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Comportamento

Rosa superou censura e se tornou a avó desconstruída que todos querem ter

Aos 72 anos, ela rompe com os padrões, tão difundidos por aí, sobre como alguém deve se comportar na velhice.

Thailla Torres | 01/07/2018 07:20
Uma das tatuagens que ela faz questão de exibir, como símbolo da liberdade para ser feliz. (Foto: Fernando Antunes)
Uma das tatuagens que ela faz questão de exibir, como símbolo da liberdade para ser feliz. (Foto: Fernando Antunes)

Não há como negar que Rosa Amélia Albaneze, de 72 anos, é daquelas mulheres que fazem a gente voltar para casa inspirada, principalmente, a dizer dane-se às chatices do ser humano. "Desbocada", ela fala o que pensa e na rotina, rompe com o preconceito tão difundido por aí sobre como alguém deve se comportar na velhice. Se depender dela, padrão nenhum é capaz de tomar a liberdade conquistada após décadas de muita censura.

Mãe de dois filhos, avó de cinco e bisa de três, Rosa é nascida em Corumbá. Na experiência em uma cidade do interior soube construir a identidade no desejo de ser uma mulher livre. Hoje, se tornou  uma figura, especialmente, nas redes sociais de uma das netas que não se cansa de gravar a rotina da avó liberta conhecida por dançar, brincar, falar de amor e assumir, inclusive, que o bom da vida é também "um copo de uísque e uma banana".

"Isso é só uma brincadeira. Mas a verdade é que eu como banana todos os dias, porque faz muito bem à saúde e, quanto ao uísque, também adoro. É uma bebida muito especial", justifica.

"O bom do passado é que ele nos trouxe até aqui, no mais a gente tem que evoluir", acredita Rosa. (Foto: Fernando Antunes)
"O bom do passado é que ele nos trouxe até aqui, no mais a gente tem que evoluir", acredita Rosa. (Foto: Fernando Antunes)

Mas o caminho até essa liberdade foi longo. Ouviu julgamentos e muito de como deveria se comportar para manter as aparências. "As pessoas falavam demais, quiseram me censurar e que eu fosse alguém moldada. Mas ninguém precisa se moldar pelo outro para ser uma mulher de caráter e conquistar seu espaço", afirma.

O que a tornou diferente nasceu dentro de casa, através da liberdade e o respeito dos pais por suas decisões. "Papai e mamãe nunca me censuraram, sempre estiveram ao meu lado. Fui uma mulher que engravidou no interior e foi depois para o Rio de Janeiro dar oportunidade para a filha estudar Medicina", lembra.

Da capital carioca para Campo Grande, ela sentiu a cobrança em cima da própria personalidade. "Sempre fui brincalhona, gostava de falar palavrão e era desbocada. Quando cheguei aqui, houve uma festa e meu irmão quase me matou", ri. "Eu estava acostumada com o Rio de Janeiro e cheguei em uma festa de Campo Grande com bermudinha, um bustiê e casaquinho por cima, além de um salto enorme. Quando olhei para o lado, me vi naquela época em que as mulheres usavam social, meia fina e scarpin. Todo mundo me olhava", lembra.

Dali em diante, apesar das cobranças, resolveu fazer tudo que tivesse vontade. Trabalhou duro, viveu dois casamentos e máximo que pode. Ainda hoje, a rotina é intensa, o que faz ela não saber o que é envelhecer. "Eu nem fico pensando que tenho 72 anos, muito menos lembrando dos 50 ou 40 vividos, os únicos que lembram minha idade são os meus filhos", brinca, embora para ela a chegada da maturidade tenha sido um dos melhores momentos da vida.

"O passado só é bom porque nos trouxe até aqui, mas eu não sou do tipo que vive de passado. Gosto de viver o agora, continuar aprendendo e cuidando da minha família".

Bem vestida, de batom cor de rosa e com o apartamento no capricho, se engana quem acha que Rosa tem tempo de sobra para ficar em casa. É preciso fôlego só de imaginar a rotina. "Amo fazer exercício, sempre fui do tipo que fazia ginástica. Hoje, faço pilates, me arrumo e vou para o trabalho. Tenho uma cantina onde atendo, faço suco, salgado e depois venho para casa cuidar do almoço do meu filho e netos. À tarde volto ao trabalho e não tenho tempo para ficar fofocando sobre a vida de ninguém", descreve.

Flor que um dia ganhou do filho. (Foto: Fernando Antunes)
Flor que um dia ganhou do filho. (Foto: Fernando Antunes)
Uma das tatuagens feitas com a neta. (Foto: Fernando Antunes)
Uma das tatuagens feitas com a neta. (Foto: Fernando Antunes)

Pudor para falar de assuntos, que às vezes são tabus na vida de mulheres também não existe. Rosa diz logo de cara que aos 72 anos está viva e pronta para viver um amor se surgir pela frente, o que não acontece, segundo ela, na cabeça deles. "Os homens mais velhos não olham pra mim, olham para meninas muito mais novas. Então é difícil arranjar alguém da minha idade. Mas se eu achar alguém mais novo que eu? Com certeza, bem que eu queria", brinca. "Não tenho preconceito com nada", acrescenta.

Apesar de ter nascido numa geração conservadora, é reconfortante ouvir Rosa dizer sobre o amor e respeito necessários em tempo tão difíceis, carregados de intolerância. "Não consigo ter preconceito com nada. Não me importa se alguém é gay, hétero ou transexual, eu me importo em saber se a pessoa está feliz. Não me importo com a roupa, com o estilo, tatuagem ou jeito de falar", pontua. "O mundo é essa grandiosidade por causa das diferenças. Se a gente não se respeitar, onde vamos parar?", questiona. 

A mudança na visão da avó - Longe dos julgamentos, a reflexão que Rosa faz sobre o mundo é com intuito de deixar um futuro melhor para os netos e a geração que chegou, recentemente. "Eu tenho 72 anos, já vivi muito nessa vida. Mas essa meninada de hoje tem encontrado muita falta de amor pela frente. Muita falta de olhar e amizade dos pais. Isso é muito preocupante", reflete.

Nem permissivo demais e nem ignorante a ponto de acreditar que educação é na base da pancada. Rosa acredita mesmo é na força do diálogo. "Eu só acho que todo mundo precisa estar de olho nos filhos. Porque o mundo de hoje é diferente do de ontem, existe muita maldade e nós precisamos mudar esse conceito. Eu desde que nasci tive liberdade para falar, mesmo naquela época em 1946. Mas hoje, o problema é que os pais não deixam os filhos falarem e daí eles se abrem sozinhos para o mundo. Às vezes, a gente precisa ouvir mais do que falar".

E o segredo para tanta felicidade e sabedoria? Rosa resume em uma palavra: amor. "Não tem muito segredo, basta colocar amor em tudo que você na faz na vida, seja para você ou para outras pessoas. Eu sempre amei a vida e me amei muito, isso fez toda diferença. E o que eu puder fazer para continuar vivendo, eu faço, comigo não existe tempo ruim. Talvez o único problema da vida, seja minha dor no joelho", finaliza.

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Entre uma confissão e outra, Rosa dá risada e reforça que o importante é ser feliz. (Foto: Fernando Antunes)
Entre uma confissão e outra, Rosa dá risada e reforça que o importante é ser feliz. (Foto: Fernando Antunes)
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