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Comportamento

Para bibliotecárias de MS, ausência dos leitores é o pior "silêncio"

Na falta dos estudantes, elas investiram na "mania" do on-line e da limpeza dos livros – ganhando até prêmio

Raul Delvizio | 04/04/2021 07:18
Andressa é a bibliotecária que não imaginava a existência de um outro "silêncio" (Foto: Arquivo Pessoal)
Andressa é a bibliotecária que não imaginava a existência de um outro "silêncio" (Foto: Arquivo Pessoal)

Seja para um momento de estudo, pesquisa ou leitura informal, a biblioteca é o lugar de tranquilidade perfeito para isso. O que todo mundo não imagina, porém, é que para quem faz da "casa dos livros" a profissão, não existe pior "silêncio" do que o que veio com a pandemia.

A covid-19 que trouxe muita adaptação na atuação de bibliotecário também deixou saudade do barulho das páginas a serem viradas, livros retirados das estantes, dedos a digitarem nos teclados, canetas a escreverem no papel e do "burburinho" da respiração concentrada de todos àqueles que viviam por ali. É o que conta Andressa Finger, 27 anos.

"Nunca me encaixei na imagem do bibliotecário que usa coque, pede silêncio e só fica atrás do balcão. Eu gostava de estar perto, de participar e entender o processo de estudo dos alunos. Com a ausência deles, desse contato e humanização, há coisas que o on-line não proporciona da mesma forma", relata a bibliotecária do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), unidade Dourados.

Aos 27 anos, ela nunca se viu como a profissional que só fica atrás do balcão (Foto: Arquivo Pessoal)
Aos 27 anos, ela nunca se viu como a profissional que só fica atrás do balcão (Foto: Arquivo Pessoal)

Sem os leitores, os livros acabaram virando sua maior companhia. "Eu fiquei um pouco paranoica com limpeza, queria atirar álcool até nas publicações! Criei um cantinho na sala de processamento técnico que apelidei de 'férias'. É lá que eu deixo os livros devolvidos. Por pelo menos 1 semana, eles ficam parados pois é o tempo que até onde se sabe que o vírus sobrevive em superfícies de papel", explica.

Em sua profissão, a pandemia trouxe muitas inseguranças. Sem saber do rumo do país – que dirá das bibliotecas – Andressa pensou em diferentes maneiras para continuar sendo produtiva. "Eu sou sozinha no setor, não tenho funcionários, então todo o peso do 'e agora o que eu faço?' ficou em minhas costas. Conheço colegas de profissão que foram demitidos nesse meio tempo, então comecei a seguir os protocolos a risca e preparar a biblioteca para continuar recebendo os alunos que estavam dispostos a vir até a unidade".

Foi assim que, junto a uma amiga, acabou criando o perfil no Instagram @biblioconnect, uma forma de conectar profissionais e interessados em biblioteconomia. "Tivemos a oportunidade de fazer lives e conteúdos sobre desinformação, fake news, o fazer bibliotecário na pandemia e muito mais. Desse modo, dávamos esperança aos colegas e passávamos a imagem que o bibliotecário está longe de estar apenas atrás do balcão", esclarece.

Perfil no Instagram do projeto que Andressa criou durante a pandemia (Foto: Reprodução/Instagram)
Perfil no Instagram do projeto que Andressa criou durante a pandemia (Foto: Reprodução/Instagram)

Colega de Andressa que já soma 11 anos na profissão, Ana Catarina Araújo é atualmente bibliotecária do IFMS (Instituto Federal de Mato Grosso do Sul). Assim como a amiga, ela também sentiu na pele a mudança desse "silêncio" não-presencial.

"Ao contrário do que se pensa, são diversas demandas vindas de diversos setores que temos responsabilidade. Isso sem falar que damos apoio pedagógico aos professores, visto que agora tudo é remoto, on-line, instantâneo. As minhas 8 horas diárias de trabalho se transformaram em 20h pois tenho que estar disponível a qualquer momento", elucida.

Mesmo com a dificuldade imposta pela pandemia, foi possível sim inovar e levar a leitura para as "páginas sem papel". "Creio que esse hábito não se perdeu, mas se intensificou na covid. O mudou, entretanto, foi a forma que é consumida, pois a leitura transpassou o papel por meio de bibliotecas virtuais e e-books gratuitos, além de outras fontes", descreve.

Antes da covid-19, as duas profissionais sempre acompanhavam de perto os alunos (Foto: Arquivo Pessoal)
Antes da covid-19, as duas profissionais sempre acompanhavam de perto os alunos (Foto: Arquivo Pessoal)

Em sua opinião, assim como a profissão de jornalismo, é dever do biblioteconomista o caminho das informações – não somente em democratizar, mas tornar confiável. "Observo que com o acréscimo das fake news a checagem de uma fonte confiável é imprescindível. O bibliotecário também deve ser um agente de combate a esta prática do mundo contemporâneo, reivindicando a informação para que todos a acessem e tenham uma leitura saudável e gratuita".

Prêmio – Tanto Andressa quanto Ana Catarina foram homenageadas na última terça-feira (30) com a entrega da medalha Rubens Borba de Moraes do ano de 2021 para cada uma delas. A justificativa veio do Conselho Regional de Biblioteconomia de MS, que premia os profissionais que tiveram destaque na profissão no ano anterior – isso em plena pandemia. A solenidade foi realizada por meio de uma live transmitida via YouTube.

Entrega da medalha concedida aos biblioteconomistas com melhor atuação em MS (Foto: Reprodução/YouTube)
Entrega da medalha concedida aos biblioteconomistas com melhor atuação em MS (Foto: Reprodução/YouTube)

"Eu sou muito 'novata' comparada aos meus colegas de profissão, mas isso me deu ainda mais estímulo para continuar com o meu trabalho de agora. Ter esse sentimento de pertencimento, de querer fazer a diferença levando informação, conhecimento e o hábito da leitura até nosso público é o que mais me motiva", afirma Andressa, que ganhou a medalha sob a categoria de profissional do segmento privado.

Já para Ana, a nomeação é sinônimo de resistência. "Apesar da distância, ela reforça a crença que podemos e devemos estar presentes uns com os outros por meio das tecnologias existentes. Mesmo neste momento de clausura domiciliar, isto significa que de alguma forma estou presente na vida e no imaginário de muita gente. É um orgulho tremendo", finaliza a bibliotecária da IFMS.

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