra. Ele ainda conta que já houve casos de meninas que ganharam até R$ 14 mil no mês. "Ela tinha assim o seu perfil, ganhava bem. Hoje as coisas estão um pouco paradas, mas dá pra tirar bem aqui", afirma. 

O tom de voz é sempre calmo quando ele se refere aos serviços que podem fazer a candidata conquistar de vez os clientes. "Cada uma tem um jeito de atender, se você for daquelas... Bom, como eu posso dizer, sem ser vulgar...", reflete nas palavras e acaba dizendo algo que coloca em risco a vida das meninas. "Como por exemplo fazer um oral sem camisinha", sugere.

O dinheiro fica com os donos da casa e a mulher só recebe ao fim do dia. Ele jura que o pagamento é feito da maneira correta. "Tem meninas que preferem pegar por semana. O dinheiro fica com a gente e depois entregamos. Não ficamos com nada do que é seu", garante.

O início do trabalho poderia ser imediato, caso houvesse documento que comprovasse a idade. Enquanto estava no local, vi dois clientes entrarem na casa. Um deles, ficou na sala bebendo cerveja, outro cumprimentou as meninas reparando minuciosamente o corpo de cada uma. O agenciador tenta tranquilizar, dizendo que são conhecidos. "Aqui é um lugar tranquilo. Ninguém precisa sair daqui. Temos clientes que preferem motel, mas são poucos e de longa data. A gente leva e busca", explica.

Quando digo que vou pensar e tenho outra entrevista, ele convida para conhecer os quartos. São quatro no total, todos arrumados com uma cama de casal, cadeira, ar-condicionado e um cheiro nada agradável.

Depois, ele passa um cartão de visita sem nenhum receio e pede um telefone para entrar em contato, caso mude de ideia.

Mais cuidadoso - Em outro lugar, bem no Centro de Campo Grande, uma mulher se identifica como "Nega", ela já sabia que alguém tinha ligado com interesse na vaga e vai direto ao ponto. "Você quer trabalhar de dia ou de noite?", pergunta. Além de horário comercial, tem também vaga noturna a partir das 19h.

Ali, as meninas pagam o quarto que usam. A hora do programa custa R$ 270,00. Do total, R$ 70,00 fica para a casa e o restante para a mulher. Não é permitido cobrar menos, se cobrar, sai perdendo, já que todas são obrigadas a pagar o valor do quarto.

Nega não mostra os quartos, mas dá para perceber que há vários ambientes na casa que funciona em um antigo hospital psiquiátrico, na Rua 26 de Agosto.

Ela fala das regras e é bem realista quanto aos clientes. "Tem que usar salto sempre, pode até estar de calça jeans, mas sempre de salto. Temos toalhas e camisinhas para os clientes, você pode trazer a sua tolha e sabonete íntimo para usar depois", explica. 

Sobre os cuidados, lembra de não fazer nada fora do combinado. "Nunca deixe o cliente judiar de você, muito menos ele saber que você é inexperiente. Se ele forçar, você se enrola na toalha e corre aqui, que eu me resolvo com ele", afirma.

Os dois lugares funcionam o dia todo. Ninguém se importa com a inexperiência e isso cresce o olhar e o "valor" da menina.

Depois de desviar de mais uma proposta, ela pede um telefone e diz que vai esperar o retorno, mas não desiste da oferta. "Vem, você tem perfil", diz.

* O nome da autora da matéria foi excluído após sofrer assédio pelas redes sociais.

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